IRACEMA - JOSÉ DE ALENCAR
Iracema foi escrito e publicado em 1865 e trazia o subtítulo de Lenda do Ceará. Seu autor, José de Alencar, era cearense de origem. Ele confessava, em carta, que havia se inspirado em uma lenda que ouvira quando criança sobre como surgira o “primeiro cearense” para criar sua obra.
O Brasil vivia então o auge da euforia nacionalista que se iniciara com a independência em 1922 e tomara corpo com a implantação da estética romântica, oficialmente, a partir de 1936. Os escritores românticos, tanto da prosa quanto da poesia, assimilaram os ideais nacionalistas do romantismo europeu e os adaptaram as condições peculiares de nossa realidade.
Surge então a chamada “cor local”, particularidade específica do romantismo brasileiro que consiste em valorizar a nossa natureza tropical, a nossa linguagem impregnada de influências de dialetos africanos e expressões indígenas e a idealização do índio, que era elevado a condição de herói, nos moldes dos cavaleiros medievais europeus.
Iracema destaca-se como a principal produção deste período na busca de uma identidade nacional nos moldes da “cor Local” do nosso nacionalismo romântico.
Resumo do enredo de Iracema
Iracema narra a história de um amor improvável entre uma índia e um colonizador português, no início do processo de colonização efetiva da costa brasileiro, no século XVII. Desse amor nasceria o primeiro mestiço, símbolo de uma nova raça que seria o povo brasileiro.
Iracema é uma índia da nação Tabajara. Ela é filha do pajé da tribo (Araquém) e está prometida como esposa ao chefe guerreiro (Irapuã). A moça também é detentora do segredo da Jurema. Ela produz uma bebida alucinógena que é dada aos guerreiros em rituais específicos. Este segredo está condicionado à sua virgindade. Ela não pode se entregar a nenhum homem antes de passar a outra virgem o segredo de fabricação dessa bebida.
Martim é um guerreiro português que vive entre a tribo Pitiguara e tem a missão de fiscalizar a costa cearense contra as invasões estrangeiras. Junto com seu fiel amigo, Poti, lidera os guerreiros pitiguaras nas batalhas contra invasores, principalmente holandeses. Os pitiguaras, que vivem na costa cearense, são inimigos naturais dos tabajaras, que vivem mais para o interior.
Um dia, Martim se perde na mata e acaba encontrando Iracema, que estava caçando. Como os brancos são inimigos de seu povo, Iracema atira uma flecha, ferindo Martim no ombro. Martim não reage à agressão por ser uma mulher. Ela então leva o português ferido para sua cabana onde, protegido pela lei da hospitalidade, ele é cuidado pelo pajé.
Nasce então uma forte atração entre eles. O guerreiro branco, no entanto, tem consciência da
Capa da obra Iracema de José de Alencar
impossibilidade de sua união com uma índia de uma tribo inimiga. Pede assim a bebida alucinógena à Iracema, para dormir e não ceder à tentação. Sob efeito da bebida ele tem um sonho onde chama a moça para se deitar com ele na rede. Ela obedece e os dois acabam tendo relações. Nas palavras de Alencar “Tupã já não tinha mais sua virgem nos campos dos tabajaras”
Ameaçados pelos guerreiros tabajaras liderados por Irapuã, que quer “beber o sangue do guerreiro branco”, Iracema foge com Martim para encontrar Poti e os guerreiros pitiguaras. Após uma violenta batalha entre as duas tribos, ela confessa a Martim que não é mais virgem e que se voltar para sua tribo será morta. Ela também não pode viver entre os pitiguaras, seus inimigos.
Martim decide então construir uma cabana na praia cearense onde passa a viver com Iracema. Pouco tempo depois, ela engravida e esse filho é mais uma amarra para Martim, que sonha com sua terra natal mas não tem coragem de abandonar a mulher e o filho, da mesma forma que não pode leva-los para a Europa.
Começa então o martírio de Iracema. Longe da família e dos amigos, ela passa muito tempo sozinha, enquanto Martim faz suas expedições fiscalizando toda a costa. Quando ele está com ela, uma nuvem de tristeza cobre seu rosto enquanto seus olhos buscam Portugal na linha do horizonte. Iracema sente-se culpada pela tristeza do amado e conclui que a sua morte é a única forma de libertá-lo. Começa então a definhar de tristeza e solidão. Quando o filho nasce, ela o chama de Moacir, que significa “filho da dor”, e morre.
Martim enterra Iracema na sombra de uma palmeira, pega o filho, primeiro representante de uma nova raça, e parte para Portugal. Alguns anos mais tarde ele volta liderando um grupo de colonos. No lugar onde ele vivera o seu amor com a moça, ele funda a primeira cidade do Ceará.
O foco narrativo
Iracema é narrado em terceira pessoa, ou seja, possui um narrador externo onisciente. A narrativa não é linear. O primeiro capítulo mostra a conclusão da história, com o Martim partindo da costa cearense levando consigo o filho que tivera. A história de amor da índia com o português será contada, em progressão cronológica, a partir do segundo capítulo. Para uma melhor compreensão, vale reler o primeiro capítulo após terminar a leitura do livro.
A técnica narrativa mais importante dessa obra é o uso intenso do que a crítica chama de prosa poética. Embora a narrativa esteja estruturada em forma de prosa, ela possui ritmo, musicalidade e linguagem próprias da poesia. Dessa forma, o livro une a beleza estética e sonora da poesia com os elementos típicos da narrativa, como enredo e personagens.
Metáforas em Iracema
Outro aspecto importante desta obra é a simbologia embutida em sua narrativa. Iracema é uma obra alegórica. A história de amor simboliza o surgimento do povo brasileiro. A índia representa a América virgem (seu nome é um anagrama da palavra américa); Martim representa a Europa colonizadora. Da união do índio nativo americano com o colonizador branco europeu nasce o povo brasileiro, representado pelo filho Moacir.
Análise da obra de José de Alencar
José de Alencar foi o primeiro grande escritor brasileiro. Escreveu diversos romances e algumas peças de teatro. Além de escritor, teve larga atuação como deputado no parlamento da época. Tanto na política quanto na literatura, sua obra ficou marcada por um nacionalismo intenso e pragmático.
Junto com outros românticos, Alencar empenhou-se muito para despertar um sentimento patriótico nos brasileiros, sempre destacando, por vezes de forma ingênua, as virtudes nacionais, principalmente nossas riquezas naturais.
Nesse sentido, Iracema é sua obra máxima. Uma narrativa que mistura aventuras épicas com lirismo poético na criação do mito heroico do nascimento do povo brasileiro
Escola Literária
Essa obra de Alencar pertence ao romantismo brasileiro, que foi a primeira escola literária do Brasil após sua independência. Por isso mesmo, das características românticas, o nacionalismo é a que foi mais explorada pelos autores brasileiros.