"Intempérie" de Jesús Carrasco: uma interessante surpresa...
“Intempérie”, romance do escritor espanhol Jesús Carrasco, publicado originalmente em 2013 e traduzido em vários países. Esse foi um livro que comprei pela capa, bem inusitada, mostrando um jovem segurando um fragmento de osso facial em frente ao próprio rosto, e que se provou uma leitura interessante.
Na história, um garoto se encontra escondido em um buraco, fugindo de homens que o perseguem. Em uma região árida e inóspita, durante a fuga, o caminho do garoto se cruza com a de um pastor de ovelhas de poucas palavras.
Carrasco cria um romance atemporal, sem especificar o local e o tempo em que se passa a ambientação. Se, por um lado, isso torna um pouco genérico o relato, por outro lado torna a trama palatável para qualquer região do mundo que sofra com a fome imposta pela seca, pela aridez, pelos governantes.
A relação entre o garoto e o pastor é praticamente monossilábica, o que exige um aparato descritivo da comunicação não-verbal, dos sentimentos dos protagonistas, seus medos, seus gestos. O autor é bem-sucedido nessa questão, ainda que em momentos isolados a leitura se torne demasiado arrastada, pelo ritmo e em grande parte devido ao uso de vocábulos pouco usuais, o que me levou a recorrer ao dicionário. O uso excessivo dessas palavras me pareceu um tanto forçado, pouco natural.
Apesar dessas questões pontuais, “Intempérie”, ainda que tenha uma ambientação genérica, apresenta pontos interessantes em seu dinâmico relato. Há um trabalho satisfatório na construção dos personagens, simples em essência, sem demasiados conflitos a serem trabalhados. A impressão é que o foco está na construção do plano de fundo, o ambiente em si, de certa forma, apesar do tom genérico, como já citado. Isso é inusitado, mas não compromete a experiência literária. No resumo da ópera, uma ótima leitura.
NOTA: 4/5 (ótimo).
FICHA: CARRASCO, Jesús: tradução de Luís Carlos Cabral. Intempérie. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2015, 182 páginas. Título original: Intemperie.