Grandes poetas: Castro Alves
GRANDES POETAS: CASTRO ALVES
Miguel Carqueija
Resenha da coletânea “Poesias completas de Castro Alves, 1” (A Cachoeira de Paulo Afonso/Os escravos/Traduções e inéditos). Edições Spiker, Rio de Janeiro-GB (atualmente RJ), sem data. Introdução de Agripino Grieco.
Sendo o exemplar que me chegou às mãos encadernado com capa dura, pode ser que a capa original tenha sido arrancada (infelizmente faziam isso) e portanto não dou certeza se de fato a edição não é datada. É antiga, sua dona escreveu o seu nome — Andréa Gomes Cordeiro e a anotação Niterói, março de 1962.
Castro Alves foi um desses poetas brasileiros dos séculos 19 e 20 que morriam cedo, de tuberculose e outros problemas, sem ter sequer chegado aos 30 anos. Este, por exemplo, morreu aos 24. Era uma consequência natural da vida boêmia, entre outros fatores.
Ele foi um cantor da liberdade, revoltado principalmente com a condição dos escravos, mancha que infecta nossa história imperial. Os versos de Castro Alves sob esse aspecto são inflamados e potentes.
“A Cachoeira de Paulo Afonso” é uma pequena novela em versos, que aborda a condição dos cativos, onde a Justiça não impera; e onde não se consegue punir o próprio crime de estupro.
“Ser escravo — é nascer no alcouce escuro
Dos seios inflamados da verdade...
Filho da perdição no berço impuro
Sem leite para a boca ressequida...”
Poema trágico, onde a cachoeira do título irá desfechar tetricamente a sorte dos amantes, é obra imortal da nossa literatura.
“Os escravos” dá prosseguimento ao indignado libelo do poeta. Castro Alves canta inclusive o ódio, o desejo de vingança, em si funesto e mau; mas como diz o ditado, violência gera violência. Ele não esquece a triste sorte de mulheres e crianças vitimadas pelo preconceito. Aí vem “O navio negreiro” com a dramática descrição da infâmia e o grandioso final:
“Fatalidade atroz que a mente esmaga!
Extingue nesta hora o brigue imundo
O trilho que Colombo abriu nas vagas,
Como um íris no pélago profundo!
Mas é infâmia demais!... Da etérea plaga
Levantai-vos, heróis do Novo Mundo!
Andrada! Arranca esse pendão dos ares!
Colombo, fecha a porta dos teus mares!”
E o grito de dor clama também a Deus, em “Vozes d’África”:
“Deus! Ó Deus! Onde estás que não respondes:
Em que mundo, em qu’estrela tu t’escondes
Embuçado nos céus?
Há dois mil anos te mandei meu grito,
Que embalde, desde então, corre o infinito...
Onde estás, senhor Deus?”
O volume inclui também algumas traduções que Castro Alves fez de poemas de Lamartine, Víctor Hugo, Henri Murger, Guillermo Gama, Alfredo de Musset e Espronceda. No final, três poemas inéditos de Castro Alves, incluindo um desagrava à atriz Eugênia Câmara, que pelo jeito havia sido vaiada.
A leitura deste volume é importante para quem realmente deseja estudar a grande literatura brasileira.
Rio de Janeiro, 2 de agosto de 2019.
GRANDES POETAS: CASTRO ALVES
Miguel Carqueija
Resenha da coletânea “Poesias completas de Castro Alves, 1” (A Cachoeira de Paulo Afonso/Os escravos/Traduções e inéditos). Edições Spiker, Rio de Janeiro-GB (atualmente RJ), sem data. Introdução de Agripino Grieco.
Sendo o exemplar que me chegou às mãos encadernado com capa dura, pode ser que a capa original tenha sido arrancada (infelizmente faziam isso) e portanto não dou certeza se de fato a edição não é datada. É antiga, sua dona escreveu o seu nome — Andréa Gomes Cordeiro e a anotação Niterói, março de 1962.
Castro Alves foi um desses poetas brasileiros dos séculos 19 e 20 que morriam cedo, de tuberculose e outros problemas, sem ter sequer chegado aos 30 anos. Este, por exemplo, morreu aos 24. Era uma consequência natural da vida boêmia, entre outros fatores.
Ele foi um cantor da liberdade, revoltado principalmente com a condição dos escravos, mancha que infecta nossa história imperial. Os versos de Castro Alves sob esse aspecto são inflamados e potentes.
“A Cachoeira de Paulo Afonso” é uma pequena novela em versos, que aborda a condição dos cativos, onde a Justiça não impera; e onde não se consegue punir o próprio crime de estupro.
“Ser escravo — é nascer no alcouce escuro
Dos seios inflamados da verdade...
Filho da perdição no berço impuro
Sem leite para a boca ressequida...”
Poema trágico, onde a cachoeira do título irá desfechar tetricamente a sorte dos amantes, é obra imortal da nossa literatura.
“Os escravos” dá prosseguimento ao indignado libelo do poeta. Castro Alves canta inclusive o ódio, o desejo de vingança, em si funesto e mau; mas como diz o ditado, violência gera violência. Ele não esquece a triste sorte de mulheres e crianças vitimadas pelo preconceito. Aí vem “O navio negreiro” com a dramática descrição da infâmia e o grandioso final:
“Fatalidade atroz que a mente esmaga!
Extingue nesta hora o brigue imundo
O trilho que Colombo abriu nas vagas,
Como um íris no pélago profundo!
Mas é infâmia demais!... Da etérea plaga
Levantai-vos, heróis do Novo Mundo!
Andrada! Arranca esse pendão dos ares!
Colombo, fecha a porta dos teus mares!”
E o grito de dor clama também a Deus, em “Vozes d’África”:
“Deus! Ó Deus! Onde estás que não respondes:
Em que mundo, em qu’estrela tu t’escondes
Embuçado nos céus?
Há dois mil anos te mandei meu grito,
Que embalde, desde então, corre o infinito...
Onde estás, senhor Deus?”
O volume inclui também algumas traduções que Castro Alves fez de poemas de Lamartine, Víctor Hugo, Henri Murger, Guillermo Gama, Alfredo de Musset e Espronceda. No final, três poemas inéditos de Castro Alves, incluindo um desagrava à atriz Eugênia Câmara, que pelo jeito havia sido vaiada.
A leitura deste volume é importante para quem realmente deseja estudar a grande literatura brasileira.
Rio de Janeiro, 2 de agosto de 2019.