Aventuras do Senhor Cryptogamo, de Alfredo Moraes Pinto, e Apontamentos de Raphael Bordallo Pinheiro sobre a picaresca viagem do Imperador de Rasilb pela Europa.
Dir-se-ia duas revistas em quadrinhos a obra de Alfredo Moraes Pinto e a de Raphael Bordallo Pinheiro, ambas ricamente ilustradas - e são as ilustrações que acompanham os textos enormemente cômicas. Ou são os textos que acompanham as ilustrações?! Ambas as duas obras são do crepúsculo do século XIX. A primeira, uma aventura picaresca, jocosa, de um caçador de borboletas apaixonado pelas borboletas, e não pela sua noiva; a segunda, uma peça - picaresca, está no seu título - difamatória, cujo alvo é o Imperador Dom Pedro II - e é Rasilb acrônimo de Brasil -, que o autor ridiculariza, achincalha, reduz, e maldosamente, à figura de um pateta, de um paspalho, de um azêmola ridículo, desgracioso.
A primeira aventura conta a história do Senhor Cryptogamo; a segunda, a de Pedro de Pampulha, imperador de Rasilb.
O Senhor Cryptogamo, dedicado à sua paixão, caçar borboletas, negligenciava sua esposa, Elvira, por ele doentiamente apaixonada, e de cujos braços ele desejava escapar. Com artifícios inúmeros, ele foge às dela mãos sedosas, para ele garras afiadas, mas ocorre, infalivelmente, de ela acidentalmente ir ter com ele, para gostosura dela e desgosto dele. O destino sempre os reunia, para contrariedade do aventureiro desaventurado, que, aventurosamente, vem a ser engolido por uma baleia no interior de cujo estômago conhece uma bela minhota, que o faz esquecer-se, enquanto nos braços dela, de Elvira, e com ela casa-se.
É a aventura do nosso herói comédia dramática e épica e trágica. Comédia, porque as desventuras do afortunado e desafortunado Senhor Cryptogamo é rocambolesca. Dramática, porque sofre a desprezada Elvira, que não tem do herói correspondido seu amor por ele, e porque sofre o herói para se desvencilhar dela. Épica,porque depara-se o herói, um Édipo, com perigos sem conta: enfrenta piratas, árabes e uma baleia. Trágica, porque encontra Elvira um fim... trágico; e o fim da história para o herói é... trágico.
Deu na telha do Imperador de Rasilb, Pedro de Pampulha, sair para conhecer o mundo, com dois objetivos: encontrar povos que o admirem; e, sábios que lhe digam palavras quaisquer. Antes de de seu império partir em viagem, deixa regente sua filha, a Princesa Zuzu-Bibi-Toto-Fredegundes-Cunegundes etc. Estuda dicionários de idiomas e catálogos das coisas de outros povos. E parte, para ver o mundo, com dezesseis mil e duzentos réis na algibeira. Vai à Alemanha, à França, à Inglaterra, à Itália, à Grécia, e à Ásia, e ao Egito, e à Palestina, e ao Valle de Andorra Júnior. Assiste às filarmônicas; adoece, e vive em quarentena; tem contato com professores árabes, e de anedotas e inscrições; e com sábios joga partidas de petisca; e visita sociedades científicas e de belas artes; e dança can-can; e lava-se num chafariz; e hospeda-se numa estalagem; enfrenta, enfim, mil e uma vicissitudes, que fazem a graça da sua história, uma desgraça.
As duas obras, que podem ser chamadas de livros ilustrados, tão ricamente ilustradas, as ilustrações a animarem o texto - ou o texto a animarem as ilustrações -, que se assemelham às modernas revistas em quadrinhos. Duas curiosidades literárias e históricas agradabilíssimas.