O DESASTRONAUTA, de Flávio Moreira da Costa
"Fez uma promessa para parar de beber: foi a pé até uma outra cidade, quando chegou lá tomou o maior porre de sua vida".
Um livro onde o que menos importa é a história, até porque não há nenhuma. A melhor classificação seria metalivro, pois é uma crítica ao próprio livro como instrumento universal de informação. Além de não haver história, o livro segue uma seqüência de contos que sozinhos não significariam muito, mas no conjunto complementam-se. E mais, não é necessária nenhuma ordem na leitura, o próprio autor autoriza isso.
O livro divide-se basicamente em três partes, a "primeira parte ou o livro propriamente dito", a "segunda parte ou anexo" e o apêndice.
Caso você tenha interesse em ler O Desastronauta, comece pelo apêndice, onde aparecem algumas críticas feitas à publicação original. A partir dessas críticas o livro fica mais digerível pelo leitor comum, pois mostram aspectos metalingüísticos usados e abusados pelo autor. É a melhor introdução preparatória para o que virá a seguir.
Na primeira parte, você embarca em uma leitura vertiginosa. Se algum dia as palavras deixarem nos leitores o efeito entorpecente, pode ter certeza de que tudo começou aqui, neste livro. As sensações que o livro transmite tramitam do riso à confusão. Aqui você percebe a criatividade enorme que o autor nos passa.
O personagem principal se apresenta logo no início de maneira fantástica: "Meu nome é Cláudio Crasso... construo minha geografia... escrevo minha história... Nasci imperador do mundo, não me contento em ser síndico do meu edifício... Escrevo um Tratado definitivo de metafísica - mas das minhas obras sou eu mesmo a mais criativa, porque a mais imperfeita". E Cláudio é isso mesmo, um personagem que vai se construindo a cada página, a cada conto, carta, trecho de diário, poesia ou citação de outros escritores. Ele vive em meio à poesia, música, literatura, mulheres, faculdade, sentimentos de nostalgia e de fuga.
A segunda parte eu pulei depois de tentar ler duas páginas. Fiquei literalmente tonto só de tentar. Tenho de admitir que o autor é criativo na maneira de se expressar, mas também admito que não consigo gostar do concretismo. Realmente não é a minha praia. Apesar disso, há muitas tiradas legais para ser utilizadas e pensadas no cotidiano. Não que o livro seja ruim, mas ou ele está muito além da minha capacidade ou foi escrito para poucos. Metalivros às vezes são assim: um grito parado no tempo e espaço, e de vez em quando passa alguém perto e o escuta.
Flávio Moreira da Costa é escritor e (muito bom) organizador de antologias. Dele eu já li o 13 dos Melhores Contos de Vampiros (Ediouro). Ele ganhou o Prêmio Jabuti em 1997 com O Equilibrista do Arame Farpado.