RESENHA "LOLITA", VLADIMIR NABOKOV
A obra literária “Lolita” data de 1953 e foi escrita pelo romancista russo-americano Vladimir Nabokov. A edição aqui resenhada é de 2003, pertence à coleção da Folha de S. Paulo (Biblioteca Folha) e foi traduzida por Jorio Dauster. Contém 319 páginas.
O enredo do livro é o estranhíssimo relacionamento entre o professor francês Humbert Humbert e Dolores Haze, uma estudante norte-americana. Após livrar-se de um enfadonho casamento, Humbert deixa a Europa rumo aos EUA, onde apaixona-se flagrantemente por Dolores, a própria Lolita. Até esse ponto, nada a se destacar. Entretanto, a excentricidade da situação logo se revela: Humbert Humbert é um homem de meia-idade, ao passo que Lolita é uma garota de apenas 12 anos.
De per si, o pedofílico cenário já é suficiente para causar repugnância à, provavelmente, maioria dos leitores. Pois “Lolita”, um dos maiores clássicos da literatura internacional, para assim merecer tal título, precisaria ir além. A espetacular narrativa de Vladimir Nabokov acentua a antipatia por Humbert, uma vez que o personagem é egocêntrico, hedonista e sarcástico. E pervertido, obviamente. Nabokov criou um personagem para amarmos odiar. Nos dizeres do filósofo John Ray Jr., o prefaciador original: “Trata-se, sem dúvida, de uma pessoa horrível e abjeta, notável exemplo de lepra moral (...) É cansativo em suas idiossincrasias”.
Em “Lolita”, a pedofilia não é abordada sob nenhum ponto de vista patológico – e nem deveria, considerando-se a mensagem lançada por Nabokov. Aparentemente, H.H. personifica o Lobo Mau, um símbolo devorador, corrompedor. Se o ato sexual, por sua anatomia, puder ser comparado a um ávido consumo da fêmea pelo macho, pode-se pensar em um diálogo entre “Lolita” e a fábula de Chapeuzinho Vermelho. Mesmo a acentuada diferença etária não é por acaso: H.H. rouba de Dolores/Lolita a inocência da infância, colocando-a precocemente no meio adulto, caminho que jamais terá volta. Tal qual o corrupto Lobo Mau, interventor do caminho da frágil menina de vestes rubras.
Esplêndido, ainda que asqueroso. Assim é “Lolita”. Nabokov soube construir toda a atmosfera propícia a um romance covarde, por meio de uma linguagem cadenciada, adjetivada, dramática. À época de seu lançamento, muitos críticos o receberam como pornografia. Seja ou não o leitor uma pessoa impressionável, impossível ser indiferente à “Lolita”.