A ARTE DE ESCREVER, de Arthur Schopenhauer
Ler cansa. Cansa porque envolve esforço, tempo, concentração. Hoje, com todas as facilidades da vida moderna, muitos lêem somente quando são obrigados: na escola, para o vestibular, na faculdade, ou para se manter atualizado profissionalmente. Poucos são os que lêem por prazer. Menos ainda aqueles que escrevem por prazer. A maioria dos escritores "vivem da literatura e não para a literatura", segundo Schopenhauer. Raras vezes ambas atividades são exercidas pelo mesmo homem. Enquanto muitos gastam suas energias e recursos em festas, divertimentos, busca de prazeres fulgazes, A arte de escrever mostra como gastar e obter um retorno à altura, com a literatura.
De espírito eternamente provocador, Arthur Schopenhauer foi um filósofo que influenciou grandes nomes da atualidade, como Machado de Assis, Nietzsche, Freud, Wagner, Tolstói, Sartre e Thomas Mann, entre outros. Ainda hoje é considerado um dos principais pensadores de toda a história alemã. A arte de escrever é uma coletânea de cinco entre vários ensaios que Schopenhauer escreveu no livro Parerga e Paralipomena (Acessórios e Remanescentes). Os cinco em questão falam sobre a literatura: escrita, estilo, leitura, crítica e pensamento literário. Segue um breve resumo de cada um:
1. Sobre a erudição e os eruditos (Über Gelehrsamkeit und Gelehrte). O autor critica duramente os falsos eruditos, dizendo que quem lê muito pensa pouco. Ele classifica como escritores distintos aqueles que vivem DA literatura dos que vivem PARA ela. Outro ponto importante é quando ele diz que "a maior parte de todo o saber humano, em cada um dos seus gêneros, existe apenas no papel, nos livros, nessa memória de papel da humanidade. Apenas uma pequena parte está realmente viva, a cada momento dado, em algumas cabeças" (pg. 29). As revistas literárias ao invés de separarem o joio do trigo, divulgam opiniões pagas e indicam livros ruins para os leitores.
2. Pensar por si mesmo (Selfstdenken). A organização dos pensamentos é fundamental. Pensar com profundidade é possível somente sobre um assunto conhecido, e vice-versa. "Uma pessoa somente deve ler quando a fonte de seus pensamentos próprios seca" (pg. 42). Tanto a leitura excessiva quanto a experiência não substituem o pensamento próprio. Pensar requer mais esforço. O pensador deve ruminar as suas próprias idéias e chegar à conclusões por si só, desenvolvendo sozinho o seu raciocínio.
3. Sobre a escrita e o estilo (Über Schriftstellerei und Stil). Há escritores - e livros - bons e ruins. O escritor é ruim quando escreve por dinheiro. Os livros mais recentes não são os melhores e "o público é tão simplório que prefere ler o novo a ler o que é bom" (pg. 70). Como a maioria dos livros é ruim, devemos desmerecer os ruins para valorizar os bons. O autor critica os escritores e críticos anônimos, comparando-os a assaltantes mascarados. O estilo revela muito sobre quem escreveu a obra. Se o autor usa mais palavras do que realmente precisa, ou é confuso e obscuro, não passa de uma tentativa de parecer que sabe mais do que realmente sabe. Schopenhauer enumera a partir daí vários vícios que desmascaram a escrita ruim.
Não gostei da frase na contracapa que diz "TEXTO INTEGRAL", sendo que no prefácio o tradutor Pedro Süssekind diz que "Esse trecho foi traduzido integralmente, com exceção de uma passagem do item mais longo de Sobre a escrita e o estilo" e que "optou-se por uma versão reduzida do texto Sobre a escrita e o estilo" (pgs. 14-15). São louváveis os motivos do tradutor e da editora neste aspecto, mas a frase na contracapa deve ser retirada para que essa não engane a ninguém. A lei é contra a prática de divulgar uma coisa e vender outra. Por isto, tomem cuidado com o Código do Consumidor, senhores, ele pode e será usado contra vocês pelo leitor que se sertir enganado.
4. Sobre a leitura e os livros (Über Lesen und Bücher). "Quando lemos, outra pessoa pensa por nós: apenas repetimos seu processo mental" (pg. 127). A maioria dos livros é escrita somente para vender e, por isso, é importante assim como escolher o que ler, escolher o que NÃO ler, pois a vida é curta e tempo e energia são limitados. Biografias não devem ser lidas em substituição as obras originais. Pouco mais de uma dúzia de obras a cada século permanecerão para a eternidade. "O reconhecimento pela posteridade costuma ser pago com a perda de aplauso por parte dos contemporâneos, e vice-versa" (pg. 138).
5. Sobre a linguagem e as palavras (Über Sprache und Worte). Este ensaio é mais técnico e declara que as interjeções foram as primeiras palavras a existirem. Citando Voltaire, o adjetivo é inimigo do substantivo. Todo idioma atinge um ápice em que não se aperfeiçõa mais, somente piora e fica mais simples. Quem aprende mais de uma lingua aprende não só palavras novas, mas conceitos novos. Expande a sua maneira de pensar. Por isso que as traduções são imperfeitas, pois há palavras em uma língua com um conceito impossível de traduzir para outra língua. Schopenhauer estimula o estudo de línguas puras, como grego, latim e alemão.
Depois de mencionar algumas passagens e pensamentos acima, concluo dizendo que o livro merece ser lido e relido. O autor provoca. Distribui muitas alfinetadas, e eu mesmo senti algumas em meu corpo. Mas ele defende bem os seus argumentos e provoca a reflexão no leitor. É um livro escrito para escritores, para leitores e para pensadores.
Diferente de O Caminho das Pedras, de Ryoki Inoue, que nos ensina como escrever best-sellers (livros escritos objetivamente para vender e ganhar dinheiro), A arte de escrever mostra como escrever um livro para a humanidade, que demonstre todo o potencial do escritor e faça as gerações posteriores evoluírem usando o livro como ponto de partida.
Retirado de www.jefferson.blog.br