Personagens em auto-destruição

PERSONAGENS EM AUTO-DESTRUIÇÃO
Miguel Carqueija

Resenha do romance “Madame Bovary”, de Gustave Flaubert. Editora Martins Claret, São Paulo-SP, 2005. Tradução de Araújo Nabuco. Capa de Cláudio Gianfardoni. Coleção “A obra-prima de cada autor”, Série Ouro n° 29.

A este romance, do autor francês Gustave Flaubert, atribui-se a data de 1857. É um típico caso de desconstrução da personagem principal, Ema, a famosa Madame Bovary do título. Ela pode ser posta em comparação com a Anna Karenina do igualmente célebre romance do russo Leon Tolstoi. Ema, que se envenena, Anna, que se joga nas rodas do trem. Há muitos outros personagens assim, como diversos de Aluísio Azevedo (exemplo: João Touro, de “Philomena Borges”, destruído por sua submissão excessiva à esposa).
Carlos Bovary é um jovem médico que vai clinicar numa cidade pequena, Tostes, e a mãe o faz casar com uma viúva, muito mais velha e´, pela rápida descrição, insuportável: “Queixava-se continuamento do peito, dos nervos, de humores. O ruído de passos fazia-lhe mal; se se retiravam, a solidão lhe era odiosa; se voltavam para junto dela, faziam-no com certeza para a ver morrer.”
É até um alívio para os leitores a morte dessa criatura, e então Ema entra em cena, tornando-se a segunda esposa de Carlos. A história vai seguindo, extensa e detalhista, e cheia de personagens, mas afinal a linha principal é esta: Ema torna-se adúltera, cultiva um amante e afunda-se em dívidas que esconde do marido; este, um verdadeiro bocó, não sabe e nem desconfia de nada até a tragédia final.
A auto-destruição de Bovary soa inevitável diante dos detalhes descortinados na trama, facilmente previsível. Quanto ao viúvo, só muito depois da morte de Ema, ao descobrir as cartas de amor, ele se convence da traição.
É um romance bem feito, bem montado, em grande estilo, mas com certeza é muito triste.

Rio de Janeiro, 20 de fevereiro de 2017.