Um livro para idiotas
O conteúdo a que o título do tal livro se refere não foi composto como uma simples provocação da mídia a serviço da produção e comercialização literária; porque o que ele contém é mesmo o que anuncia seu título: “O mínimo que você precisa saber para não ser um idiota”, do detestado filósofo brasileiro Olavo de Carvalho.
Claro que, para horror do intelectual narcisista de plantão – mormente os que se dizem de esquerda ou de direita – o que descobre ao lê-lo é que o idiota é ele próprio. Desculpe: descobre que os idiotas somos todos nós. Assim como o autor, que parece ter tido um surto de supraconsciência depois de uma vida dedicada a descobrir certas verdades fundamentais da construção histórica de um pretendido “espírito humano” sob o abismo interestelar, que nos sustenta subservientes à força moralmente ignorante dos instintos a, aqui e ali, deixar escapar toda sua aparente indomável desumanidade. E então ele debulha sua idiotice diante dele mesmo na esperançosa perspectiva de superá-la, o que, mesmo sendo um dos pensadores brasileiros mais excludentes e excluídos do país, parece conseguir.
Depois, com os frutos de seu sacrifício, Olavo de Carvalho nos debulha uns tantos das verdades históricas (ou supra-históricas) que descobriu fundamentos de nosso cotidiano teatro do absurdo e seus horríveis espetáculos de manipulações e destruições que, entre outros monstros da história e da ficção, fariam talvez até mesmo o fictício Conde Drácula por pra fora suas lágrimas de areia.
Sim, porque, mesmo não sendo vampiros chorões, “lágrimas de sangue” brotam ainda dos olhos daquele que, como Jesus Cristo, e ainda muitíssimo menos que ele, enxerga o mundo talvez como nunca ninguém devesse enxergar. Porque não e fácil, sendo mesmo às vezes muito doloroso, livrar-se da ignorância que fundamenta nossa idiotice, ou aquilo em que você baseia seus movimentos “revolucionários” (ou os de sua “tribo”) a pensar serem nada menos que expressões da “verdade absoluta”, mas que não passam da emissão inconsciente (e, pior, às vezes consciente) das idiossincrasias apreendidas pelo grupo familiar e social onde você, ao mesmo tempo, foi forçado pela Vida a viver e “escolheu” viver – bastando citar um dos inúmeros trechos do referido livro a que o leitor não perca tempo a procurar encontrar argumentos para contestações sem substância autocrítica, racional, sobre sua condição de idiota usando frases feitas da “sabedoria” popular que, malgrado a dose de expressões de certa sabedoria que possam conter (ainda que não aquelas obtidas pelo estudo de culturas superiores), quando repetidas de forma um tanto autômata pela maioria, dão ares de sábios a quem nunca sofreu as dores do parto de uma ideia própria sequer – ou, melhor dito, de algo, alguma sensação ou visão de mundo, uma “teoria” que não esteja fundamentada entre compulsórias convenções da normalidade burocratizada. E isso pela simples impossibilidade de tê-la, impossibilidade a que muito do acomodamento a tal confortável normalidade o condenou – seja o fulano um analfabeto Zé Ninguém ou estando de porte de um diploma de Doutor, de paletó, gravata, com muito dinheiro no banco e prestígio político a aparentar ser alguém no meio do que é apenas massa de manobra a continuidade do desenvolvimento do império de um novo grande inconsciente coletivo, instrumento máximo da instauração de todo mal travestido daquele supremo milenar pretendido Bem; tudo ao engano dos que nunca O descobriram ou elegerão por experiência, reconhecimento e determinação própria.