Sobre Alice - Calvin Trillin

Você é casado ou tem um relacionamento no mínimo compromissado com outra pessoa, de forma a criar uma expectativa de vida conjunta? Se sim, você certamente já ficou discutindo com outros casais sobre as felicidades e agruras da vida a dois. Já citou uma lista dessas coisas que, não por coincidência, são as mesmas de outros casais, principalmente se houver filhos envolvidos. Ou outros fatores que por ironia do destino vêm a dar outra cara e sentido à união, fazendo o diferencial. Fatores como trabalhos, viagens e doenças.

Podemos dizer basicamente que o livro título dessa resenha é um mix de todos estes sentimentos. “Sobre Alice” , do jornalista norte-americano Calvin Trillin (Editora Globo, 2007), fala sobre o amor de casais, admiração recíproca, luta contra uma doença, e demais sutilezas envolvendo Calvin e sua esposa Alice. Sutil, talvez esta palavra resuma de forma adequada a narração descompromissada que Calvin faz envolvendo flashes de episódios ocorridos entre os dois. Desses episódios depreende-se a descoberta do câncer por Alice em 1976, o seu penoso tratamento que iria causar sua morte em 2001, o casamento das filhas, o trabalho de Calvin como jornalista e escritor, e a forte personalidade de Alice. Veja bem, eu disse “flashes”. Não espere encontrar neste livro detalhes abrangentes sobre a doença, sobre a vida íntima dos dois. A impressão que se tem ao terminar de lê-lo é que alguém lhe contou um caso muito interessante sobre um casal das décadas de 60 e 70, a ponto de você mesmo poder passar este caso para frente.

“Sobre Alice” é exatamente o que se propõe a ser: uma homenagem do autor à amada esposa. Porém, não se trata de enredo modorrento. São apenas 93 páginas de fácil e rápida leitura, em tom de humor, sem preocupação cronológica dos fatos, em que peremptoriamente nos colocamos nos papéis de protagonistas das ações, e torna-se impossível não assemelharmos casos entre Alice e nossas esposas, ou de Calvin e os esposos. Ora romanceado, ora realista demais, ora alegre, ora triste, o jornalista revive a época em que suas histórias de família eram narradas na revista americana, ou em livros. E ao final, após suas infindáveis descrições poéticas e amorosas de sua Alice, fica impossível não concordarmos com sua irrevogável beleza e inteligência.

Fácil entender a admiração do escritor ao início do livro quando se surpreende que muitas das cartas de condolências recebidas vinham de pessoas que não conheceram Alice. Não pessoalmente.

Divertida e leve opção para leitura, como uma grande crônica.