Love - A história de Lisey
Certa feita, durante uma entrevista, quando indagado sobre qual título que escreveu colocaria no topo do ranking, Stephen King, sem titubear, disparou: Love - A história de Lisey. Tendo o mestre do terror como meu autor predileto – isso não é novidade para absolutamente ninguém -, adotei várias de suas obras como livros de cabeceira (Christine, It, Metade Sombria, Misery, Sombras da Noite, Duma Key...) e, portanto, passei a nutrir um estranho medo de encarar o romance lançado em 2006, por razões que nem sei clarificar ao certo, talvez um medo desmedido, como se houvesse um receio de confrontar minhas perspectivas com a preferência exposta pelo mestre.
O tempo foi passando, outras obras assinadas pelo autor foram sendo tragadas com volúpia e não tive mais como postergar, era o momento de encarar a melhor narrativa escrita por Stephen King, pelo menos na opinião do prolífico autor. Love pode ser compendiado como um experimento lutuoso, tratando sobre perdas e amor, desenvolvido em meio a uma atmosfera perturbante. Esse clima prevalece grande parte do tempo, embora não possa ser meramente taxado como um livro de terror, mesmo dialogando com o gênero em diversas passagens.
Nas primeiras páginas, a trama parece despontar de forma baralhada, mas o enredo se ajusta paulatinamente, bastando dar uma chance à obra, mas isso requer uma dose de paciência. Aposto que muitos leitores deixaram o livro de lado antes das primeiras 100 páginas, sem saber que um apanhado de coisas (muito) boas estava por vir.
Love aposta em uma narrativa alinear, sendo por meio de idas e vindas que personagens complexos são delineados, a exemplo da protagonista Lisey, que há dois anos trava uma desenfreada luta para não sucumbir ao luto, sem perceber (ou talvez já tivesse notado) que estava enclausurada, escrava de ardorosas lembranças do passado.
Não apenas a protagonista é desafiada diante de seus limites e nesse ritmo os personagens ascendem, com foco nas inter-relações humanas, sendo encorajados a sobrepor os traumas, agruras que pareciam eternizadas. Sempre chega o momento de defenestrar os fantasmas do passado, mesmo aqueles forjados na infância, diante de amplo aliciamento emocional.
Love tem um gosto amaro, é subversivo, mas ainda assim trata especialmente sobre o amor e suas invulgares manifestações. É uma narrativa tocante, sedutora, tendo certo grau poético pela capacidade de descortinar as idiossincrasias, relegadas na obra a uma eminente perspectiva verossímil.