Um jogador: Apontamentos de um homem moço

Um jogador: Apontamentos de um bom moço (1866) e é uma obra de Fiódor Dostoiévski (tradução direto do russo por Boris Schnaiderman pela editora 34) que possui uma narrativa irônica através de uma trama envolvente no qual é mostrado que todos os interesses dos personagens giram entorno do dinheiro. Além disso, a trama retrata de forma brilhante e pertubadora a atmosfera dos cassinos através dos profundos traços psicológicos de um jogador.

O que imediatamente nos chama a atenção foram às circunstâncias que o livro foi escrito. Imerso em dividas, Dostoiévski, encontrava-se em uma situação dramática: ou entregava a seu editor um novo livro em pouco mais de um mês, ou devido um contrato draconiano perderia o direito a qualquer remuneração por suas obras pelos próximos nove anos. Para conseguir ter sucesso na sua empreitada, Dostoiévski contratou uma taquigrafa Ana Grigórievna que virou sua esposa e que posteriormente acabou aparecendo na dedicatória da sua última obra: Os Irmãos Karamazov. E foi com uma rapidez impressionante que elaborou esse romance: do dia 4 a 29 de outubro.

A história se passa em uma cidade fictícia chamada Roletenburgo, local conhecido por sua estação de águas medicinais. O protagonista principal e narrador, Aléxis Ivanovitch é um preceptor (acompanhando a educação de crianças) que trabalha em um hotel para um falido nobre russo, o general. Esse general é perdidamente apaixonado por Mademoiselle Blanche, uma jovem francesa que se utiliza da beleza para garantir o sustento. O general deposita a esperança de viver esse amor na eminente morte de sua velha e endinheirada "avozinha", de quem seria o único herdeiro. Polina, enteada do general, é amada platônica e submissamente por Aleksei Ivanovitch.

Aleksei é retratado como uma pessoa sem um passado detalhado, que servia à família nobre russa para sobreviver e que não se conformava com sua condição social considerada inferior por vir de uma classe abastada. Frequentador assíduo dos cassinos locais, ele passa a criar métodos e cálculos no intuito de fazer fortuna nas roletas.

Ao longo do romance são constantes as impressões de Aleksei em relação ao jogo:

[...]Devo dizer que, à minha frente, um francês ganhou e perdeu seneramente e sem um traço sequer de emoção trinta mil francos. Creio que um verdadeiro cavalheiro deve perder tudo sem qualquer emoção. O dinheiro deve ficar tão abaixo de um cavalheiro que ele o negligencia sem se inquietar. Claro, é muito aristocrático parecer ignorar o quanto todo aquele ambiente é vulgar e devasso[...]”Mas observarei o seguinte: desde algum tempo, é para mim muito desagradável adequar minhas ações e meus pensamentos a qualquer critério moral. Tenho me voltado para outra direção...".

Devido Dostoiévski possuir uma paixão avassaladora pelos jogos, o romance foi tido para muitos como experiência direta da vida do autor. Personalidades como Thomas Man e a própria viúva do autor, escreveram que a obra possuía um caráter essencialmente autobiográfico. Em direção oposta da bibliografia oficial, críticos literários como Schnaiderman¹ (p.218) discordam ao afirmarem que esse ponto de vista é insuficiente e contraditório. Para ele muitos leitores tem enorme dificuldade de separar a experiência vivida e a ficção do eu narrador.

Como em outras obras, o autor evidencia o aspecto degenerativo da personalidade através da busca desenfreada por dinheiro. O cálculo e o ganho predominam sob todas as circunstâncias, inclusive no amor de Aleksei a Polina. Além disso, ao longo do romance nos deparamos com personagens poloneses e franceses aproveitadores e golpistas, judeus agiotas e ingleses corteses e fleumáticos. Um jogador possui uma crítica cultural contra o capitalismo que se traduz pelo ganho fácil do jogo e pelas perdas catastróficas.

Confesso que não foi um dos livros mais empolgantes de Dostoievski que tive contato (quando comparados a suas obras máximas como: Crime e Castigo, Os demônios, O Idiota e Irmãos Karamazov). Contudo, não deixo de ter uma grande satisfação ao termino da obra. O livro mantém uma constante intensidade através de diálogos emblemáticos que a todo instante prendem a atenção do leitor. Fiódor Dostoiévski de forma intrigante consegue mergulhar na alma humana e nas desventuras dos seus complexos personagens dando a eles um caráter universal.

Inã Cândido
Enviado por Inã Cândido em 10/12/2013
Reeditado em 13/12/2013
Código do texto: T4606626
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