As Confissões de Santo Agostinho
AS CONFISSÕES DE SANTO AGOSTINHO
Miguel Carqueija
Resenha da autobiografia “Confissões”, de Santo Agostinho. Editora Saraiva e Editora Nova Fronteira, 2012. Coleção Saraiva de Bolso, 129. Título original italiano: “Confessiones”. Tradução: Frederico Ozanam Pessoa de Barros. Introdução: Padre Riolando Azzi. Capa: Cássio Loredano.
Agostinho (354-430), um dos chamados Padres da Igreja (ou seja, os escritores/pensadores católicos que desenvolveram a doutrina da Igreja Católica nos primeiros séculos do Cristianismo) nasceu em Tagaste e foi bispo em Hipona — locais do norte da África, onde antes da invasão muçulmana floresceu a religião cristã.
Grande filósofo, Agostinho conta a história da sua vida e o tempo em que errou em vida libertina e buscando a verdade em doutrinas diferentes. Seu pai era pagão mas sua mãe é Santa Monica, que durante muitos anos rezou e suplicou pela conversão de seu filho. Daí observações célebres do santo, “Tarde te amei” (isto é, a Deus) e também que não iria se perder “o filho de tantas lágrimas”.
Um dos problemas que surgiram na vida de Agostinho, em sua busca da verdade, foi o Maniqueísmo, doutrina herética que separava o domínio do mundo em duas divindades, a boa e a má (por isso hoje em dia se qualifica de “maniqueísta” obras de ficção que só apresentam personagens ou bons de todo ou completamente maus). Que Agostinho ignorava o caráter espiritual de Deus fica evidente neste trecho:
“Tampouco sabia que Deus é espírito, e que não tem membros dotados de comprimento ou largura, nem quantidade material alguma, porque a quantidade ou matéria é sempre menor na parte que no todo, e mesmo que fosse infinita, sempre seria melhor em uma parte definida por um espaço determinado do que em sua infinitude, não podendo estar toda inteira em todas as partes, como o espírito, como Deus.”
É importante também esta observação, aqui pinçada de um extenso parágrafo:
“Não conhecia tampouco a verdadeira justiça interior que não julga pelo costume, mas pela lei retíssima do Deus onipotente.”
Como seria o jogo de bola naqueles tempos antigos? Diz-se do futebol que foi inventado pelos ingleses no século XIX; mas Agostinho em menino jogava bola, descuidava dos estudos e recebia castigos. Ironicamente ele observa que os adultos tinham os seus jogos, aos quais chamavam negócios (sic) e não eram castigados.
Mais adiante o autor fala de sua luta em vencer as más inclinações que guerreavam as suas boas intenções:
“Em vão me deleitava em tua lei (de Cristo)m segundo o homem interior, porque em meus membros outra lei combatia a lei de meu espírito, mantendo-me cativo sob a lei do pecado que estava em meus membros. Com efeito, a lei do pecado é a violência do hábito, pela qual a alma é arrastada e presa, mesmo contra sua vontade, mas merecidamente, porque se deixa arrastar por vontade própria.”
Segue-se este pensamento famoso:
“Miserável! Quem poderia libertar-me deste corpo de morte senão tua graça, por Cristo, nosso Senhor?”
A certa altura do livro — são mais ou menos 450 páginas — Agostinho para de contar suas memórias e passa para a especulação filosófica sobre o tempo e a Criação.
“Confissões” é uma das obras mais famosas da literatura e altamente recomendável, mas não se deve ler como obra de recreação, deve-se ler com calma e atenção.
Rio de Janeiro, 7 de fevereiro de 2023.