Meus dias de escritor - Tobias Wolff
Retrato de um escritor quando adolescente
Tobias Wolff - Meus dias de escritor, Rio de Janeiro, Ediouro, 2006
Segundo livro de Wolff que leio. Antes, li seus contos de A Noite em Questão, livro muito bom. A história de Meus Dias de Escritor se desenvolve numa escola preparatória de alto nível da Nova Inglaterra (equivale a dizer: somente para filhos de ricos e milionários) durante os conturbados anos 1960. Um narrador sem nome conta suas experiências em meio ao movimento pelos direitos civis, à Guerra do Vietnã, ao assassinato de JFK e aos romances de Ernest Hemingway. O escritor inglês Nick Hornby diz, em Frenesi Polissilábico, que o único defeito deste volume é ser curto demais. Pode até ser, mas não seria uma virtude?
O foco é colocado sobre as amizades e rivalidades dos alunos dessa escola, cujo objetivo primordial é estimulá-los para a entrada no mundo da literatura. Ela ensina que a literatura é o centro da vida e, a partir da experiência de grandes autores, os alunos vão sedimentando seus próprios valores e princípios. No final de cada período, um grande escritor é convidado para visitar o estabelecimento e eleger o melhor texto de um concurso literário interno. Como prêmio, o aluno escolhido tem direito a alguns momentos a sós com o ilustre visitante, conversar com ele.
O último desses visitantes, quando começa a história, foi o idoso poeta Robert Frost (um de seus poemas, Fire and Ice, é a epígrafe do livro Eclipse, terceiro da série Crepúsculo, de Stephenie Meyer, série que não li, claro). Então, no capítulo I (Fotografia da turma) o narrador sem nome nos dá uma ideia do tipo de aluno que frequenta essa escola. É um tanto longo e um pouco enfadonho, mas depois vem o capítulo II, que é bastante interessante e saboroso, pois fala de diversos escritores e suas obras mais conhecidas, que os estudantes discutem apaixonadamente.
O capítulo III quase que inteiramente trata da visita do poeta Robert Frost à escola do narrador. E termina com uma bomba. O próximo convidado não seria um autor, mas uma autora. A polêmica criada não é por conta do sexo da pessoa, mas por causa de seus livros, que muitos alunos não consideram literatura - ela é Ayn Rand, que escreveu A Nascente e A Revolta de Atlas, entre outros títulos. O capítulo IV gira quase todo em torno de A Nascente, um livro polêmico: muitos o consideram uma obra-prima, outros, literatura racista. O narrador vai de uma ponta a outra em sua relação com esse livro e sua autora.
A polêmica continua ainda no capítulo V e quase em seu final ficamos sabendo que o visitante ilustre que dará a próxima palestra e escolherá um conto do concurso literário da escola será ninguém menos que Ernest Hemingway, idolatrado por todos os rapazes que ali estudam. O narrador acredita que vencerá o concurso e terá direito a passar algumas horas com o ídolo Hemingway. Mas isso é outra história. Uma história para o capítulos VI e VII.
Perto do fim (capítulos VIII e IX; não há um capítulo X) a história toma um rumo inesperado. E em seus dias de escritor, o narrador acaba se tornando também um ajudante de restaurante em Nova York, limpando mesas e lavando pratos. Era seu emprego quando Ernest Hemingway, seu ídolo literário, se matou (2 de julho de 1961). Depois ele teve várias outras ocupações. Os parágrafos finais finais tornam claras uma porção de coisas, mas uma delas necessitaria ser melhor esclarecida: o motivo que o levou a fazer aquilo que determinou a mudança completa da história.
Bem, ninguém vai aprender a se tornar escritor lendo o livro de Wolff. Embora o personagem ensine um macete - copiar palavra por palavra, à máquina (na época, os computadores pessoais, como os conhecemos, não existiam), um trecho de um romance ou um conto completo, para sentir as emoções que o autor sentira ao escrevê-las etc. Apesar disso, Meus Dias de Escritor não é daqueles livros empolgantes ou profundamente emocionantes, pois é mais cerebral mesmo. O que não deixa sua leitura menos interessante. Talvez por isso Hornby ter escrito em sua crítica que queria mais.
Saí da leitura com a mesma sensação de quando terminei Uma Escola Para a Vida, de Muriel Spark, que também aborda questões de literatura, porém com outro approach. E a verdade é que, com Meus Dias de Escritor, Tobias Wolff foi finalista do National Book Award de 2003, mas quem levou mesmo foi Shirley Hazzard com seu O Grande Incêndio. Uma história de amor meio impossível entre um major inglês e uma ninfeta australiana no Japão pós bombardeio de Hiroshima. É interessante, mas pouco comparável ao clássico Lolita, de Vladimir Nabokov.