Escritos sobre a Penumbra
A editora Estúdio Armon se tornou conhecida pela publicação da antologia mensal Revista Action Hiken (RAH) e títulos de mangás nacionais. Em 2018 enveredou na edição de livros. O primeiro título do selo literário da Armon foi a coletânea de terror Penumbra: contos sombrios. A obra ilustrada reuniu roteiristas que já vinham publicando quadrinhos e iniciantes na literatura.
São 11 autores divididos em 250 páginas. Cada conto recebeu uma ilustração de Eddy Fernandes, ilustrador conhecido pelo primeiro sucesso da RAH, o mangá mudo O som da coragem. As imagens ambientam as tramas muito bem, além de conferir maior identidade ao projeto. O livro foi editado por Fábio Gesse, que também escreveu a Apresentação, mostrando um talento para a prosa que até então desconhecia. Desejaria ler alguma ficção dele no futuro.
O conto de abertura foi escrito pela quadrinista e motociclista Andressa Gohan. Patolli deve ter sido inspirado no filme Jumanji ou em alguma roda de RPG da vida. Na trama, um grupo de amigos se reúne para se divertir com um antigo jogo ameríndio, o que lhes trouxe graves consequências. Os personagens fogem dos estereótipos, são críveis em seus dilemas. Só esperei uma ameaça maior que a apresentada.
A coisa abaixo do abismo de Bruno Alfuro é uma história à moda lovecraftiana: cosmicismo, descrições ambíguas e muitas adjetivações. Como sou fã do estilo narrativo de H. P. Lovecraft, considerei um dos melhores. Usou muito bem os seus conhecimentos em biologia para descrever o fundo do mar. Se você já leu Dagon e O chamado de Chthulu vai gostar desse conto.
Xará do anterior, Bruno Vieira é mais conhecido no meio como um investidor em plataformas de autopublicação. Mas reside dentro de si um escritor fenomenal. Ao longe foi o conto que mais gostei. Comecei a ler sem pretensão, e acabei me surpreendendo com o drama de uma família que vive reclusa e que não pode ser tocada pelos raios solares. É intrigante, desesperador e traz aflição em quem lê.
Sanatorium é um conto de Érica Samizava, revisora dos títulos da Armon. Considero que esse conto se perdeu um pouco nas homenagens, embora tenha retratado o cenário do hospital e a contratação da protagonista de maneira crível. O conto é dividido em capítulos, o que deixou o terror dentro de um cenário limitado como o hospital um pouco entrecortado.
Mia foi escrito por Erix Oliver, quadrinista que acertou muito no one-shot da antologia HarmoniHQ, a ficção policial a Inclinação para o mal. Penso que em Mia o autor não reproduziu os mesmos acertos. De acordo o conceito de “arma de Tchekhov”, todos os elementos apresentados no conto devem ser relevantes para a trama. Oliver usou vários, um quadro, uma boneca e um quarto, e não senti ligação entre nenhum deles.
Gabriel Ota nos traz Diário de um homem louco, é difícil perceber se o que acontece no conto é real ou apenas um delírio do protagonista. Isso reflete também a indecisão do autor em dar o melhor rumo para a obra. Me pareceu que a história deveria ter ido por um lado, que era o de um terror psicológico introspectivo. Mas a narrativa abusa dos pontos cegos do leitor, e é bem cadenciada.
O Caçador Supremo inova ao trazer terror e elementos indígenas. Dividida em dois capítulos, Henrique Zimmerer inscreve nos elementos do folclore um horror sobrenatural que não e via há muito tempo. É curto, mas tem um desfecho inteligente e coeso. As árvores de olhos amarelos foi escritor por Ricardo Santos, que é odontólogo. Se passa no Japão e se inspira nas lendas do folclore nipônico.
O elevador de Caliban conta sobre um funcionário de uma multinacional de tecnologias. Dois fenômenos sobrenaturais acontecem no lugar, e o protagonista passa por um deles. Não ficou claro qual a relação entre os fenômenos. Não experimentei nenhum sentimento de urgência ao ler a obra. Me pareceu que não havia algo de relevante acontecendo. O conto também se arrasta muito para chegar ao que queremos.
Recomento a leitura da coletânea. A fonte escolhida no livro ficou perfeita, e o espaçamento muito adequado. Papel offwhite com boa gramatura, encadernação com capa fosca e lombada quadrada. O projeto gráfico ficou de ponta, apesar da dita inexperiência do editor. Em alguns contos, os diálogos começaram erroneamente com hífen, apenas os últimos são iniciados com travessão. Algumas palavras parecem agarradas umas às outras, e hifens parecem onde não deveriam.
Nada do supracitado impede a leitura, e podem ser facilmente corrigidos em futuras revisões. Cada conto possui um “FIM”, não era necessário, dá a entender que não seria possível continuação e spin-offs. Possui duas orelhas, uma com minibiografia do autores e autoras e com a história da Armon. Considerado esse um piloto, a Armon foi bem-sucedida. O projeto é consistente e trouxe boas narrativas nesse primeiro volume.
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