Resenha: O Cemitério, de Stephen King LIVRO + FILME (O Livro da vez por David Thomas)
Análise da Obra
1. Informações técnicas da obra:
• Título da Obra: O Cemitério;
• Autor/Autora da obra: Stephen King;
• Editora: Suma de Letras;
• Data de publicação: 1983.
2. Espírito/ Essência da obra:
• Gênero textual: Terror;
• Ambiente físico e temporal da obra: Ludlow - Maine, EUA; Algumas partes em Chicago;
• Tipo de narrador: Narrador Onisciente Neutro em terceira pessoa.
3. Enredo:
O Dr.Louis Creed, sua esposa Rachel Creed e seus dois filhos, Ellie Creed e Gage Creed se mudam de Chicago para a cidade de Ludlow, no estado americano do Maine. A família tem um gato chamado Church. Todos ficam empolgados com a casa nova esperançosos com o início de uma nova vida que acabara de iniciar. São recepcionados pelo vizinho Jud Crandall que imediatamente os ajuda na mudança e lhes fala um pouco das histórias e particularidades da região. Jud e Louis ficam amigos de imediato. Muito próximo a casa da família Creed há uma estrada que constantemente passam caminhões e exatamente por isso Jud Crandall aconselha o novo vizinho a castrar o felino, pois é muito comum os animais domésticos da região serem atropelados na estrada. As mortes dos animais domésticos da vizinhança se tornaram tão comum que adentrando uma trilha existe um cemitério de animais que por anos as crianças os têm enterrado nesse local. Jud Crandall apresenta o cemitério de animais para a família. Após a visita ao local, Ellie Creed começa a refletir sobre a morte, especialmente a de Church e faz as perguntas básicas que qualquer criança costuma fazer aos pais. Assim que a família começa a se adaptar à nova realidade, sem nenhuma explicação aparente, ao abraçar o filho mais novo, Gage, Louis Creed tem um pressentimento ruim que não consegue identificar, até porquê como médico, ele não acredita em nada que não possa ser cientificamente provado. O conflito começa quando numa das primeiras manhãs de trabalho de Louis Creed, um jovem entra no hospital universitário, atropelado num trágico acidente. Esse rapaz morre nas mãos de Louis Creed e mesmo morto, faz uma profecia para o médico, orientando-o a não ultrapassar os limites do cemitério de animais. Na mesma noite, Louis Creed tem uma espécie de pesadelo, com sensações muito reais, com Victor Pascal, o jovem atropelado. Ele faz com que Louis Creed visite no sonho o cemitério de animais e mais uma vez o aconselha a não ir além dos limites do cemitério. Quando acorda, crendo que tivera um sonho ruim, Louis Creed percebe que os pés dele estão sujos de lama e o ferimento que fizera num braço no sonho, realmente acontecera. Mesmo com medo, Louis Creed atribui esse evento a uma crise de sonambulismo. Mesmo diante desse evento assustador, Louis Creed e a família acabam se habituando dia após dia ao local. Algo muito curioso é um momento que a mulher de Jud Crandall, Norma Crandall (que nas duas adaptações para o cinema não aparece), sofre um derrame e Ellie Creed encara a morte da vizinha com muito mais naturalidade do que encarou ao simplesmente cogitar a morte do gato. No dia de Ação de Graças, Rachel e os filhos viajam para a casa dos pais dela e Louis Creed fica sozinho. Logo cedo ele recebe uma ligação de Jud Crandall informando que o gato da família, Church, fora atropelado na famosa rodovia. O inverno já havia chegado e enquanto caminha até a casa do vizinho, Louis ainda tenta manter a esperança – coisa que no fundo ele sabia que não seria verdade – que o gato morto não seria o seu. Confirma que de fato fora Church mais uma vítima da Estrada 15. Pretendendo enterrá-lo no “Cemitério de Bichos”, Jud Crandall o leva para um cemitério mais adiante e os dois atravessam a barreira que o espectro de Victor Pascal lhe dissera para não ultrapassar. O curioso de se observar são as inúmeras sensações que vão se apoderando de Louis. Primeiramente ele percebe que há um terrível segredo no local, sente que existe um poder ali. Mesmo realizando algo tão mórbido, especialmente numa noite gelada de inverno, há um sentimento de contentamento dentro dele muito difícil de explicar. Enquanto caminham, Louis Creed escuta risadas, gargalhadas dentro da escuridão. Quando finalmente chegam ao cemitério desconhecido, Jud pede para Louis Creed cavar uma sepultura e só quando começa a cavar, Louis se dá conta que o solo é bem pedregoso. O Cemitério fora construído por uma tribo indígena chamada “Micmacs”. Mesmo sem saber o porquê, Louis, com muita dificuldade, abre uma sepultura e enterra Church. Pouco depois, quando Louis Creed está na garagem da casa, o gato aparece, vivíssimo diante dele. Mesmo sem saber a razão da caminhada noturna até o cemitério, Louis deixa claro que no fundo ele sabia que se o gato fosse enterrado ali, ele voltaria, ressuscitaria, mesmo que ao mesmo tempo tentasse enganar a si mesmo dizendo que o gato não morreu, que havia desmaiado ou que esse novo gato nada mais era do que um outro gato muito parecido com Church. Porém o gato não volta como antes, volta com uma essência ruim, perde o ronronar felino, além de ter um cheiro de terra que banho nenhum consegue tirar. Rachel Creed tem “Necrofobia” devido a morte tenebrosa da irmã, Zelda, que logo cedo desenvolveu meningite raquidiana (tanto no livro quanto no filme as cenas são medonhas). Os pais de Rachel Creed logo se encarregaram de esconder Zelda no quarto dos fundos e a família ansiava pela morte dela, já que ela definhava dia após dia, tornando-se um monstro, com o corpo cada vez mais contorcido e as mãos como as patas de um passarinho. Rachel Creed viu o agravamento da doença da irmã assim como presenciou sua morte. O caso da irmã de Rachel Creed me lembrou muito “A Metamorfose”, de Franz Kafka, exatamente pela forma como a família reage, inclusive Rachel Creed, à transformação de Zelda. Um exemplo disso ocorre logo após a morte dela, pois imediatamente limparam o quarto dela, perfumaram e deram outra utilidade para ele. Desde então Rachel Creed não compareceu ao enterro de Zelda nem nenhum outro. Pouco depois a Rodovia 15 faz uma nova vítima, mas desta vez não será um animal e sim o filho mais novo do casal Creed. O caminhão que o atropela fizera tamanho estrago que foram obrigados a velar o corpo com o caixão fechado para não chocar os presentes. Louis Creed se culpa pois antes de Gage correr em direção a rodovia, ele conseguira encostar na jaqueta do garoto, mas não conseguira segurá-lo, além do pai de Rachel constantemente o acusar da morte do neto, inclusive no próprio velório eles acabam brigando e o caixão da criança cai, deixando a mão da criança a mostra, uma cena horrorosa. Mesmo com todas as advertências de Jud Crandall, Louis decide desenterrar o filho recém sepultado e enterrá-lo no cemitério Micmac, trazê-lo de volta à vida. Para isso, ele vai induzir à esposa e à filha para irem passar umas semanas na casa dos pais de Rachel Creed. Ellie, em Chicago, na casa dos avós, começa a sonhar com Victor Pascal, advertindo-a de que o pai está prestes a cometer um grande erro (muito espírita isso, não é!?). Louis Creed abre o túmulo do filho e imediatamente vomita com o cheiro, ele limpa um musgo já tão desenvolvido no rosto de Gage Creed que por um momento ele acreditou que o filho estava sem cabeça. Olhar para Gage era como olhar um boneco malfeito, deformado. Como já se passara alguns dias do enterro de Gage e com quase certeza que o corpo do filho iria se decompor em seus próprios braços, Louis Creed o enrola numa lona e o leva até o cemitério Micmac. Enquanto caminham, um cão começa a uivar para o corpo de Gage, isso me lembrou “Enquanto agonizo”, de William Falkner em que os corvos seguem o caixão junto com a família que viaja para a cidade natal da falecida. Gage volta, mas não como antes. Primeiro ele mata Jud Crandall e depois a própria mãe (na adaptação de 2019 Ellie que morre e ambas matam Louis Creed, bem diferente do livro). Louis Creed (assim como Victor Frankenstein) acaba o matando. Mas como o lugar tem uma atração perigosa, depois de matar (novamente) Gage e Church, Louis Creed desenterra a mulher na esperança de enterrá-la no cemitério Micmac e com ela o processo ser diferente.
4. Aspectos influenciadores da obra (Biografia)
• "O Cemitério" é definido pelo próprio Stephen King como "o mais assustador de todos". Ele nunca teve a intenção de publicar a obra por ser muito pesada. Ele ficou apavorado com o que escreveu. Tabby King também ficou horrorizada e o aconselhou a deixar o livro na gaveta. Stephen King seguiu a orientação, por um tempo. Mas pela vontade dele, o livro nunca teria sido publicado;
• O Cemitério de Animais de fato existiu e foi feito pelos próprios filhos dos King. Começando com um pássaro e depois para outros. Stephen King muitas vezes buscou o local para poder escrever tranquilamente;
• O Gato da família, assim como Church, acaba atropelado por um caminhão. Diferente de Rachel Creed, Tabby King conta para a filha sobre a morte do animal. A família preparou um funeral, fizeram uma lápide, etc;
• Um dia um dos filhos dos King correu em direção a rodovia (com um tráfico intenso e que morriam muitos animais) e por pouco não foi atropelado. Esse é um dos principais acontecimentos que contribuíram para a construção da obra;
• Houve uma situação na vida do autor que o levou, com muita relutância, a ser literalmente chantageado pela Doubleday e publicar o livro. Na época o autor estava cogitando diminuir o consumo de cocaína e álcool, a publicação de “O Cemitério” o deixou tão desiludido que em seguida seu consumo de bebidas e drogas só se intensificou;
• Apesar do gênero do autor (Terror), Stephen King tem uma filosofia de tentar terminar seus romances num tom positivo. “O Cemitério” e “Cão Raivoso” são as exceções;
• O livro lembra “Frankenstein”, de Mery Shelly em alguns aspectos. Primeiro por ser mais um livro que mostra a tentativa do homem de “ser Deus” (embora a crítica nesse livro seja a nossa dificuldade em lidar com o luto e o medo nato da morte, bem diferente da crítica encontrada em “Frankenstein”. Assim como Victor Frankenstein se horroriza com a sua criatura, Louis Creed também sente repugnância quando Church encosta nele, só que no caso de Creed, ele cometera o mesmo erro duas vezes. Agora a semelhança principal está exatamente na consequência de se trazer os mortos à vida. Tal como na Criatura quanto com Gage Creed, as consequências dessa atitude foram idênticas e devastadoras.
David Thomas Martinez, 12/11/2020
6. Referências Bibliográficas:
• King, Stephen Edwin. O Cemitério; 1ªEd. EUA: Suma de Letras, 1983;
• Rogak, Lisa. A Biografia: Coração Assombrado: Longa vida ao rei. 1ªEd. Darkside, 2017;