Para que serve um debate?

Uma resenha do livro Como vencer um debate tendo razão

 

Debatemos o tempo todo em nossos cotidianos. Muitas vezes sem perceber, como quando discutimos o que iremos jantar ou que filme iremos assistir. Mas em época de eleições nos tornamos especialmente conscientes de alguns debates, principalmente os políticos. E se isto já era comum antigamente, na era das redes sociais o debate eleitoral é quase onipresente.

 

Nesta perspectiva saber não apenas como debater, mas também para que debater, com quem debater, e o que esperar de um debate. Para auxiliar no debate acerca de para que serve um debate Henry Bugalho lançou um pequeno livro, Como vencer um debate tendo razão.

 

O título é uma referência a um estudo inacabado de Arthur Schopenhauer, publicado em 1864, quatro anos após a morte do filósofo. Este estudo já foi publicado com vários títulos, mas sempre assemelhados. A edição que li leva o título A arte de ter razão - Como vencer um debate sem precisar ter a razão em 38 estratagemas.

 

O pequeno livro de Schopenhauer é uma espécie de manual de patifaria intelectual, explicitando os principiais truques que debatedores desonestos usam para vencer um debate através de prestidigitações lógicas, de argumentos falhos mas capazes de manipular e enganar tanto os outros debatedores como a platéia que assisti.  As famosas falácias. Obviamente a ideia deste manual é a que, conhecendo os estratagemas, podemos reconhece-los quando usados, e, principalmente, consigamos desmascarar o debatedor impostor, e não a de que devemos usar das falácias para vencer debates.

 

Apesar do manual de Schopenhauer ser bastante útil e abrangente, é um livro de leitura um tanto árida para o leitor de hoje, e principalmente, anacrônico no sentido que os meios de comunicação em massa, em especial as redes sociais, o modo de debater mudou bastante. Além disto o filósofo apenas aponta os estratagemas desonestos, mas não se debruça sobre a ética do debate, sobre o que seria um debate honesto e sincero. Sem dúvida apontar os erros e trapaças tem grande valor, mas também é preciso refletir sobre como seria um debate bem feito, de forma a buscar conclusões a partir do confronto de idéias.

 

E é aqui que o livro de Bugalho se torna mais abrangente que o estudo de Schopenhauer. Ele não se limita a fazer um estudo sobre falácias lógicas, como também propõe uma postura ética para que os debates sejam mais proveitosos e mais honestos.

 

O primeiro passo é deixar de interpretar um debate como um embate, onde o objetivo seria obter uma vitória contra o inimigo. A intenção de vencer um debate é uma armadilha do ego que acaba por nos levar a usar, as vezes inconscientemente, as vezes propositalmente, de falácias e artimanhas.

 

O segundo passo é entender que todos nós, debatedores ou platéia, temos inclinações e vieses cognitivos, e que podemos ser induzidos a escolher não a melhor ideia, mas o pacote mais vistoso e agradável, como o “vencedor” do debate.

 

E talvez o passo mais importante, em especial em redes sociais: devemos aprender a reconhecer quando um debate é frutífero, e quando se transforma em apenas uma confrontação que alimenta o confronto, a lacração, a mirada, a criação de memes. Pois sim, muitas vezes continuar debatendo pode piorar a qualidade do debate público.

 

O pequeno livro de Bugalho é de uma leitura fácil e fluida, e apesar de não apresentar nenhum conceito revolucionário, sintetiza bem a base da retórica e oratória de debates, tanto os frutíferos quanto os venenosos. Recomendo em especial para o leitor que com frequência se percebe envolvido em debates que apenas levam a irritação e frustração.

 

A única nota negativa se refere a revisão do texto, pelo menos na versão e-book, onde certas palavras foram mantidas repetidamente com erros, alguns até difíceis de entender. O pior exemplo foi o uso do termo block no lugar de exemplo. Irrita um pouco mas depois que se acostuma a leitura não fica prejudicada.