A Encíclica da Mãe do Redentor
A ENCÍCLICA DA MÃE DO REDENTOR
Miguel Carqueija
Resenha da Carta Encíclica “A Mãe do Redentor” (Redemptoris Mater), de João Paulo II. Edições Paulinas, São Paulo-SP, 3ª edição, 1987.
É sabido que o grande Papa São João Paulo II tinha uma ternura muito especial pela Virgem Maria e assim não é de espantar que a ela tenha dedicado toda uma encíclica. E magnífica, por sinal. O mundo deveria reconhecer mais o caráter de grandes escritores que muitos papas possuem.
Neste opúsculo (aproximadamente 100 páginas) João Paulo II discorre sobre Maria à luz do texto bíblico e lembra como sua devoção era propagada pelo antecessor Paulo VI:
“Durante o Concílio, o Papa Paulo VI afirmou solenemente que Maria é Mãe da Igreja, “isto é, Mãe de todo o povo cristão, tanto dos fiéis como dos Pastores”. Mais tarde, em 1968, na Profissão de Fé conhecida com o nome de “Credo do Povo de Deus”, repetiu essa afirmação de forma ainda mais compromissiva, usando as palavras: “Nós acreditamos que a Santíssima Mãe de Deus, nova Eva, continua no Céu a sua função maternal em relação aos membros de Cristo, cooperando no nascimento e desenvolvimento da vida divina nas almas dos remidos”.
Claro é que toda a tradição católica vê em Maria uma criatura especialíssima, agraciada singularmente pela Divindade, fato esse que, por luminoso que se mostra, infelizmente foi renegado pela maioria dos nossos irmãos protestantes, mas não pelos nossos irmãos ortodoxos. O Papa vai então buscar os valiosos testemunhos da Patrística: “As tradições coptas e etíopes foram introduzidas nessa contemplação do mistério de Maria por São Cirilo de Alexandria; e, por sua vez, celebraram-na com uma abundante florescência poética. O gênio poético de Santo Efrém, o Sírio, denominado “a cítara do Espírito Santo”, cantou infatigavelmente a Virgem Maria, deixando um rasto ainda visível em toda a tradição da Igreja siríaca. No seu panegírio da Theotókos, São Gregório de Narek, uma das mais fúlgidas glórias da Armênia, com vigoroso estro poético, aprofundou os diversos aspectos do mistério da Encarnação; e cada um desses aspectos é para ele ocasião de cantar e exaltar a dignidade extraordinária e a beleza esplendorosa da Virgem Maria, Mãe do Verbo Encarnado”.
João Paulo II fala ainda na afinidade do culto à Virgem Maria nas Igrejas católica, ortodoxa e as antigas Igrejas orientais, e no testemunho dos Concílios, da Antiguidade ao Vaticano II. Cita ainda Tertuliano e outros nomes de peso dos Padres da Igreja. O próprio S.João Paulo II, porém, inclina-se carinhosamente nos textos bíblicos para aprofundar a análise da importância de Nossa Senhora para os cristãos.
“O mensageiro (*), efetivamente, saúda Maria como “cheia de graça”; e chama-a assim como se este fosse o seu verdadeiro nome. (...) Na linguagem da Bíblia “graça” significa um dom especial, que, segundo o Novo Testamento, tem a sua fonte na vida trinitária do próprio Deus, de Deus que é amor (cf. 1 Jo 4,8). É fruto desse amor a “eleição” — aquela eleição de que fala a Carta aos Efésios. Da parte de Deus, essa “escolha” é a eterna vontade de salvar o homem, mediante a participação na sua própria vida divina (cf. 2 Pd 1, 4) em Cristo: é a salvação pela participação na vida sobrenatural. (...) Quando lemos que o mensageiro diz a Maria “cheia de graça”, o contexto evangélico, no qual confluem revelações e promessas antigas, permite-nos entender que aqui se trata de uma “bênção” singular entre todas as “bênçãos espirituais em Cristo”.
Assim, a singularidade de Maria — o seu caráter único em toda a humanidade — vai sendo destacada por S. João Paulo II com brilhantismo.
Aliás vale a pena ressaltar que são muitos os papas que também são verdadeiros e notáveis escritores, donos de estilos límpidos, eruditos e agradáveis.
(*) O Arcanjo Gabriel.
Rio de Janeiro, 15 a 18 de abril de 2022.