O limiar da esperança

O LIMIAR DA ESPERANÇA

Miguel Carqueija

 

Resenha do livro de entrevista “Cruzando o limiar da Esperança”, pelo Papa São João Paulo II, entrevistado por Vittorio Messori. Editora Francisco Alves, Rio de Janeiro-RJ, 2ª edição, 1994. Tradução de Antônio Angonese e Ephraim Ferreira Alves. Título original: “Crossing the threshold of hope”.

 

Com mais de 200 páginas em letras pequenas este é um substancial livro de entrevista, como pode-se dizer que virou moda entre os papas a partir de S.João Paulo II. Entretanto este volume não é uma entrevista comum. Cada capítulo é uma pergunta e a respectiva resposta. Há perguntas longas e respostas muito mais longas que se estendem por várias páginas. Dono de um cérebro privilegiado, o papa polonês está à vontade para se expressar de forma clara, objetiva e profunda. Como é sabido Wojtyla é o criador das JMJ — as Jornadas Mundiais da Juventude. A uma pergunta do repórter sobre a juventude ele se estende por seis páginas: “Nós precisamos do entusiasmo dos jovens. Temos necessidade da alegria de viver que os jovens têm. Nela se reflete algo da alegria originária que Deus teve ao criar o ser humano. Precisamente essa simplicidade os jovens experimentam em si próprios. É a mesma em todo lugar, embora seja sempre nova, original. Os jovens sabem exprimi-la à sua maneira”.

Indagando a Karol Wojtyla sobre a validade das provas da existência de Deus para o homem moderno, o jornalista recebe uma longa e suculenta resposta à qual não faltam referências autorais valiosas.

“O pensamento contemporâneo, afastando-se das convicções positivistas, deu passos notáveis na descoberta sempre mais completa do homem reconhecendo, entre outras coisas, o valor da linguagem metafórica e simbólica. A hermenêutica contemporânea — como se encontra, por exemplo, na obra de Paul Ricoeur ou, de outra maneira, na obra de Emmanuel Lévinas — nos mostra sob novos prismas a verdade sobre o mundo e sobre o homem.”

Sobre o Concílio Vaticano II:

“Eu, tive a sorte em particular de poder tomar parte no Concílio do primeiro até o último dia. Isso de modo algum estava previsto, pois as autoridades comunistas no meu país consideravam a viagem a Roma como um privilégio, totalmente administrado por elas. Por isso, se em semelhantes condições me foi dado participar do Concílio desde o início até o fim, com razão se pode julgar tal fato um dom especial de Deus.”

Dá gosto ler as linhas sábias, serenas e estilosas do Papa Wojtyla. Deve-se notar que não se trata de uma entrevista direta, como se fosse feita no avião: João Paulo II recebeu as perguntas e escreveu as respostas, naturalmente com madura reflexão. O resultado é excelente para que se possa aquilatar o valor e a importância daquele pontífice que ficou conhecido como o “João de Deus”.

 

Rio de Janeiro, 14 e 15 de outubro de 2021.