O Mowgli original
O MOWGLI ORIGINAL
Miguel Carqueija
Resenha da coletânea “O livro da jangal” (“The jungle book” e “The second jungle book”), de Rudyard Kipling. Editora Martin Claret, São Paulo-SP, 2005. Tradução: Alex Marins. Capa: Cláudio Gianfardoni. Prefácio de Luiz Carlos Gabriel. Ilustrações internas: Fritz Eichenberg, Eduardo Freitas, S. Tresilian, Paul Durand.
Com certeza muita gente só conhece Mowgli pelo célebre desenho póstumo de Walt Disney, onde o urso Balú (Baloo) ficou popular com a cançao do “necessário, somente o necessário”. O desenho porém suavizou bastante a história do menino criado por lobos na selva hindu. A história original, uma sequência de contos, não é infantil e sim juvenil. “O livro da jangal” (ou “jângal”, ou seja, a floresta) teve sua primeira edição em 1894 e o “Segundo livro da jangal” em 1895. Mowgli, portanot, antecipou o Tarzan de Edgar Rice Burroughs, surgido em 1912.
OS IRMÃOS DE MOWGLI – O primeiro conto mostra a alcateia de lobos chefiados por Akela. Um casal de lobos o recebe, mas o tigre Shere Khan deseja devorá-lo. Começa a polêmica em torno do “filhote de homem” entre os animais, porém o urso Baloo e a pantera Baghueera (ou Baguera) o defendem.
Kipling, com estilo escorreito e atraente, soube criar um universo lógico no imaginário de animais que possuem raciocínio e linguagem em comum e ostentam nomes próprios. Existe a chamada “Lei da Jângal”, nsinada pelo velho urso Baloo. Shere Khan é desde o início o vilão (um deles), como no desenho, mas esbarra com muita oposição.
AS CAÇADAS DE KAA – Aqui o menino-lobo já meio crescido, mas ainda inexperiente, é raptado pelo povo-macaco e entra em cena também a serpente gigante Kaa. A ação se passa numa cidade abandonada na selva, que se tornou reduto da macacada.Kaa, uma vilão meio cômica no desenho, no livro é uma píton sábia e amiga de Mowgli, ainda que perigosíssima. O Rei Lu (King Loo) do desenho não existe; os macacos são anarquistas, não possuem chefe.
COMO APARECEU O MEDO – Uma prolongada seca atormenta os animais da jângal. Surge Hathi, que determina a trégua entre as várias espécies — predadores e presas — para que todas possam utilizar o bebedouro restante. Shere Khan continua sendo mostrado como um ser desprezível, um tigre que caça homens da aldeia — mas no fundo o homem é que é o grande predador do planeta.
Esses contos são acompanhados por curiosos poemas. Este aqui, por exemplo, encerra com a poesia “Lai da Jângal”, vejam esta quadra:
“O chacal segue o tigre, mas tu, lobosinho,
mal te crescerão os bigodes, com vigor,
apenas poderás confiar em ti mesmo,
lembra-te bem: o Lobo é sempre caçador.”
TIGRE! TIGRE! – Conto que focaliza o confronto final entre Mowgli e Shere Khan. Cada vez mais a figura de Mowgli, ainda um menino, vai adquirindo ares de poder, na sua influência sobre o reino animal e seu controle sobre os acontecimentos. Kipling até poderia ter criado uma saga mais vasta, com romances, a exemplo do que mais tarde faria Edgar Rice Burroughs. Há no personagem Mowgli uma certa crueldade, como também no Tarzan de Burroughs, mas isso reflete a própria crueldade aparente da vida natural e das constantes lutas entre as espécies.
O ANKUS DO REI – História muito estranha onde Mowgli acompanha sua amiga, a píton Kaa (tipo de cobra gigante, não venenosa) até a toca de uma cobra branca, que se julga a guardiã de um tesouro real, proveniente de uma grande cidade que a serpente julgava ainda existir, mas que na verdade já havia desaparecido.
Quando a cobra branca, de espécie venenosa, resolve matar e comer Mowgli (apesar de ser este um convidado de Kaa) o rapaz mostra-se muito seguro de si para enfrentar o réptil: “Essa brancura só lidou até agora com homens da Alcatéia. Não me conhece. Quer luta. Pois que a tenha.” Como se vê, o Mowgli original é bem diferente daquele do desenho!
O termo “ankus” refere-se a um aguilhão para elefantes domésticos,que se encontrava no tesouro da toca e Mowgli utiliza para se defender da víbora.
O AVANÇO DA JÂNGAL – Aqui se conta a desforra de Mowgli contra seu inimigo Buldio e demais habitantes da aldeia, que haviam tentado matá-lo, e como, auxiliado por Hathi e outros animais, ele salva a sua mãe e força o abandono da aldeia. Cada vez fica mais claro que Mowgli tem uma mente poderosa, e é dotado de um corpo poderoso, e executa façanhas extraordinárias com grande segurança de si mesmo. Poderia até ser considerado um super-herói, como o Tarzan às vezes é relacionado.
Rio de Janeiro, 20 de maio de 2018.
O MOWGLI ORIGINAL
Miguel Carqueija
Resenha da coletânea “O livro da jangal” (“The jungle book” e “The second jungle book”), de Rudyard Kipling. Editora Martin Claret, São Paulo-SP, 2005. Tradução: Alex Marins. Capa: Cláudio Gianfardoni. Prefácio de Luiz Carlos Gabriel. Ilustrações internas: Fritz Eichenberg, Eduardo Freitas, S. Tresilian, Paul Durand.
Com certeza muita gente só conhece Mowgli pelo célebre desenho póstumo de Walt Disney, onde o urso Balú (Baloo) ficou popular com a cançao do “necessário, somente o necessário”. O desenho porém suavizou bastante a história do menino criado por lobos na selva hindu. A história original, uma sequência de contos, não é infantil e sim juvenil. “O livro da jangal” (ou “jângal”, ou seja, a floresta) teve sua primeira edição em 1894 e o “Segundo livro da jangal” em 1895. Mowgli, portanot, antecipou o Tarzan de Edgar Rice Burroughs, surgido em 1912.
OS IRMÃOS DE MOWGLI – O primeiro conto mostra a alcateia de lobos chefiados por Akela. Um casal de lobos o recebe, mas o tigre Shere Khan deseja devorá-lo. Começa a polêmica em torno do “filhote de homem” entre os animais, porém o urso Baloo e a pantera Baghueera (ou Baguera) o defendem.
Kipling, com estilo escorreito e atraente, soube criar um universo lógico no imaginário de animais que possuem raciocínio e linguagem em comum e ostentam nomes próprios. Existe a chamada “Lei da Jângal”, nsinada pelo velho urso Baloo. Shere Khan é desde o início o vilão (um deles), como no desenho, mas esbarra com muita oposição.
AS CAÇADAS DE KAA – Aqui o menino-lobo já meio crescido, mas ainda inexperiente, é raptado pelo povo-macaco e entra em cena também a serpente gigante Kaa. A ação se passa numa cidade abandonada na selva, que se tornou reduto da macacada.Kaa, uma vilão meio cômica no desenho, no livro é uma píton sábia e amiga de Mowgli, ainda que perigosíssima. O Rei Lu (King Loo) do desenho não existe; os macacos são anarquistas, não possuem chefe.
COMO APARECEU O MEDO – Uma prolongada seca atormenta os animais da jângal. Surge Hathi, que determina a trégua entre as várias espécies — predadores e presas — para que todas possam utilizar o bebedouro restante. Shere Khan continua sendo mostrado como um ser desprezível, um tigre que caça homens da aldeia — mas no fundo o homem é que é o grande predador do planeta.
Esses contos são acompanhados por curiosos poemas. Este aqui, por exemplo, encerra com a poesia “Lai da Jângal”, vejam esta quadra:
“O chacal segue o tigre, mas tu, lobosinho,
mal te crescerão os bigodes, com vigor,
apenas poderás confiar em ti mesmo,
lembra-te bem: o Lobo é sempre caçador.”
TIGRE! TIGRE! – Conto que focaliza o confronto final entre Mowgli e Shere Khan. Cada vez mais a figura de Mowgli, ainda um menino, vai adquirindo ares de poder, na sua influência sobre o reino animal e seu controle sobre os acontecimentos. Kipling até poderia ter criado uma saga mais vasta, com romances, a exemplo do que mais tarde faria Edgar Rice Burroughs. Há no personagem Mowgli uma certa crueldade, como também no Tarzan de Burroughs, mas isso reflete a própria crueldade aparente da vida natural e das constantes lutas entre as espécies.
O ANKUS DO REI – História muito estranha onde Mowgli acompanha sua amiga, a píton Kaa (tipo de cobra gigante, não venenosa) até a toca de uma cobra branca, que se julga a guardiã de um tesouro real, proveniente de uma grande cidade que a serpente julgava ainda existir, mas que na verdade já havia desaparecido.
Quando a cobra branca, de espécie venenosa, resolve matar e comer Mowgli (apesar de ser este um convidado de Kaa) o rapaz mostra-se muito seguro de si para enfrentar o réptil: “Essa brancura só lidou até agora com homens da Alcatéia. Não me conhece. Quer luta. Pois que a tenha.” Como se vê, o Mowgli original é bem diferente daquele do desenho!
O termo “ankus” refere-se a um aguilhão para elefantes domésticos,que se encontrava no tesouro da toca e Mowgli utiliza para se defender da víbora.
O AVANÇO DA JÂNGAL – Aqui se conta a desforra de Mowgli contra seu inimigo Buldio e demais habitantes da aldeia, que haviam tentado matá-lo, e como, auxiliado por Hathi e outros animais, ele salva a sua mãe e força o abandono da aldeia. Cada vez fica mais claro que Mowgli tem uma mente poderosa, e é dotado de um corpo poderoso, e executa façanhas extraordinárias com grande segurança de si mesmo. Poderia até ser considerado um super-herói, como o Tarzan às vezes é relacionado.
Rio de Janeiro, 20 de maio de 2018.