Sono - Haruki Murakami
Já ouvi gente estranhar um autor escrever em primeira pessoa como mulher. Não vejo o por quê desse estranhamento.
Em Sono ninguém tem nome. E não passa da descrição da rotina zumbizada de uma mulher casada e mãe de um garoto.
Aborda algumas questões como relacionamento conjugal (o fato de fazer sexo por obrigação - leia-se estupro marital passivo-agressivo).
A apatia da personagem é intensa. Mas uma apatia relacionada apenas ao convívio social, como se ela de repente se tornasse esquizoide. Pra comer chocolate, beber conhaque, ler obsessivamente Ana Kariênina e nadar ela se mostra super enérgica e animada. Mesmo depois de dezessete dias sem dormir. Ela parece exausta da rotina e o 1/3 da vida que gastaria dormindo passa a ser só dela, em que ela pode fazer o que quiser. Apesar do tempo sem dormir, ela não demonstra nenhuma alteração fisiológica evidente, vi apenas uma ligeira menção de perda de memória de longo prazo, mas não sei se tem a ver com a insônia.
A forma como ela fala do filho, que o ama mas que em algum momento o odiaria, leva a um questionamento interessante: é moralmente errado não gostar do filho. Isso soa absurdo.
Quando ela encontra um policial numa das suas saídas pelas madrugada, ele a aborda e conta que dias antes um casal passou por maus bocados quando foram abordados por garotos e mataram o homem e estupraram a mulher. Por causa disso, na próxima saída, ela usou blusa larga e boné de beisebol para parecer homem. Com isso reduzindo o risco de ser atacada.
Mas aí... de fato, alguém a ataca. Quem?
Achei interessante os questionamentos dela a respeito da morte “sendo o sono um tipo de morte, seria a morte uma vigília? Quem pode saber?”
Em nenhum momento ela cogita um remedinho pra dormir, um médico, ou sequer comentar com marido ou familiares. É ela, sozinha e ela parecia gostar muito disso. Acho que por isso o nome do livro e essa capa, ela não queria sentir sono.