O Coração de Paulo Honório

A obra de Graciliano Ramos se passa na fazenda de São Bernardo, lugar que impulsiona as ambições de seu Honório, que desde cedo aprende a lidar com dinheiro, percebendo a importância da sua movimentação no mundo, e cultivar a irresponsabilidade social de alguém que pretende se jogar no capitalismo visando unica e cegamente o lucro próprio.

A fazenda de São Bernardo pertencia ao seu Padilha, cujo desejo de seus derradeiros anos se depositava na manutenção das suas terras pelo filho Luiz Padilha, um libertino que via nos prazeres da vida uma prática diária. Tendo morrido o seu pai, ele gastou desenfreadamente seu patrimônio, até reduzi-lo à somente a propriedade que seu pai tanto prezava. A partir de então, Paulo Honório, que visava possuí-la, pechinchou com o atual dono do lugar e, adotando uma entonação intimidadora, conseguiu dar o primeiro passo para a realização de uma carreira que tinha raízes na crueldade, como o assassinato de Mendonça (dono das terras vizinhas que ameaçaria roubar parcialmente os espaços de São Bernardo) além da participação no processo de deteriorização de Luiz Padilha, e na obstinação sem precedentes.

Paulo Honório comprou a propriedade por uma mixaria e passou a desenvolver suas potencialidades agrícolas. Dentro de poucos anos, o lugar recebia a fama por ser considerado um dos mais polidos e aprazíveis de se morar. O novo dono não sentia falta de familiares, uma vez que nunca os teve, mas mandou buscar uma velha senhora que havia cuidado dele, Margarida, e respeitava a fidelidade de seu capataz Casimiro Lopes, sempre preparado para os serviços sujos.

Assim, focado perpetuamente na busca não mais pela riqueza, mas pelo mantimento dela, Paulo Honório decide casar para deixar um herdeiro que cuidasse da sua fazenda com a mesma devoção com que ele fazia. A escolha se dá pela esposa. Ela deve corresponder às características de um homem austero e preocupado com o poder. Porém, sendo pouco leitor do caráter dos outros, Honório escolhe uma mulher letrada que é professora, chamada Madalena. A partir deste ponto, Graciliano Ramos confronta magistralmente dois sistemas políticos polêmicos até então: o capitalismo, simbolizado pelo pessoa de Paulo Honório, e o socialismo, disfarçado na leveza da sua esposa, que não escondia as inclinações ao teor comunista.

Ao mesmo tempo, notamos uma ambivalência por parte de ambos em relação ao sentimento. Enquanto Madalena espalha a esperança, o amor e a liberdade, Honório será a rudeza que tentará reprimir estas qualidades na medida em que se descobre um homem de natureza incapaz de se aproximar do romantismo. Chora por não se entender, embora saiba que tenha ciúmes dela com qualquer indivíduo, e apresenta uma das maiores confusões psicológicas em que se torna evidente a conseqüência de uma vida apartada de um temperamento condescendente.

Marcada por uma tensão crescente, a relação de ambos, vivida constantemente sob discussões de preocupações pequenas, piora à medida que o tempo passa. Entretanto, o objetivo insipiente de Honório se concretiza no nascimento de uma criança, um menino que raramente aparece no livro. Apesar de amá-lo, Madalena se choca com as reações explosivas de seu marido e, sem suportar mais conviver com o ele e suas reprimendas injustificadas ao pensamento socialista, suicida-se, deixando-lhe uma carta, que fará o personagem principal refletir sobre sua existência e a razão dela, numa eterna saudade de sua amada.

As últimas páginas do livro refletirão não apenas no personagem a procura infindável pelo sentido da vida, mas também no leitor. Tocam no âmago o eterno questionamento do motivo de nossa passageira estadia na Terra. Além disso, fazem uma referência aos sistemas políticos vigentes no século XX, indiretamente aliando o capitalismo ao mal e o socialismo ao bem. Tais pensamentos caracterizariam a formação lenta do modernismo, no qual Graciliano Ramos se inseria indubitavelmente.

T Alves
Enviado por T Alves em 28/12/2013
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