Horta de Bento XVI a Francisco
HORTA DE BENTO XVI A FRANCISCO
Miguel Carqueija
Resenha do livro “De Bento a Francisco: uma revolução na Igreja”, de Luiz Paulo Horta. Jorge Zahar Editor Ltda., Rio de Janeiro-RJ, 2013. Preâmbulo: Ana Magdalena Horta. “Carta a Luiz Paulo” por Marco Lucchesi.
Um dos últimos ou talvez o último colunista católico do jornal carioca “O Globo” (jornal que é, hoje em dia, profundamente anticristão), Luiz Paulo Horta faleceu em 3 de agosto de 2013, deixando este livro póstumos de artigos sobre o então recém-eleito Papa Francisco, o cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio. Horta chegou a presidir o Centro Dom Vital.
Não concordo com o subtítulo, pois a meu ver a Igreja Católica evolui, aperfeiçoa-se, mas não com revoluções, palavra que soa estranha, como se de repente a Igreja, como fortaleza de Cristo na Terra, pudesse desdizer os seus próprios princípios e a sua Fé.
Quem acompanha a Igreja com atenção vê que a diferença entre Ratzinger e Bergoglio é, na prática, apenas diferença de personalidade, temperamento e estilo. Ambos são papas e como tais defendem a ortodoxia.
Na página 87 Horta faz uma observação bastante interessante: “Em termos de pensamento religioso, o Papa Bergoglio poderia ser considerado (se é que essas classificações têm algum valor) um “conservador flexível”, um defensor do que já se chamou de “ortodoxia positiva”: fidelidade à doutrina da Igreja temperada por uma avassaladora humanidade”.
Realmente, ser conservador (e todo cristão deve ser conservador) não significa ser carrancista, como a contra-cultura procura fazer crer. É difícil encontrar pessoa mais bem-humorada que o Papa Francisco.
Como a contradizer o título do livro, que não deve sido posto pelo autor (afinal, é obra póstuma), Horta fala na página 44: “De Jorge Bergoglio não se esperam revoluções. Mas, por sua estatura intelectual e humana, ele tem todas as condições de ser um bom papa. Um papa austero, que não vai tocar bandoneón. Mas uma figura de pai, que foi o que se viu ontem no balcão da Praça São Pedro. Uma aparição severa, mas que logo desatou num sorriso, numa brincadeira (“o papa que veio do fim do mundo”) e num pedido que todos rezassem por ele”.
Eu não concordo com tudo o que o autor fala na coletânea sobre Bento XVI, a meu ver um dos grandes papas da História. Mas ele reconhece o imenso valor de Joseph Ratzinger. Eis o que Horta diz na página 27:
“Tudo isso Bento XVI contou em seus livros, e no maior deles — a trilogia dedicada a Jesus de Nazaré. As chances são de que teremos agora um papa mais pastor do que intelectual, mais hábil nas questões do dia a dia. Mas o papa que sai, na sua postura não muito carismática, deixa uma herança que ajudará a Igreja nos tempos duríssimos em que ela está mergulhada.”
Bento XVI é provavelmente o maior teólogo dos tempos modernos.
O livro de Luiz Paulo Horta não é teologicamente profundo, é escrito em tom de crônicas. Mas é um dos primeiros livros a falar sobre a renúncia de Bento XVI e o pontificado de Francisco: “Sim, Bergoglio é simpático, um paizão. Mas, reparem, ele não ri o tempo todo, ele não faz gestos teatrais. Onde é que você já viu manter três milhões de pessoas, como ontem, silenciosas durante cinco minutos, porque ele pediu um tempo de oração? O demagogo não faz isso, não quer que as pessoas pensem por si mesmas, quer exercer uma espécie de hipnotismo barato”.
Este trecho encontra-se na página 99 e refere-se à Jornada Mundial da Juventude no Rio de Janeiro em 2013; aliás a JMJ foi a razão imediata da renúncia de Bento XVI, pois este, já com mais de 85 anos, percebeu que não teria mais saúde para conduzir evento de tal magnitude.
Rio de Janeiro, 22 de outubro de 2022.