Uma visão beneditina sobre o divórcio

UMA VISÃO BENEDITINA SOBRE O DIVÓRCIO

Miguel Carqueija

 

Resenha do opúsculo “Beneditinos contra o divórcio”, por Dom Marcos Barbosa, Dom João Evangelista Enoud, Dom Justino Luz Paoliello e Dom Lourenço de Almeida Prado. Edição particular, 1977, composta e impressa na Editora Vozes-Petrópolis, RJ.

 

Conforme explica Dom Marcos na apresentação do fascículo, a publicação, como parte da série “Encontro marcado” (programa de apostolado radiofônico pela Rádio Jornal do Brasil), é uma iniciativa do médico Paulo Xaltron Avilez, que, tendo retornado à prática do catolicismo graças às palestras de Dom Marcos, decidiu ajudar na difusão das mesmas, distribuindo cópias e até editando folhetos como este.

Anos atrás ocorrera intenso debate e por fim a lei do divórcio passou. Os quatro monges mencionados, todos do Mosteiro de São Bento do Rio de Janeiro, posicionaram-se contra o divórcio, ou melhor, a favor da instituição do casamento, e com argumentos sólidos e serenos.

Dom Marcos Barbosa é uma figura de ressonância no cenário cultural do país. Foi membro da Academia Brasileira de Letras, do Conselho Federal de Cultura e do Pen-Clube; traduziu “O Pequeno Príncipe” e as “Pílulas de otimismo” e ele próprio lançou diversos livros, como “Poemas do Reino de Deus”.

Dom João Evangelista, prior do Mosteiro, apresentava na Rádio MEC um programa de música sacra, o “Som infinito”.

Dom Lourenço de Almeida Prado era o quase lendário reitor do Colégio São Bento, função que exerceu durante décadas.

Dom Justino era um monge exemplar mas conheço pouco de suas atividades, porém conheci todos eles.

Nos anos 70 a questão do divórcio estava acesa, provocando muitas polêmicas. O livreto expõe a posição da Igreja através de homens cultos, sacerdotes ilustres e altamente civilizados. Os argumentos utilizados têm peso. Vejam o que diz Dom Marcos: “E como procederíamos no caso em que apenas um dos cônjuges julga ter deixado de amar, enquanto o outro o ama e ainda o considera indispensável?” “... as mães, estando pela própria natureza muito mais ligadas aos filhos, ver-se-iam constantemente com o encargo dos mesmos, não tendo os ex-maridos recursos para sustentar duas famílias”.

Não que a Igreja Católica seja contra qualquer separação do casal, necessária mesmo em casos de prática de violência; mas a lei do divórcio como que incentiva a separação por razões fúteis segundo aquele ditado cínico: “que o amor seja eterno enquanto dure”. E Dom Marcos prossegue citando Gustavo Corção em “Claro-escuro”: “Para a criança em baixa idade, a união de pai e mãe tem um caráter especial que o adulto, sem alguma reflexão ou intuição de amor, não pode atingir”.

Dom Justino argumenta que a lei do divórcio apresenta efeitos nefastos: “Um destes efeitos é o de tornar vulnerável todo e qualquer casamento, diminuindo, de início, seu sentido de doação total, generosa e irrevogável, seu sentido de amor, destruindo-o. Outro, o de seguir solução fácil, aparentemente fácil, para os desajustes de um casal”.

Dom João Evangelista prossegue a tese: “Não há filho, então, que em pesadelo ou, o que é pior, numa naturalidade de indiferença, não se pergunte quem poderá ser amanhã, em vez de seu pai, o marido de sua mãe, ou em vez desta, a mulher de seu pai. Quem, seus concorrentes, no amor dessas pessoas, com o possível nome de irmãos”.

E o eminente Dom Lourenço, com sua vasta autoridade de educador, acrescenta: “Não há quem ignore que não houve, até hoje, nenhum psicólogo sério que tenha encontrado uma solução educacional para os filhos de pais separados”.

Com certeza o casamento estável e monogâmico é preferível a esse hábito muito comum na “alta” sociedade e meio artístico, de casar, descasar, juntar, separar, uma porção de vezes com N pessoas diferentes, ao longo da vida. Que belo isto sim é ver como um casal católico do meio artístico, Rita Pavone e Teddy Reno, alcançar os 53 anos de união neste 2021.

As palestras destes quatro monges merecem reflexão.

 

Rio de Janeiro, 27 de maio a 2 de junho de 2021.