Desçamos todos a cova
O cemitério é a linha de chegada de todos nós. Somos os únicos seres que temos a certeza da morte, e lembramos durante toda a vida de nossa melancólica sina. Foi com sentimentos fúnebres que participei da Antologia Campos Santos da editora Sem Tinta. A editoração e publicação aconteceu no ano de 2020, recebendo financiamento coletivo através do Catarse.
O tema da obra foi o cemitério no século XIX. O livro foi organizado por Guilherme Milner e Erick Alves, contando com 14 contos de autores nacionais das mais diversas regiões do Brasil. Esse cenário nos possibilitou escrever variados contos, sejam eles apelando para o terror, a ficção história e o romance. O projeto gráfico ficou excelente, Erick Alves mais uma vez mostrou sua competência no projeto gráfico.
A obra acabou sendo publicada em um momento de pandemia, provocada pelo COVID-19. O clima sombrio desses tempos de morticínio e necropolítica parecia ser um momento pouco adequado para esse tipo de literatura, mas, contrariando nossas expectativas, o livro conseguiu ser financiado com sucesso. Nós escritores nos esforçamos muito para que esse trabalho fosse publicado.
O resultado ficou muito bom, começando pela capa, tem o tom sinistro para ambientar a obra. O prefácio ficou a cargo de Guilherme Milner. São mais de 200 págs., com orelhas. Cada capítulo é ilustrado com uma imagem padrão e biografia dos autores e autoras. Muitos desses escritores e escritoras já são meus conhecidos, e os contos me agradaram muito.
Nessa coletânea eu publiquei o conto O misterioso caso da cidade de Benza’ Deus, conto ambientado no interior da Bahia, tratando de sanitarismo, epidemias e eventos estranhos na construção de um cemitério municipal. Agora farei um comentário sobre os três contos que eu mais gostei. Lembrando que esse tipo de análise é particular, e se refere mais a minha experiência de leitura.
A epidemia de morte foi escrita por Danilo Mattos Ferreira. O protagonismo é o viúvo Artur Gonzaga, que perdera sua esposa Carolina e filho após a gravidez que terminara em uma eclampsia. O conto foca em crenças das caças as bruxas — ainda corrente no século XIX —, e misoginia. Tem um final surpreendente! Realmente eu não esperava aquela resolução.
Alexandre Torres escreveu o ótimo conto As melhores linguiças desse mundo. O caso narra uma série de crimes ocorridos em 1863-64, envolvendo canibalismo. Inclusive, o caso foi abafado pelas autoridades policiais e acabou sendo registrado até por Charles Darwin em seus escritos. O autor reconstruiu os atos hediondos de José Ramos com tonalidades fantásticas, deixando a coisa ainda mais aterradoras.
O terceiro que mais gostei foi O pesadelo das duas covas do Pedro Martinez. Esse conto oferece uma trama curta, mas muito instigante e bem construído. A história trata sobre Abraham, um homem que acaba passando por uma terrível experiência: seriam seus pesadelos uma terrível premonição? Na busca dessa resposta, ele consulta um espiritualista, e decide refazer os eventos do seu pesadelo.
De modo geral, o livro está excelente. Com boa impressão e encadernação, orelhas e papel offwhite com páginas escurecidas na apresentação de cada conto. O prefácio instiga a leitura e ajuda muito a entender o contexto histórico. Muitos dos contos tratam de terror, e serão em apreciados pelos fãs do gênero. Recomendo muito a leitura para aqueles que não tem medo de lápides e portões rangentes.
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