Mestres da Literatura do Séc. XIX
A realidade é só um ponto de vista – Henry James
Henry James é um escritor americano, que viveu entre 1846 e 1916. No fim de sua vida se naturalizou britânico, sendo colocado como um dos principais expoentes do realismo na literatura do século XIX. “Decisão Correta” foi escrito em 1899 e publicado no ano seguinte. Algumas pessoas acreditam que o conto tem um teor auto-biográfico, onde James expressa o desejo de não ter uma biografia escrita pós-morte, acreditando que a eternidade de um escritor esta em sua obra.
“Decisão Correta” conta a história de um jornalista, George Withrmore, que é convidado a escrever a biografia de um escritor morto, Ashton Doyne, também seu amigo. A princípio George aceita o convite e se anima com as possibilidades. O fato de ficar próximo a viuva, e se aprofundar na vida de seu amigo seduzem Doyne. Ele vai ter acesso praticamente irrestrito aos materiais não publicados e a casa de Withrmore.
James começa o conto de forma objetiva, abrindo a história sem mistérios. A apresentação dos personagens acontece naturalmente, mas sem o aprofundamento de informações sobre a psicologia de cada um. Quase como num filme, onde o leitor vai descobrindo o personagem a cada cena a partir de uma referencia própria. O desenvolvimento do enredo vai dando pequenas pistas do psicológico de cada, mas nenhuma descrição precisa. É dos sentimento e da vida do morto, Withrmore, que se trata a história.
Existe uma contraposição entre Ashton Doyne e George Withermore. De certa forma Doyne era o que Withermore queria ser. Era bem sucedido, uma vida agitada e mistérios. Enquanto isso Doyne era um jornalista sem muita expressividade, com uma relação pessoal com o morto, não profissional ou de parcerias. Whitermore morreu relativamente jovem, e a principio era contra que se escrevesse uma biografia de sua vida. Mas sua viuva vê esta possibilidade como uma forma de tributo a sua vida, e coloca Doyne dentro de sua casa.
Sem nenhum alarde, e nem referencia direta a qualquer coisa sobrenatural James insere o Withermore na história como uma energia quer permanece presente na casa. O sobrenatural é apenas uma sugestão de James. Fica na interpretação do leitor sua existência ou não. Num primeiro momento esta presença parece ajudar no processo de escrita e pesquisa e é bem vista pelos personagens. Mas com o tempo isso passa a dificultar o trabalho de Doyne, e também a relação com a viúva. Por fim o jornalista decide não mais escrever a biografia. Fica a percepção de que a realidade é apenas aquilo em que se acredita, não um fato em si.
A escrita do conto é leve. A narrativa proposta por James segue um fluxo que ao mesmo tempo que se parece simples e óbvio é complexo e contraditório. Ele consegue suprimir informações quando parece estar as oferecendo. “Devisão Correta” esta dividido em três partes geometricamente demarcadas. Na primeira se apresenta o enredo e os personagens. Em seguida se desenrola o roteiro e se prepara o climax. Quando se espera ansiosamente por ele na terceira parte James coloca um ponto de interrogação na cabeça do leitor e fecha o conto com uma negação inesperada.
Nada resiste a guerra - Guy de Maupassant
Henri René Albert Guy de Maupassant escreveu grande parte dos seus contos durante a guerra Franco-Prussiana, no Séc. IX. A guerra era um tema recorrente em sua escrita. Ele a tratava como uma futilidade, onde somente os cidadãos perdem. Perdem sua vida, sua rotina, suas casas, seus referenciais. Sua escrita é realista e fantástica, podendo ser descrita também como simples. Por este conjunto de características o francês é considerado um dos maiores contistas modernos, tendo sido uma grande inspiração para outros grandes escritores.
Seu primeiro conto publicado foi “Bola de Sebo”, em 1880. Nele Maupassant trata de como os franceses reagiram a invasão prussiana durante a guerra. As pessoas fugiram tentando se afastar das mazelas do combate e da ocupação. Em tempos de guerra sentimentos instintivos, de sobrevivência, emergem de dentro de cada um na tentativa de garantir a vida. A repugnância a guerra de Maupassant não é diferente do sentimento com relação aos prussianos. Estes são descritos sempre com o peso da raiva sobre eles.
A história de “Bola de Sebo se passa na França”. Durante a guerra de 1870, os prussianos ocupam a França. Numerosos habitantes decidem então fugir da ocupação e da necessidade de alojar na sua casa os inimigos estrangeiros. Três casais burgueses, dois religiosos e uma jovem prostituta estão fugindo no mesmo trem rumo a Havre. A partir desta combinação Maupassant mostras, através da convivência deles, suas diferenças sociais, culturais e éticas.
Bola de Sebo é o nome da prostituta. Esta seria a primeira a ter seu comportamento e passados questionados por seus pares, mas o escritor francês traça outro caminho. Num determinado momento todos tem fome, mas só ela tem comida. A prostituta não exita em dividir sua alimentação com outros. Com isso ele quebra qualquer preconceito que poderia existir. O gesto é muito simbólico visto o que se passa a frente. O trem faz uma parada em Tótes, para descanso. Um oficial alemão impede os franceses de sair do trem. Ele impõe a condição de dormir com Bola de Sebo, para que fossem liberados. No início ela recusa. São daquele tipo de gente que todos estão procurando fugir. Mas com a insistência de seus companheiros, ela acaba cedendo.
Durante este processo, Maupassant não destila sua raiva apenas aos invasores. Ele aponta sua caneta diretamente a uma sociedade francesa. Como se fosse algo normal, os burgueses a bordo do trem usam estratégias de persuasão, de crítica, acusações inábeis, Bola de Sebo sofre um verdadeiro ataque moral. Depois do ato a prostituta não se recupera emocionalmente. Ela vê em seus conterrâneos a mesma repugnância que tem pelos soldados invasores. São muitos os ângulos pelos quais a história pode ser analisada. Fica a impressão que em tempos de guerra não existem limites para um francês deixar o seu comodismo, nem aos invasores nas relações com os civis do território invadido.