Civilização Hebraica
Este texto é um diálogo com o livro "As Primeiras Civilizações" de Jaime Pinsky.
O autor remonta as origens da civilização hebraica, colocando em pauta as diferenças entre os antigos hebreus e os judeus modernos. Cita o calendário hebraico, que tem quase 6 mil anos (seria a origem do mundo/universo de acordo com uma convenção de sábios desta sociedade) e a origem das religiões abraâmicas a partir de Isaac e Ismael, filhos de Abraão.
Segundo Pinsky, os hebreus têm origem mesopotâmica, e isso se comprova diante de muitos fatos: a Bíblia relata isto, a língua falada por eles têm origem semita e vários de seus mitos são apropriações de mitos babilônicos.
A Bíblia pode e deve ser usada como fonte histórica quando se trata dos hebreus (e também dos egípcios e mesopotâmicos). Apesar de seus acontecimentos místicos, de sua historicidade e cronologia, ela conta muito do cotidiano dessa civilização, seus costumes e seus mitos regionais.
É importante lembrar-se da denominada “Geração do Deserto”. Os hebreus que foram para o Egito não são os mesmos que vão para Canaã. Provavelmente muitos permanecem no Egito e os que vão com Moisés já tem descendência de miscigenações, além de outros sujeitos de grupos distintos estarem presentes nesta “jornada”.
Por certo tempo, os hebreus (estabelecidos na região de Jericó), organizam-se em um sistema tribal com chefes militares denominados juízes. Entre estes juízes, surge Saul que se torna rei e institui a monarquia. O autor descreve Samuel (que “profetiza” esta passagem) como um profeta do passado, pois este narra a transição do sistema tribal para a monarquia como uma profecia, apesar disso já haver acontecido séculos antes de sua escrita.
Saul tenta unificar o reino hebreu (Israel e Judá), porém fracassa e morre no processo de tentativas. Eis que surge Davi, que inicia seu reinado com um território pequeno e vai se expandindo aos poucos, até conquistar dos filisteus a cidade de Jerusalém.
O Império de Davi era muito pequeno comparado a outros, entretanto era algo excepcional naquela região e para aquele povo.
Com o fim da vida de Davi, surge um dos mais míticos personagens bíblicos, seu filho, Salomão.
Salomão não foi tão destro quanto seu pai para a guerra, porém era um grande político e amante. Era amigo de vários reis e faraós. Mas sua mitificação se deve à construção do Templo de Jerusalém.
O Templo era uma nova morada para Javé, que já havia, segundo a Bíblia, habitado vários locais. Interessante a ideia de Deus nacional: Javé só podia ser cultuado em território hebreu.
A construção de templos e instituição de sacerdotes, neste contexto, origina a ritualização do culto a Javé, privando o povo de seu antigo contato particularizado com seu deus.
Este povo é o primeiro a instituir o chamado monoteísmo ético, que é o culto a um único deus e a negação de todos os outros, associado a uma ética social, que avaliava e regrava a conduta dos sujeitos.
Esta ética é mostrada nos escritos de alguns profetas do período da monarquia, que percebiam o fardo do povo perante o luxo dos nobres. Em suas palavras, os profetas posicionam-se contra a ritualização do culto e a despreocupação com os desamparados e marginalizados da sociedade.
“... o conhecimento era uma forma de aproximação com Deus, daí a necessidade de escrever...” É importante lembrar que os hebreus e judeus modernos têm muita importância na Sociedade devida esta afirmação de Pinsky. Além dos grandes nomes como: Karl Marx, Sigmund Freud, Albert Einstein, entre outros, há a grande importância de escritos, como a Bíblia, na pesquisa como fonte histórica.
“... Descobre em algum local o que afirma ser a Arca da Aliança...” Neste episódio bíblico, Davi encontra esta arca que afirma ser o símbolo da aliança entre Deus e o povo, mas é importante lembrar que naquele momento o rei necessitava de um prestígio religioso, além do militar. E este prestígio se legitima com este objeto sagrado, que por vezes servia como “estandarte de guerra”, que dava aos soldados força na batalha. Esta arca não tem seu mito encerrado com Davi, mas perdura até os dias de hoje, passando pelas Cruzadas, onde se dizia que os Cavaleiros Templários a detinham em mãos, para usar seu poder divino contra os islâmicos.
Para mim, é muito relevante o estudo do povo hebreu, não só por ele mesmo, mas por seus encontros com as regiões mesopotâmicas e o Egito. No Egito, algo que se destaca é a agradável chegada dos hebreus e, de repente, sua escravização. De acordo com alguns autores, isso se dá porque quando José torna-se aliado do faraó, o faraó não era de fato egípcio, mas hicso, e após a morte de José a nobreza egípcia retoma o poder e vê os hebreus com maus olhos, por terem sido aliados dos hicsos.
No aspecto cultural, a religião judaica é muito complexa e arraigada, com várias correntes. É complicado, porém muito interessante, analisar a historicidade deste povo a partir deste aspecto. O grande problema de estudar sociedades antigas, como os hebreus, é que as fontes misturam os fatos com a aura mística religiosa e mítica, assim exige-se um maior esforço e exercício de erudição.
Seria Abrahão pai de Isaac e Isaac pai de Jacó? Possivelmente não. Há muitas teses em torno desta genealogia, entre elas uma que até demonstra que eles nem ao menos foram parentes, mas viveram num mesmo período em regiões distintas. Porém isto não é o que mais importa na religião judaica, mais importa a filosofia e ética apresentadas dentro destas histórias bíblicas.
Por que há regras tão expressivas de conduta dos sujeitos, como não comer carne de porco ou o ato da circuncisão? Talvez não seja algo banal ou de simples ritualização. Hoje se sabe que a circuncisão é benéfica no contexto de higienização e que a carne de porco, se mal processada, pode conter parasitas nocivos ao organismo humano. Talvez estas regras, instituídas desde Moisés até Salomão, fossem atos de precaução, um modo mítico de explica-las (mas e a ciência também não é um mito?).
Há hoje, muitos judeus ligados a questão do comunismo. Isto está intrinsecamente relacionado à ética judia, talvez utópica (como cita Pinsky), para uma sociedade mais justa, como era no sistema tribal hebraico (um comunismo primitivo).
A relação entre judaísmo e comunismo, volta a colocar este povo como bode expiatório dos problemas do mundo. Na Rússia, às vésperas da Revolução Socialista, o Czar manda publicar o livro “O Protocolo dos Sábios de Sião”, que mostra uma convenção de judeus que desejam dominar o mundo. Na Alemanha, com a ascensão de Hitler, este os coloca como culpados pelas mazelas sociais do país pós-Primeira Guerra, dizendo que o Tratado de Versalhes havia sido assinado por governantes judeus. Atualmente, com a proliferação e crescimento de grupos neonazistas, ressurge o mito do Protocolo dos Sábios de Sião, e alia a esta questão o acontecimento do dia 11 de setembro de 2001. A nova culpa dos judeus é de serem aliados de Osama Bin Laden, pois no dia 11 de setembro, segundo esta ridícula história, mais de 4 mil judeus não foram aos seus postos de serviço no World Trade Center.
Não podemos nos esquecer da questão do Estado de Israel, um problema discutido desde o século passado, que até hoje não se chega à conclusão alguma.
Os judeus carregam uma história de sofrimento e nostalgia dos “anos dourados de Davi”, já passa da hora de solucionarmos alguns grandes problemas desta nação sem Estado (ou que se dizime a ideia de Estado-nação) e parar de culpa-los injustamente pelos males da História.