Comentário literário do livro "Numa cama sem limites" por Onilda Nunes de Oliveira
Numa cama sem limites” - Paulino Vergetti Neto
Erotismo e qualidade literária nem sempre andam juntas, porém esta obra fascina por unir esses dois atributos: romance de altíssima tensão erótica e de plena qualidade artística. Além disso, o autor consegue justapor a sua narrativa, vários outros tipos de cunho fictício, sem, contudo perder o enfoque e a propriedade da linguagem erótica, que retrata desejos e coloca o leitor em prol de sua imaginação. O que faz a literatura erótica revelar-se como sedução inescapável ao desviar o sexo do mero ato sexual, agregando a este a imaginação como elemento principal.
Ademais, o erotismo que vemos aqui é ora romântico, refinado, implícito, afetuoso, ora lascivo, mordaz, explícito e até bizarro, o que reflete bem a fala dos personagens. Dessa maneira, inova o autor, trazendo para esta obra uma estrutura inédita, com novas técnicas acessórias e rica composição literária, permitindo, de tal modo, que o leitor adentre, também, pelos vários vieses das ciências empíricas, formais, naturais e sociais.
Nesse contexto, o livro ainda possui uma história que nos provoca, instiga e aguça. Liberta-nos, igualmente, de algumas controvérsias e conservadorismo do acervo literário atual. Logo, podemos considerar esta escrita uma arte que não se confunde com as demais. Do mesmo modo, não se intimida diante das circunstâncias, simplesmente, atrever-se e desnudar-se. Consequentemente, somos conduzidos a aprender a lê-la e a (con)viver com este tipo de literatura, em tempos que a presença do erotismo na literatura ainda se disfarça, e deixa de ser, muitas vezes, um disparador de fantasias, de imaginações e de descobertas bem menos hipócritas.
Por outro lado, destacamos como o cerne deste romance, a pessoa humana, na sua realidade intimista, chamando atenção para impulsos e sentimentos latentes, degraus e esperanças fortuitas, realizações e frustrações existenciais, desejos humanos reprimidos e se reprimindo, o que terminam por deflagrar uma série de comportamentos subsequentes, tanto no sentido da individualidade psicológica, quanto no tocante aos grupos sociais.
Com isso, podemos, portanto, considerar “Numa cama sem limites”, mais uma obra de arte, que como tal, resulta da sublimação do autor sobre impressões da realidade sensível. Ora explicitamente revelada por descrições; ora resultado de elaboradas construções imaginativas, frutificando-nos imprevisibilidades, dúvida, insegurança, angústia, na mesma proporção, que faz aflorar o Eros, com toda a sua satisfação e desejo, diante dos fatos e ficções que nos são repassados.
Outro aspecto a destacar, é com relação à maturada racionalização empregada sobre os acontecimentos e os personagens criados. Nessa linha de raciocínio, alguns trechos podem apresentar certos exageros para uns; ou simples idiossincrasias para outros, ainda assim, devemos encará-los como a servirem de instrumentos que nos remetem a representações máximas do que denomino “autenticidade inteligível” de nós mesmos, de nosso próprio “ser”, do nosso consciente e inconsciente, individual e coletivo.
Não é à toa, pois, que às vezes, certos atributos da obra se pareçam tão avizinhados ou familiares. Quiçá, deva-se ao fato de que o filtro do autor seja quase imperceptível, transparente; findando, destarte, para que a revelação do “ser”, verse somente sobre o nosso próprio filtro, a nossa própria interpretação ou ao nosso próprio juízo ético de valor. Este, por sua vez, é quem define quais atos, sentimentos, intenções e comportamentos são condenáveis ou não, sob o ponto de vista moral. Além disso, depreende-se do contexto, que somos todos iguais, quando desnudados pelo cotidiano da vida ou da literatura.
Ainda, insta mencionar que, só um profissional com o gabarito do escritor e poeta, Paulino Vergetti Neto, seria capaz de nos servir de tão bons ingredientes. Ingredientes estes, que muito contribuíram para o desenvolvimento qualitativo do presente romance, justificando, entre outras coisas, a precisão da linguagem utilizada, a complexidade e o aprofundamento das tramas e dos perfis psicossociais (psicologia individual e social), tão bem trabalhados.
Indubitavelmente, essa é uma obra literária que seduz. Contudo, a mim, seduz muito mais, pela ousadia do enredo e pela entrega do autor; principalmente, quando ele se coloca nela por inteiro, ao criar o texto, o tecido, a tessitura, que pressupõe os vários fios - sociológicos, ideológicos, filosóficos e estruturais que constituem esse romance. Decerto, podemos assegurar que o surgimento desse livro cessa o previsível, cria novos paradigmas e resgata o “caráter mágico” da arte literária. Por tudo isso, desejo que todos percorram pelas páginas desta obra captem, assim como eu, a essência pura e singular que o escritor transpôs, quando embriagado de inspirações desafiou o seu próprio talento.
Onilda Nunes de Oliveira