Paralelo 42 - John dos Passos
Primeiro volume de uma trilogia, conta a história de cinco personagens singulares ao mesmo tempo em que desenha um panorama social e político dos EUA no início do século passado
John dos Passos - Paralelo 42, São Paulo, Benvirá, 2012
Entre os anos de 1930 e 1936 o escritor americano John dos Passos (1896-1970), de ascendência portuguesa, publicou sua trilogia USA, composta pelos seguintes títulos: Paralelo 42, 1919 e O Grande Capital. Com esses volumes ele buscava traçar, através da ficção, um extenso painel social e político dos Estados Unidos das décadas iniciais do século passado. Um tempo em que o país ainda não era a potência em que se viu transformado nas décadas seguintes. Claro está que a leitura da trilogia por si só não vai substituir os livros de história sobre o período, mas ela contribui bastante para entender a alma do pais, dos seus habitantes.
Paralelo 42 se passa entre 1900 e 1918, quando termina a guerra na Europa. Ocupando em sua maior parte a região central da América do Norte os Estados Unidos localizam-se a 42 graus do plano equatorial terrestre, e isso tem a ver com o conteúdo da obra, claro. Os personagens principais, que são cinco - Mac, Janey, Eleanor, Ward e Charley - todos em busca de sucesso e ou riqueza, provêm de diversas regiões do país e viajam pelo território enquanto se desenrolam suas histórias. Quase todos acabam de um modo ou de outro atingindo Nova York, já uma grande e importante cidade, que atraía não apenas americanos, igualmente estrangeiros. Sindicatos, trabalhadores, empresários, fábricas, oficinas, ferrovias, portos etc. adquirem grande importância na narrativa.
Aqui e ali aparecem também vários personagens que de fato existiram, como Thomas Edison (1847-1931), chamado por dos Passos de o mago da eletricidade, que ganhou seis páginas de texto. Da mesma forma, é destacado todo o trabalho de Andrew Carnegie (1835-1919), o milionário magnata do aço, nascido na Escócia. Os capítulos iniciam e terminam com notícias de jornais, trechos de canções, pequenas biografias, citações, etc., uma colagem que agradou profundamente o francês Jean-Paul Sartre, que anotou: "Dos Passos inventou apenas uma coisa, uma arte de contar histórias. Mas isso é o bastante... Eu o considero o maior escritor dos nossos tempos." Bem, mas e Fitzgerald, Hemingway, Steinbeck etc.?
Para o leitor comum a invenção de dos Passos, elogiada pelo autor francês (as colagens ou recortes), ajudaria muito se ele tivesse um ótimo conhecimento da história e da cultura norte-americana do período. Mesmo que não tenha, entretanto, isso não vai atrapalhar tanto assim, pode-se ficar sem entender alguma (ou muita) coisa dos recortes, pois o que importa mesmo são as histórias dos cinco personagens, o que há de melhor no volume. Elas não são narradas exatamente em sequência, mas em diversos capítulos espalhados pelo volume entre as colagens, exceto a história de Charley Anderson, que fecha o livro, contada de uma vez só. Esse jeito diferente de narrar ganhou não apenas a admiração de Sartre, também os elogios de Norman Mailer e de muitos especialistas em literatura americana.
Finalmente: me parece que as narrativas de Paralelo 42 ficam melhores se o leitor não seguir a disposição dos capítulos como eles aparecem na edição e ler a história de cada um dos personagens, começando com Mac, passando por Janey, Eleanor e Ward e terminando com Charley. Depois pode ler os tais recortes, as colagens, as pequenas biografias etc., sem prejuízo algum para o entendimento total da obra. Vale a pena conhecer a trilogia USA ou mesmo este ou aquele volume apenas: eles podem ser lidos separadamente.