"O inverno da nossa desesperança" por John Steinbeck
Um homem trabalhador de mercearia, que sustenta sua esposa e casal de filhos se vê numa panela de pressão social. Banqueiros, gigolôs, prefeitos e policiais corruptos inalcançáveis, vizinhos e ancestralidade o pressionam a buscar algo: status.
Ethan, no entanto, é um homem contente, satisfeito com seu ofício honesto de trabalhador de mercearia, apesar de se sentir fracassado por ter falido em empreendimentos anteriores e vindo de uma linhagem de capitão de baleeira. Os Hawleys já foram respeitados um dia.
Danny, amigo de infância de Ethan tem papel essencial na trama. E só mesmo pro final que a gente descobre o quanto isso significa para ele.
Margie-Young Hunt, uma cartomante promíscua permeia a vida de Ethan com provocações.
Quanto mais eu leio Steinbeck, mais me apaixono por sua narrativa, as emoções que ele desperta com as palavras. Imagine um quadro onde você pudesse ver raiva, dor, amor, julgamento, nojo, revolta, principalmente revolta. É isso que Steinbeck faz com as palavras. Ele tem uma magia nelas, que transmite quase que por osmose, o sentimento ali representado.
Em "O inverno da nossa desesperança" baseado no ato I cena I de Ricardo III de Shakespeare:
"RICARDO (Duque de Gloucester) — O inverno do nosso descontentamento foi convertido agora em glorioso verão por este sol de York, e todas as nuvens que ameaçavam a nossa casa estão enterradas no mais interno fundo do oceano. Agora as nossas frontes estão coroadas de palmas gloriosas. As nossas armas rompidas suspensas como troféus, os nossos feros alarmes mudaram-se em encontros aprazíveis, as nossas hórridas marchas em compassos deleitosos, a guerra de rosto sombrio amaciou a sua fronte enrugada. E agora, em vez de montar cavalos armados para amedrontar as almas dos temíveis adversários, pula como um potro nos aposentos de uma dama ao som lascivo e ameno do alaúde. Mas eu, que não fui moldado para jogas nem brincos amorosos, nem feito para cortejar um espelho enamorado. Eu, que rudemente sou marcado, e que não tenho a majestade do amor para me pavonear diante de uma musa furtiva e viciosa, eu, que privado sou da harmoniosa proporção, erro de formação, obra da natureza enganadora, disforme, inacabado, lançado antes de tempo para este mundo que respira, quando muito meio feito e de tal modo imperfeito e tão fora de estação que os cães me ladram quando passo, coxeando, perto deles. Pois eu, neste ocioso e mole tempo de paz, não tenho outro deleite para passar o tempo afora a espiar a minha sombra ao sol e cantar a minha própria deformidade. E assim, já que não posso ser amante que goze estes dias de práticas suaves, estou decidido a ser ruim vilão e odiar os prazeres vazios destes dias. Armei conjuras, tramas perigosas, por entre sonhos, acusações e ébrias profecias, para lançar o meu irmão Clarence e o Rei um contra o outro, num ódio mortífero, e se o Rei Eduardo for tão verdadeiro e justo quanto eu sou sutil, falso e traiçoeiro, será Clarence hoje mesmo encarcerado devido a uma profecia que diz será um “gê” o assassino dos herdeiros de Eduardo. Mergulhai, pensamentos, fundo, fundo na minha alma."
A parte mais gostosa de ler Steinbeck é que quando termina, a gente quer de novo, fica aquele quê de digerir o que se deu. O término é quase sempre abrupto, sem explicação. É preciso ler nas entrelinhas, mergulhar na história, se colocar lá, como observador. Steinbeck é arte! Arte é emoção!