Vampira, raposa e samurai
VAMPIRA, RAPOSA E SAMURAI
Miguel Carqueija
Resenha do romance “Kaori e o samurai sem braço”, de Giulia Moon. Giz Editorial, São Paulo-SP, 2012. Capa e “design” de padrões: Natalli Tami.
Escaldado pela leitura de um bom número de romances de ficção científica e literatura fantástica de autores brasileiros, que se revelaram obras medíocres, confesso que não nutria grandes esperanças ao iniciar a leitura. No entanto, achei este romance de terror surpreendentemente leve e interessante, com um clima de aventura que me lembra até o Inuyasha da Rumiko Takahashi. Claro que as diferenças são consideráveis: aqui o grupo é bem menor porém consideravelmente heterogêneo: Kaori, a vampira, ou “kyukesuki” em japonês; Migitê-no-Kitarô, o samurai sem um braço e não obstante, um terrível lutador; e Omitsu, a mulher-raposa ou “kitsume”, eu diria uma youkai como o Shippou do Inuyasha. No caso deste o grupo é formado, além do “hannyou” (mestiço de youkai e ser humano) Inuyasha, de Kagome (garota mística), Shippou (youkai-raposa), Miroku (monge com buraco de vento ou “kazaana”), Sango (humana, exterminadora de youkais) e Kirara, o gato que se transforma em fera voadora.
O trio, apesar das diferenças de temperamento e problemas de relacionamento, se une para caçar o “bakemono” (monstro) Shinkû, misterioso, oculto nas sombras e letal, um assassino dotado de grandes poderes e com o qual o samurai tem sérias contas a ajustar.
Giulia Moon não tornou a obra pesada, intercalando o drama e a aventura com pitadas de humor. É a “kitsune” Omitsu, que cria muitos problemas para Kitarô, quem se encarrega disso. Kitarô por sua vez é o personagem sério, aparentemente implacável mas que revela o seu lado humano, por exemplo, quando, vendo Kaori enfraquecida, permite que ela sugue um pouco do seu sangue, mordendo-lhe o pescoço. A própria Kaori, cujo aspecto é o de uma bela jovem, humaniza-se um pouco ao longo da história, tornando-se menos relaxada com suas roupas e higiene pessoal.
A autora fez bem em utilizar uma linguagem elevada, sem cair no estilo brutalista que infelizmente contaminou alguns dos nossos autores.
O seguinte diálogo mostra um pouco o difícil relacionamento do trio, o que não impede que se completem mutuamente:
“— Pensei ter-lhe dito para não matar humanos, “kyuketsuki.”
— “Kitsune” linguaruda — resmungou Kaori para Omitsu. — O samurai não havia percebido nada até você dar com a língua nos dentes.
— Não me ignore — rosnou Kitarô. — Estou falando com você.
Imperturbável, Kaori respondeu:
— “Kyuketsukis” matam. Faz parte da nossa natureza.
Kitarô tomou outro gole de saquê.
— É fato — disse, limpando a boca com as cosas da mão. — Mas também é verdade que a minha profissão é eliminar “bakemonos” maus. Os que matam gente.
— Os dois estavam roubando. E eu estava com fome — observou Kaori com secura. (...)”
Kaori é na verdade personagem de uma série da autora, ela aparece também em “Kaori: perfume de vampira” e “Kaori: coração de vampira”, obras que não tive ocasião de ler.
Rio de Janeiro, 4 de agosto de 2019.
VAMPIRA, RAPOSA E SAMURAI
Miguel Carqueija
Resenha do romance “Kaori e o samurai sem braço”, de Giulia Moon. Giz Editorial, São Paulo-SP, 2012. Capa e “design” de padrões: Natalli Tami.
Escaldado pela leitura de um bom número de romances de ficção científica e literatura fantástica de autores brasileiros, que se revelaram obras medíocres, confesso que não nutria grandes esperanças ao iniciar a leitura. No entanto, achei este romance de terror surpreendentemente leve e interessante, com um clima de aventura que me lembra até o Inuyasha da Rumiko Takahashi. Claro que as diferenças são consideráveis: aqui o grupo é bem menor porém consideravelmente heterogêneo: Kaori, a vampira, ou “kyukesuki” em japonês; Migitê-no-Kitarô, o samurai sem um braço e não obstante, um terrível lutador; e Omitsu, a mulher-raposa ou “kitsume”, eu diria uma youkai como o Shippou do Inuyasha. No caso deste o grupo é formado, além do “hannyou” (mestiço de youkai e ser humano) Inuyasha, de Kagome (garota mística), Shippou (youkai-raposa), Miroku (monge com buraco de vento ou “kazaana”), Sango (humana, exterminadora de youkais) e Kirara, o gato que se transforma em fera voadora.
O trio, apesar das diferenças de temperamento e problemas de relacionamento, se une para caçar o “bakemono” (monstro) Shinkû, misterioso, oculto nas sombras e letal, um assassino dotado de grandes poderes e com o qual o samurai tem sérias contas a ajustar.
Giulia Moon não tornou a obra pesada, intercalando o drama e a aventura com pitadas de humor. É a “kitsune” Omitsu, que cria muitos problemas para Kitarô, quem se encarrega disso. Kitarô por sua vez é o personagem sério, aparentemente implacável mas que revela o seu lado humano, por exemplo, quando, vendo Kaori enfraquecida, permite que ela sugue um pouco do seu sangue, mordendo-lhe o pescoço. A própria Kaori, cujo aspecto é o de uma bela jovem, humaniza-se um pouco ao longo da história, tornando-se menos relaxada com suas roupas e higiene pessoal.
A autora fez bem em utilizar uma linguagem elevada, sem cair no estilo brutalista que infelizmente contaminou alguns dos nossos autores.
O seguinte diálogo mostra um pouco o difícil relacionamento do trio, o que não impede que se completem mutuamente:
“— Pensei ter-lhe dito para não matar humanos, “kyuketsuki.”
— “Kitsune” linguaruda — resmungou Kaori para Omitsu. — O samurai não havia percebido nada até você dar com a língua nos dentes.
— Não me ignore — rosnou Kitarô. — Estou falando com você.
Imperturbável, Kaori respondeu:
— “Kyuketsukis” matam. Faz parte da nossa natureza.
Kitarô tomou outro gole de saquê.
— É fato — disse, limpando a boca com as cosas da mão. — Mas também é verdade que a minha profissão é eliminar “bakemonos” maus. Os que matam gente.
— Os dois estavam roubando. E eu estava com fome — observou Kaori com secura. (...)”
Kaori é na verdade personagem de uma série da autora, ela aparece também em “Kaori: perfume de vampira” e “Kaori: coração de vampira”, obras que não tive ocasião de ler.
Rio de Janeiro, 4 de agosto de 2019.