Dentes de tigre

DENTES DE TIGRE

Miguel Carqueija

Resenha do romance policial “Arsène Lupin e os dentes do tigre”, por Maurice Leblanc. Ciranda Cultural Editora e Distribuidora Ltda., selo Príncipis, 2021. Título original francês: “Les dents du tigre”. Tradução: Andréia Manfrin Alves.

Romance excepcionalmente volumoso da série Arsène Lupin (400 páginas), a leitura me surpreendeu ao revelar detalhes exóticos da vida do ladrão de casaca durante os anos de seu desaparecimento quando, após servir na Legião Estrangeira, é capturado por nômades bérberes, mas dá um “golpe de estado” ajudado pelas mulheres do bando e se torna líder da tribo, e daí, através de guerrilhas, torna-se imperador do norte da África... sem que a Europa saiba disso.

Esse “fato” propicia a Lupin excelente base para negociar sua liberdade e uma carta branca para solucionar crimes misteriosos orquestrados por um vilão oculto.

Nas obras de Maurice Leblanc é comum a existência de mistérios tenebrosos, de fatídicos segredos de família que paralisam as pessoas atingidas, as impedem de falar a verdade ou revelarem o que está acontecendo; e o presente é influenciado por um passado já meio distante.

Embora seja um aventureiro e ladrão de luxo, Lupin sabe resolver enigmas como um verdadeiro detetive dedutivo. Ao contrário porém de Sherlock Holmes, Hercule Poirot, Nero Wolfe, Solar Pons ou Peter Winsey, impassíveis e nada emotivos, Lupin é passional, se aflige, tem repentes de raiva, despeito, ciúme e até ódio, o que faz dele um personagem pouco simpático. Além disso ele se apaixona perdidamente com muita frequência e aqui, usando o nome falso de Luís Perenna, sua paixão é Florence Levasseur, e isso contra toda a lógica, pois essa mulher, empregada na mansão de Lupin, mente para ele, esconde coisas terríveis e até se alia com quem deseja matá-lo.

Um tipo curioso na trama é o Brigadeiro Mazeroux, antigo cúmplice de Lupin, agora policial, que embora continue amigo do aventureiro é um estorvo sempre que Lupin quer fazer alguma coisa fora das regras.

A trama é extremamente elaborada com assassinatos misteriosos por envenenamento, cadáveres inesperados, revelações do passado, e uma trama dentro de trama maior, com um sujeito malvado fazendo da sua própria morte um meio de se vingar de duas pessoas. E embora assuste a perversidade desse personagem, por trás dele existe outro ainda pior.

É claro, a história apresenta alguns pontos fracos, mas realmente prende a atenção do início ao fim.

Rio de Janeiro, 29 de junho de 2022.