"Como nasce um terrorista"

ROBERT, Vernaik. Jihadi John: Como nasce um terrorista. Rio de Janeiro: Harper Collins, 2018. 300p.

O livro aborda a complexa relação da sociedade britânica com a crescente comunidade islâmica que lá está estabelecida. O autor rastreia o processo de radicalização de Mohammed Emwazi que, de um jovem muçulmano tímido com formação universitária em Westminster, veio a transformar-se no frio e cruel “Jihadi John”, do Estado Islâmico. Aquele que, em 2014, aterrorizou o mundo com as decapitações de reféns transmitidas pela internet.

A obra trata de um tema bastante sensível, não só na Inglaterra, mas na Europa, que é a crescente chegada de imigrantes ou refugiados oriundos do Norte da África e do Oriente Médio, particularmente da Síria, que se tornou o centro de operações do Estado Islâmico.

Lastreado por documentos e entrevistas, tanto com pessoas e organizações da comunidade islâmica londrina como com integrantes do serviço secreto britânico, o Jornalista traça a gênese do Estado Islâmico. Os movimentos de contestação ao poder que varreram o Oriente Médio e o norte da África em 2012, deram origem a diversos grupos muçulmanos radicalizados contra o Ocidente cujos alvos específicos são a Europa e os EUA.

Robert delineia a trajetória de jovens de famílias muçulmanas que se instalaram na Inglaterra como imigrantes. O fato de serem originários de regiões marcadas por conflitos cujos protagonistas são grupos muçulmanos radicalizados os torna alvo de discriminações e exclusões já a partir de sua inserção nas escolas inglesas de ensino fundamental.

Quando chegam na Inglaterra esses imigrantes são recebidos com desconfiança em função de todo o histórico de atos terroristas na Inglaterra e EUA praticados por radicais islâmicos. Isso faz com que os órgãos de segurança e inteligência ingleses mantenham cerrada vigilância submetendo-os a interrogatórios constantes, ameaças veladas ou explícitas de deportação além da tentativa de cooptá-los para se tornarem informantes. Tal situação, em alguns casos, cria grandes dificuldades a essas famílias na tentativa de condução de uma vida normal porque estão sempre sob suspeita. A suposição prévia é que, sendo muçulmanos e, com o agravante de serem do Oriente ou norte da África, tem quase que necessariamente algum vínculo com o terrorismo.

O autor critica as estratégias utilizadas pelos órgãos de segurança ingleses na abordagem desses imigrantes. Por seu teor invasivo e ameaçador tende mais a empurrar esses jovens para a radicalização do que a inseri-los como legítimos cidadãos ingleses. Várias denúncias foram feitas no sistema de justiça inglês para verificação de abusos cometidos por esses órgãos nas suas abordagens, porém, sem grandes consequências. As justificativas quase sempre giram em torno de tratar-se de questões de segurança nacional e que as abordagens teriam partido de indícios que dariam legitimidade às ações. Por outro lado, não é possível simplesmente ignorar o fato de que há jovens efetivamente envolvidos em movimentos que os orientam a uma postura de antagonismo ao Ocidente. E, sim, há alguns líderes muçulmanos operando nas mesquitas inglesas com fortes sentimentos favoráveis ao radicalismo.

O livro é escrito na dinâmica linguagem jornalística o que torna a leitura agradável. Embora os capítulos sejam longos, o tema abordado é capaz de manter o interesse do leitor desde o início. No meu caso só consegui parar depois de percorrer em dois dias as eletrizantes 300 páginas.