Conto de Fadas
“Aprendi uma coisa em Empis: as pessoas boas brilham mais em momentos sombrios.”
Morte trágica, sensação de perda, história de superação, amizades inesperadas. Dizem que nunca é tarde demais para a realização de novos feitos. Stephen King parece ter levado esse preceito a sério. Tanto que, no auge dos 75 anos, presenteia seus fiéis leitores, ideando o próprio Conto de Fadas, marcado pelos ingredientes elencados acima, todos servindo para ditar o envolvente tempero da narrativa.
Em virtude da “má fama” do autor norte-americano, a expectativa era de que o novo livro despontasse como um verdadeiro conto de bruxas. De maneira geral, a trama não aparece, necessariamente, como uma mostra de inventabilidade, mas tem a assinatura do autor e as incursões por suas páginas configuram uma experiência divertida, tornando-se mais inspiradora à medida que os eventos se desenrolam.
Conto de Fadas não apenas é protagonizado como também é narrado por Charlie Reade, um prodígio adolescente de 17 anos, que apesar da tenra idade oferece ao ledor uma voz recheada de especificidade. Inclusive pela maneira autêntica como traça os acontecimentos de uma vida repleta de tristeza, talvez pouco interessante, semelhante à maioria das pessoas. Charlie mora com o pai e juntos lutam para defenestrar os fantasmas do passado, sobretudo, em busca de superação pelo falecimento da mãe do jovem, vítima de um grave acidente.
O ponto de virada acontece quando sua rotina é alterada pelo vizinho, o Sr.Howard, um verdadeiro ermitão de idade avançada que sofre graves ferimentos após despencar de uma escada. O evento acaba unindo adolescente e ancião, formando uma inusitada amizade quando Charlie passa a auxiliá-lo, velando sua recuperação. Também acaba acolhendo Radar, uma cadela da terceira idade, há anos mantida pelo idoso como seu único animal de estimação.
A despeito de a fantasia irromper por todos os lados, bastando um pouco de introspecção para absorvê-la, o lado mais fantasista vem à tona após Charlie descobrir um estranho poço, escondido em um antigo casebre erguido no jardim da casa do Sr.Howard. Através do poço é possível chegar a Empis, um misterioso mundo habitado por personas vilipendiadas, reféns de uma força obsessora. A partir daí é fácil presumir que Charlie não conseguirá permanecer impassível, ficando alheio a tantas mostras de iniquidade.
Nada previsível é a precisão na qual a narrativa, com alguns ares de aventura épica, aborda o ideal de amizade ou o amor pelos animais simbolizados através da relação com a cadela Radar. O maniqueísmo também está presente e esse embate é cuidadosamente construído. A imersão pelo mundo da fantasia não abdica de uma dose de terror e entre tantas lições, uma delas sugere que a fantasia pode estar mais próxima do que se pensa. E para encontrá-la não é necessário desbravar outros planos, sendo exigido apenas aguçar um pouco mais a imaginação.