Homenagem a Carlos Castañeda
Carlos César Salvador Arana Castañeda, mais conhecido como Carlos Castañeda (1925-1998), foi um antropólogo formado pela Universidade da Califórnia que ganhou fama após a publicação, em 1968, de sua dissertação de mestrado intitulada The Teachings of Don Juan - a Yaqui way of knowledge, lançada no Brasil como A Erva do Diabo. Esta sua primeira obra tornou-se um fenômeno de vendas entre os jovens do movimento hippie e da contracultura, que chegaram a transformar o antropólogo num guru da nova era. Formaram-se legiões de admiradores que queriam, por conta própria, inclusive, reviver as experiências xamânicas descritas no seu livro. A sua obra também foi muito debatida no meio acadêmico, sobretudo porque se tratava de uma publicação de cunho científico que despertara os interesses juvenis.
No Brasil, num primeiro momento, as suas obras foram proibidas pela ditadura militar por se acreditar que elas incentivavam a juventude ao uso de drogas, como no caso do cacto Peiote e do cogumelo Pscilocybe Mexicana, descritos em rituais xamânicos no seu primeiro livro, A Erva do Diabo.
Em 1974, não consigo precisar o ano com firmeza, chegou-me às mãos um exemplar do livro A Erva do Diabo, que li com muita curiosidade, pois a minha geração começou a se interessar e se informar sobre o xamanismo, as culturas indígenas, as religiões e filosofias orientais, num claro e fortíssimo contraponto à cultura, filosofia e espiritualidade ocidentais. Castañeda era mais um dos autores a contribuir com informações para a rebelião da minha geração contra tudo que representasse o status quo. Em plena ditadura, vivíamos a questionar tudo e todos e procurávamos escritores que poderiam contribuir neste sentido. Herman Hesse foi outro autor importante, pelo menos para mim, não só para mim, é óbvio, e poderá ser assunto de uma nova crônica. Aguardemos.
Um trecho do livro A Erva do Diabo repercutiu durante anos na minha vida e, cada vez mais, ele se mostra carregado de sentido, principalmente a partir do momento em que comecei a questionar com mais vigor a racionalidade cartesiana do Ocidente. Foi mais ou menos assim que seu mestre indígena, o xamã Dom Juan, se expressou: “Olhe bem para cada caminho, e com propósito. Experimente-o tantas vezes quanto achar necessário. Depois, pergunte-se, e só a si, uma coisa. Essa pergunta é uma que só os muito velhos fazem. Meu benfeitor certa vez me contou a respeito, quando eu era jovem, e meu sangue era forte demais para poder entendê-la. Agora eu a entendo. Dir-lhe-ei qual é: esse caminho tem coração?”
Para Dom Juan, qualquer caminho era válido, desde que tivesse coração, fazendo um contraponto aos caminhos escolhidos só pela razão, só pela mente. Esta compreensão do xamã está muito mais próxima do saber oriental que do saber ocidental, sem nenhuma dúvida. Então, a forma de ver a vida e de se relacionar com a natureza das populações nativas das Américas diferem na essência da visão de mundo dos conquistadores europeus. Foi isto queCarlos César Salvador Arana Castañeda aprendeu com seu guru indígena.
Considerando a importância do antropólogo e escritor Carlos Castañeda na minha formação intelectual juvenil rebelde, muito rebelde, em 2002, escrevi um pequeno poema para homenageá-lo e ele fala exatamente do caminho que tem coração. Ao poema.
TRIBUTO A CARLOS CASTAÑEDA
O destino nos coloca escolhas
E podemos fazê-las
Iluminados pela razão
Ou tocados no coração.
A razão nos leva à construção
Do edifício exterior
Imagem sólida
Imóvel.
O coração nos direciona
À construção do edifício interior
Imagem fluida
Que se move e penetra
Em cada fresta
De porta ou janela que se abre.