Sobre o Decreto da Justificação, do Concílio de Trento

O Decreto sobre a Justificação foi emanado pelo papa Paulo III em 1547, como doutrina definida pela Igreja no Concílio de Trento. Organiza-se em 16 capítulos mais 33 cânones anatemáticos.

A ideia de Justificação encontra a sua base fundamental na Sagrada Escritura, sobremaneira nas epístolas do Apóstolo Paulo (Cf: Rm 1; Fl 3; Gl 5, 1; I e IICor); é apresentada como fruto objetivo da ação gratuita e redentora do Pai, através das missões divinas do Filho e do Espírito Santo.

Segundo a síntese de Stancati (2003, p.424): “a Justificação é a transformação global, operada por Deus, que transporta a pessoa do estado de pecado-inimizade com Ele para o de santidade e de filiação adotiva divina, apta à destinação sobrenatural”. Este conceito se inscreve na linha anselmiana da Soteriologia histórica, considerando a Justificação a partir do pecado.

Conforme o Decreto sobre a Justificação (Dz 1520-1583), deve-se partir do reconhecimento do pecado original e seus efeitos sobre a natureza humana, no contexto da importância da Natureza e da Lei para Justificar o ser humano, passando a consideração da História da Salvação e do mistério da vinda de Cristo (Encarnação), que morreu por todos (Cf: 2 Cor 5, 15); porém só àqueles aos quais são comunicados os méritos da Sua Paixão, receberam os benefícios da Sua Páscoa. Assim, o pecador é justificado, entrando no estado de Graça, ao aceitar pela fé a pregação da Igreja e ao receber dela, o Sacramento do Batismo, senão – na impossibilidade- apenas o Batismo de desejo.

Para tanto, os adultos têm a necessidade de se prepararem para a Justificação que deriva da “Graça preveniente de Deus; no chamado de Cristo, sem mérito algum por parte do ser humano; consentindo e cooperando com a Graça, através da iluminação do Espírito Santo”; acolhendo a Fé, que deriva da escuta da Pregação eclesial, dando seu assentimento; recebendo o Batismo, iniciando uma Vida Nova; e observando os mandamentos de Deus.

Através da voluntária recepção da graça e dos dons, santificando e renovando o homem interior, acontece a Justificação do pecador, derivada de cinco causas (Dz 1529): Final: A glória de Deus e a Vida eterna; Eficiente: Deus em Sua Misericórdia e graça, purifica-nos e santifica-nos, assinalando-nos e ungindo-nos; Meritória: o Verbo encarnado, através de Sua paixão sobre a Cruz, satisfez a Deus Pai; Instrumental: o Sacramento da fé, que é o Batismo, sem o qual ninguém é salvo e; Formal: A justiça de Deus, aquela pela qual Ele nos torna justos: na qual, perdoados, somos renovados “no espírito da nossa mente”

Ao ser justificado, o ser humano recebe junto com o Perdão dos Pecados - ao ser enxertado em Jesus Cristo e através Dele - as Virtudes Teologais. A Esperança e a Caridade seguem a Fé, na Graça de Deus; pois “ a fé é o princípio da salvação humana” (Dz 1532) e, “a fé sem obras é morta” (Dz1531).

Por tudo isso, não se deve presumir a própria salvação e, deve-se reconhecer o aumento da Justificação recebida, através do progresso nas virtudes, mediante a graça de Cristo e a cooperação da fé para as boas obras; derivando disso, a necessidade e a possibilidade da observância dos Mandamentos, dado que é próprio do justo um espírito contrito e penitente devido a ele cair ao menos em pecados leves e cotidianos. Nisto o homem justificado deve se precaver contra a temerária presunção da predestinação, implorando de Deus o dom da perseverança final e recorrendo sempre ao Sacramento da Penitência, dado pela Igreja, pelos méritos de Cristo; pois a graça se perde com qualquer pecado mortal, não obstante permaneça a fé.

O Capítulo 16, desse Decreto, trata dos frutos da justificação ou méritos das boas obras e da razão destes méritos: Cristo, cabeça da Igreja, transmite sua força aos seus membros justificados; Assim, a Justiça de Deus é designada também “Nossa”, dado que está inerente a nós e nos justifica. Por isso só é conveniente, e é dever, gloriar-se no Senhor, ainda mais pelo motivo que toda a vida humana deve ser examinada e julgada conforme o juízo divino

A Justificação, conforme Stancati (2003, p. 424), não é só a remissão dos pecados, mas também o dom de um novo princípio vital de existência no Espírito Santo, a vida de filhos de Deus, predestinada à Vida Eterna.

Referencias

PAULO III. Papa. Decreto sobre a Justificação (1547). In: DENZINGER, Heinrich; HÜNERMANN, Petrus. Compêndio dos Símbolos, definições e declarações de fé e moral. São Paulo: Paulinas; Loyola, 2007, pp. 400-415. NN: 1520-1583.

STANCATI, T. Verbete “Justificação”. In: LEXICON: diccionario teológico enciclopédico. São Paulo: Loyola, 2003. pp. 424-425.