MATTOS E SILVA, Rosa Virgínia. Definindo o período arcaico/Como conhecer o português arcaico. In:___. O português arcaico: fonologia, morfologia e sintaxe. 2 ed. São Paulo: Contexto: 2013, p. 21-48.
Sabe-se que o período arcaico tinha como marca principal a oralidade, pois neste período somente 2% da população era letrada. Faziam parte desses 2% as pessoas ligadas ao mundo religioso dos mosteiros e das dioceses, à Igreja Católica, enfim, e aos segmentos da nobreza.
Além disso, o livro era caro e raro. Excetuando as obras religiosas, que se multiplicavam pela necessidade de disseminação, obras literárias de outro tipo raramente eram copiadas. Só se copiava um determinado livro se um rei ou grande senhor mandasse. A produção de documentação literária era, então, muito restrita.
Outra característica significativa do período arcaico era a falta de indicação de data e local nos textos propriamente ditos literários, somente os documentos notariais eram localizados e datados. E, do texto original, que não continha data, nem local, fazia-se uma cópia que constava data e local de confecção.
No século XV, reconfigura-se a produção textual com a chegada da imprensa, que aumenta a produção de texto e impõe a indicação de data e local no mesmo. Aumenta-se então o acesso aos textos devido à diminuição do custo do papel trazido pela imprensa.
Só é importante destacar que, naquela época, não existia ensino de português nas escolas, às quais poucas pessoas tinham acesso; aprendia-se somente a ler e escrever em latim. Então aquelas pessoas que aprenderam a escrever em latim, escreviam em português com base na fala sem sequer ter aprendido a escrever em língua portuguesa.
Mas como ninguém falava mais latim em Portugal desde o século XII, a não ser com estrangeiros, a partir do século XVI, movido pela necessidade de dominar outros povos, inicia-se o processo de laicização da cultura letrada e o português passa a ser, então, a língua de ensino nas escolas.
Contudo tinham poucos professores em Lisboa, de aproximadamente 30 em 1551-1552 passam a 60 no início do século XVII, com o aumento da população. A partir desse período, o ensino do português é realizado em várias camadas da sociedade; surgem, então, a partir daí as reflexões sobre a língua portuguesa, motivadas pela necessidade de normatização da língua e a expansão colonial.
Surgem também as duas primeiras gramáticas sobre o português, a de Fernão Oliveira em 1536 e a de João de Barros em 1540. Porém há uma diferenciação entre elas, uma possui cunho descritivo (de Fernão Oliveira) e a outra possui cunho prescritivo-normativo (de João de Barros). A partir destas gramáticas foram realizados, em meados do século XVI, os primeiros trabalhos lexicográficos com os dicionários - latim/português e português/latim; surgindo nos fins do século XVIII o primeiro dicionário português/português, edição de Antônio Morais e Silva.
Um fato interessante é que a partir do século XV vai surgindo a figura do autor, a qual não existia nos textos do período arcaico. Isso ocorre devido a definição do espaço territorial e identitário nacional, a começar pela história da vitória de Aljubarrota contra os castelhanos, liderada por D. João I, fundador da dinastia de Avis. Aparecem, então, neste período, as crônicas no âmbito da história de Portugal, sendo a primeira delas a crônica escrita por Fernão Lopes entre 1418 e 1454.
Outro fato importante foi o surgimento do primeiro cânone literário, o "Diálogo em defesa de nossa linguagem" de Pero de Magalhães Gandavo, escrito na segunda metade do século XV. Isto constitui, sem dúvida, o início da normativização do campo literário.
Concluindo, pode-se dizer que as características que marcam a documentação quinhentista foi: a ampliação do universo documental; a identificação de autor, data e local nos textos; e por fim, o afastamento da "voz" linguística na escrita.