Resenha extraordinária: "Contra toda a esperança"
CONTRA TODA A ESPERANÇA
Miguel Carqueija
Resenha do livro “Contra toda a esperança”, de Armando Valladares. Subtítulo: “22 anos no “Gulag das Américas”: as prisões políticas de Fidel Castro”. Editora Intermundo, São Paulo-SP, 2ª edição, sem data (edição condensada). Título original em espanhol: “Contra toda esperanza”, Kosmos Editorial S.A., Panamá, 1985. Tradução: Terezinha Monteiro Deutsch. Desenhos de capa e contracapa, do autor.
Impressionante a leitura desta obra seminal para a literatura do século 20 e que descortina cruamente, com todos os detalhes, a tremenda crueldade que a ditadura Castro impôs à nação cubana e que prossegue até o dia de hoje. Importante inclusive porque se espalhou a lenda de que Fidel Castro é um libertador do povo, um herói etc.
Valladares foi preso por ter se recusado a colocar um adesivo de Castro em sua mesa de trabalho. Condenado por atos de terrorismo (?) nunca especificados, e sabemos como os tribunais de regimes comunistas são fraudes, passou 22 anos nas masmorras cubanas, sofrendo horrores, inclusive na ilha de Pinos.
Numa boa parte desse tempo ele foi mantido nu em cela de castigo, em precárias (aliás horrorosas) condições de higiene. Havia uma constante chantagem para que os presos políticos aceitassem a “reabilitação”, que significava aderirem ao comunismo. Católico convicto, Valladares resistiu heroicamente apesar das pressões contra a sua própria família, irmã e mãe.
“Em Cuba existem, nesse momento (texto da década de 1980), mais de duzentos estabelecimentos penitenciários, que vão desde as prisões de máxima segurança até os campos de concentração e as chamadas granjas e frentes abertas, onde os presos realizam trabalho forçado (...) As situações de violência, a repressão, as surras, as torturas e incomunicabilidade são prática diária. Hoje, agora mesmo, centenas de presos políticos, por recusar a reabilitação política, estão nus há quatro anos, sem assistência médica, sem visitas, dormindo no chão e fechados em celas cujas portas e janelas foram emparedadas. Jamais vêem a luz do sol ou a luz artificial.
Eu sou um sobrevivente dessas terríveis celas emparedadas de Boniato.” (Introdução)
Valladares conta o triste caso de Sorí Marín, “um dos mais estreitos colaboradores de Castro. Lutou ao lado dele nas montanhas e fez parte de seu Estado Maior. Fez e assinou a lei da Reforma Agrária. Nos primeiros meses de triunfo revolucionário, esses laços apertaram-se mais ainda. Castro costumava almoçar de vez em quando na casa de Soró Marín, atraído pela excelente cozinheira que era a mãe dele. Por isso, a senhora Marín, quando soube que seu filho ia ser fuzilado, transida de dor foi falar com Castro. O encontro foi dramático. A velha abraçou, chorando, o líder revolucionário que lhe acariciava a cabeça venerável”.
Castro garantiu a ela que Humberto não seria fuzilado (a acusação era de conspiração). Ela voltou feliz e comunicou à família. Pois bem: “Na noite seguinte, por ordem expressa de Castro, Humberto Sorí Maríns foi fuzilado”. (capítulo 3)
Isso faz lembrar o sistema de Stalin, os seus expurgos mortais.
Quando da tentativa contra-revolucionária da Baía dos Porcos, o governo prendeu, segundo o autor, umas 500.000 pessoas que foram alojadas em qualquer lugar, pois não havia lugar nos presídios.
“Dezenas de pessoas morreram naquelas chacinas: houve mulheres grávidas que abortaram e outras que deram à luz ali mesmo, no chão, assistidas por outras mulheres. Os guardas ameaçavam todo mundo com metralhamento, se a invasão triunfasse.” (pag. 57-58)
O mundo conhece pouco desses horrores de lesa-humanidade.
Na página 210 Valladares observa:
“A Internacional Socialista oferecia, então, seu respaldo moral e político ao tirano. Vinte e cinco anos depois continuam fazendo isso.”
E se não tivesse havido uma vasta campanha internacional pela libertação de Valladares, capitaneada por sua esposa Martha, ele provavelmente estaria preso até hoje, se sobrevivesse aos tormentos, pois saiu de lá inclusive com enfisema pulmonar. Por graça de Deus, Valladares foi “adotado” pela Anistia Internacional por fim um pedido direto do presidente francês, François Miterrand, obteve de Fidel Castro, que provavelmente o odiava, a libertação do escritor.
Há também informações sobre a perseguição do regime castrista aos homossexuais.
Livro para ser lido e divulgado.
Rio de Janeiro, 16 de novembro de 2022.