Críticas a alguns aforismos de Augusto Cury

A parte com aspas são aquelas selecionadas da obra de Augusto Cury. O "R:" corresponde à minha resposta a suas afirmações.

"Inteligência espiritual é ter consciência de que a vida é uma grande pergunta em busca de uma grande resposta. É procurar o sentido da vida, mesmo sendo um ateu. É procurar por Deus, independente de uma religião, mesmo sentindo-se confuso no novelo da existência. É agradecer a Deus pelo dia, pela noite, pelo sol, por sermos um ser único no universo. É procurar as respostas que a ciência nunca nos deu. É ter esperança na desolação, amparo na tribulação, coragem nas dificuldades. É ser um poeta da vida. Você é um poeta?"""

R: Bobagens. Nesse sentido todos somos poetas. Palavras bonitas, todavia carentes de conteúdo real e histórico. Gramsci, esse terrível vilão da modernidade(para a direita histérica do Brasil e dos EUA), já dizia, em outras bases, que todo homem é filósofo. Aqui, mais uma vez, como bom proselitista de autoajuda do senso comum, faz jogos de palavras num enredo bonito de uma prosa elegante. Repete o estereótipo do ateu que só pensa no imediato, diminui e distorce propositadamente a ciência e parece, segundo ele, que as dificuldades da vida e os grandes mistérios da humanidade só podem ser resolvidos por meio da fé em sua divindade. Quando ele diz "MESMO SENDO UM ATEU", reproduz o estereótipo do ateu materialista vulgar e imediatista, sem preocupações com os desafios do pensamento, que desdenha as questões referentes ao papel do homem na terra e no universo( com alguma rara exceção como ele deixou a entender). O nosso bom escritor usa mal a palavra "MATERIALISTA", SEM EXPLICAR AOS SEUS LEITORES que o materialismo, em suas várias acepções, comporta tanto um assassino em série como um homem caridoso ao modo Betinho(que era marxista). O ateu(materialista)pode ser tanto vulgar quanto sensível e sofisticado( por acaso o Dr. Cury não sabe que a maioria dos pensadores ateus dedicaram a vida a questões existenciais do homem?). Claro que ele sabe. Seu público provavelmente não. Ele o engana.

"""No cerne da alma e no espírito humano há um buraco negro, um vazio existencial, que suga nossa paz diante das dores da vida e da morte. O fim da existência é o fenômeno mais angustiante do homem. Todos os povos desenvolveram um tipo de inteligência espiritual para entendê-lo e superá-lo.""""

R: Concordo Dr. Cury. A religião(no sentido de fé e crenças em divindades) é uma delas. O ateísmo outra, segue: agnosticismo(uma forma de ateísmo disfarçada), a filosofia, etc. A crença em Deus não é a única via, eu diria nem é a melhor. A ciência moderna não nasceu com esse papel, porém vem assumindo questões que ALGUMAS religiões DEFINITIVAMENTE não estão ou não, no momento, capazes de satisfazer por causa de suas certezas, de seus dogmas. Não nego que, EVENTUALMENTE, HAJA CONFLITOS. Mas são passageiros. Hoje muitas igrejas TEÍSTAS ACEITAM A TEORIA EVOLUTIVA, O BIG BANG ETC. Por que? porque as evidências são esmagadoras e irrefutáveis( e estão colocadas à prova todos os dias, sem serem minimamente tocadas). Ser realista com o mundo não equivale a se tornar vazio e descrente, despir-se de utopias e sonhar. Na época em que o conhecimento era menos diversificado e mais compacto, filosofia, religião, matemática dividiam um mesmo palco e mesclavam-se. Muito difícil diferenciar ciência de religião, especialmente entre os antigos. A filosofia grega afastou os mitos, mesmo assim a substância religiosa manteve-se. E mito não é religião, embora esta nasça daquele. A partir do Renascimento e , mais radicalmente, da revolução francesa, a separação tornou-se inevitável. Os regimes ditos comunistas do século XX também colaboraram para essa dicotomia e confronto. Houve uma separação e uma rivalidade passageira. Voltemos ao início(pleonasmo? redundância?). A Inteligência espiritual, no sentido em que a defende em seus livros prolixos e açucarados, porém bem escritos e elegantes(isso ninguém nega), resume-se a observar o mundo de forma contemplativa(Marx queria que o transformemos) no sentido transcendental, metafísico. Bobagem. Esse modo não resolve a questão. Por que? as grandes questões mesmo depois da morte continuarão. No plano espiritual, pós morte, as indagações cessariam? creio que não. A fé não resolve esse dilema existencial, ela a transfere a outro mundo. Talvez inexistente. Observação: Ser prolixo não significa ,necessariamente, escrever mal. É um recurso de ênfase para reforçar ideias, num tentativa didática de envolver o leitor em numa tese(aqui uso a expressão sem seu sentido acadêmico. tese de doutorado. Uso como sinônimo de ideia, hipótese. Uso coloquialmente.). Cury faz isso como poucos. Sabe envolver emotivamente seu público com superficialidades, banalidades e frases ocas bem construídas.

""Einstein disse: quero conhecer os pensamentos de Deus, o resto é detalhe. Ele ambicionava algo maior do que revolucionar a ciência. O homem mais inteligente do século XX queria perscrutar a mente de Deus. Ele buscava o sentido da sua vida. Onde anda você?"""

R: Cury faltou explicar aos leitores que o Deus a que Einstein se refere passa longe do Deus que o público de Cury conhece, adora e a ele ora, reza e presta reverência. O Deus de Einstein era o universo, suas leis, a natureza e os insondáveis mistérios que as cerca. Uma força superior. Ele não acreditava em divindades salvadoras, nem em Buda, tampouco Jesus Cristo. Deus é um termo vago que serve a muitos propósitos. Cury o manipula para defender suas teses(para os leigos). Einstein era ATEU, mas negava o rótulo porque soava à época agressivo demais e tinha um sentido específico entre seu círculo.

""No passado, eu pensava que procurar Deus era uma perda de tempo. Hoje penso completamente diferente. Percebo que há um conflito existencial dentro de cada ser humano, seja ele um religioso ou um ateu cético, que a psiquiatria e a psicologia não podem resolver."""

R: Mentira. A literatura especializada está recheada de casos em que pessoas deprimidas e ansiosas resolveram seus problemas por meios de terapias variadas sem se valer de orações ou crenças. Mesmo vários ateus deixaram o víco sem dar um ALÔ AO CÉU. Márcio Américo, o comediante "pastor Adélio", deixou o vício em crack, um dos mais devastadores, sem apelar a Deus ou qualquer entidade. Ele é ateu. E mesmo no sofrimento nunca recorreu a igrejas. Nem as internações funcionaram. O NA o acolheu e lá encontrou forças. Venceu e hoje goza de prestígio em sua carreira.

"""A psiquiatria trata dos transtornos psíquicos usando antidepressivos e tranquilizantes, e a psicologia, usando técnicas psicoterapêuticas. Mas elas não resolvem o vazio existencial, não dão respostas aos mistérios da vida. Quando a fé se inicia, a ciência se cala. A fé transcende a lógica.""

R: Errado. A fé não transcende a lógica. Ela existe e a aceitamos como parte de nossa percepção de mundo porque de algum modo faz sentido. . A partir dela, o mundo, as pessoas e o destino ganham UM SENTIDO. Ela é embutida em nossa existência desde a mais tênue idade, sendo produto de nossas relações sociais. A fé cega, sem o crivo da lógica, da prova, é credulidade que faz mal. Isso é tão verdade que a Patrística e escolástica, as duas primeiras expressões da filosofia e da apologética, cristã, viu-se na necessidade de recorrer à logica, aos dados do mundo, à ciência, para fundamentar a sua fé. E isso até hoje. Quem lê a apologética cristã atual, sobretudo a protestante, deve se cansar de tantas referências científicas para fundamentar a existência de Deus, a ressurreição de Jesus.. William Lane Craig e Norman Geisler são os dois grandes apologistas do momento. E a ciência não se cala diante da fé cega e absurda. Cury mente e engana seus leitores.

""Quem pode decifrar o que é a vida.Temos milhões de livros científicos, mas a ciência não sabe explicar o que é a vida. Vivemos numa bolha de mistérios. As questões básicas da existência humana não foram resolvidas."""

R: Contraditório da parte de um autor que pretensamente deixou o ateísmo de lado pra encontrar conforto no TEÍSMO. Mas a qui ele diz claramente que as grande questões humanas não foram resolvidas. E joga , implicitamente, com maldosa intenção, essa incompetência à ciência, deixando a religião e as crenças de lado. Um jogo retórico que pretende diminuir a ciência. Ora, se elas ainda não foram resolvidas pela ciência e a religião, por que citar apenas a ciência? até porque a ciência pelo que sei não se propõe a isso. Quem tem respostas prontas e acabadas é a religião, não a ciência, que trata de observar um mundo em constante mudança. E muda seus posicionamentos e paradigmas quando a realidade e a tecnologia a levam para esse caminho. Cury é risível.

""Quem somos? Para onde vamos? Como é possível resgatar a identidade da personalidade depois da morte se trilhões de segredos da memória se esfacelam no caos? O fim é o nada ou o fim é o começo? Nenhum pensador encontrou tais respostas. Quem as procurou na ciência morreu com suas dúvidas."""

R: Diga-nos , Dr. Augusto Cury, estou curioso pela respostas que as religiões tem a oferecer sem a ciência, porque o que vejo são intelectuais religiosos gabando-se de que a ciência embasa isso ou aquilo da bíblia ou de fenômenos sobrenaturais e paranormais. Decida-se. Ou confunde ciência com ateísmo MILITANTE? seja honesto, homem.Mesmo o fim sendo o começo. é o começo de quê? e para quê? responda-me, hó homem, existencialmente RESOLVIDO. rsrs

""A ciência, através do seu orgulho débil, desprezou a eterna e incansável procura do homem pelo sentido da sua vida. Agora estamos entendendo que o desenvolvimento da inteligência espiritual por meio de oração, meditação e busca de respostas existenciais aquieta o pensamento e apazigua as águas da emoção.""

R: A ciência não tem orgulho débil. Ela tem um método, aberto a todos, inclusive ao senhor, que por meio dele promove proselitismo rasteiro e superficial ao dizer que Deus e Ciência são impenetráveis. Há uma verdade aí. E uma mentira também. Mas AUGUSTO CURY É VAGO. Gosta de frasear elegantemente. Deus e Ciência pertencem a campos do saber diferentes que , por razões teóricas e momentâneas cruzam-se , mas logo se separam e percorrem caminhos paralelos. O mais contraditórioé isso ser dito por parte de um autor que desenvolveu, segundo ele, certas "teorias", com forte base científica, falar da ciência desse modo pejorativo soa demagógico, hipócrita e cômico. Com certeza, suas palavras se dirigem a um tipo de público que conhecemos bem: os fundamentalistas ou pessoas intelectualmente ingênuas que acham religião e ciência mutuamente excludentes. Um estereótipo boboca que ficou no século XIX. Cury tenta ressuscitar essa bobagem positivista a qualquer custo . Ora, a ciência nunca desprezou a busca pelo SENTIDO DA VIDA. Essa é uma questão da Filosofia e das religiões, não da ciência. Se houve falha, ou limitações, foram das religiões, não da ciência, que avançou, progrediu em todos os campos. Já as religiões( e a fé em Deus também) estão em decadência, em franco declínio. As religiões estão diluídas em crenças diversas, doutrinas variadas, deuses que se excluem(até mesmo no Cristianismo). A ciência vai bem. E sejamos sinceros: Cury usa o termo "ciência" de maneira muito dúbia. Isso atrapalha o leitor.

"""Embora haja radicalismos e intolerância religiosa que depõem contra a inteligência, procurar por Deus, conhecê-lo e amá-lo é um ato inteligentíssimo. O amor do ser humano pelo Autor da sua vida produz força na fragilidade, consolo nas tempestades, segurança no caos."""

R: É, mas onde está a novidade nisso? Marx, além outros escritores ateus e crédulos, diziam-nos isso, de forma critica, mas não menos realista e com mais profundidade: "A religião é o suspiro da criatura oprimida, o ânimo de um mundo sem coração e a alma de situações sem alma. A religião é o ópio* do povo".

Marx usa ópio não no sentido de uma droga destrutiva, mas como remédio, um anestésico muito usado na época pelas classes abastadas.

OBs: Cury escreve ideias interessantes que se perdem num emaranhado de tolices e embromações.