O que é método Paulo Freire
Francineide Batista de Sousa Pedrosa
BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é método Paulo Freire. 29ª. ed. São Paulo: Brasiliense, 2008.
Graduanda do curso de Pedagogia do CAP/UERN.
O livro, “O que é o método Paulo Freire” do autor Carlos Rodrigues Brandão, traz um relato sobre a aplicação do “Método Paulo Freire de Alfabetização de Adultos” que alfabetizou milhares de pessoas em 40 horas em todo o mundo. O método não foi feito apenas com a intenção de educar, mas, de preparar o cidadão para a vida, para a humanização. “POR QUÊ? PRA QUÊ”, alguém pensou em alfabetizar os adultos? Na visão de Freire, as pessoas não precisavam apenas saber ler e escrever, mas precisavam aprender a pensar, a debater, a discutir, a refletir e, a partir disso, repensar uma nova sociedade.
Brandão inicia falando sobre o nascimento desse livro, junto às suas conversas com Paulo Freire. Os rascunhos constituíam quase que seu diário de viagens, entre São Paulo e o Nordeste do Brasil, especificamente a cidade de Angicos no Rio Grande do Norte. O autor nos deixa a par de como surgiu o método e de como foi implantado na cidade de Angicos. Nascia, junto com aquele método, “um novo sentimento de Mundo, uma nova esperança no Homem. Uma nova crença, também, no valor e no poder da Educação” (BRANDÃO, 2008).
Um ponto marcante relatado por Brandão foi o encontro da “Semana de Arte e Filosofia”, que aconteceu em fortaleza vinte anos após o evento de Angicos. Nessa semana foram abordadas questões do trabalho com a Educação Popular, e a presença de Paulo Freire tão esperada para que pudessem colocar em dia todas as conversas sobre os anos passados, não aconteceu, pois, Paulo estava muito cansado da carga de trabalho que exercia e também por que acabara de voltar do exílio.
Em “UM DIA, PERTO DE ANGICOS”, Carlos Brandão fala da experiência e da aplicação do método Paulo freire, em que um grupo de jovens universitários sonhava com a Educação e por meio dela a libertação do homem. Inicialmente foi feito uma experiência na cidade de Recife, que se ampliou mais tarde em Angicos, Mossoró e João Pessoa, na Paraíba. As primeiras experiências foram feitas com agricultores, por meio dos “círculos de cultura”, tanto na roça quanto na cidade, que depois de testados foram expandidos para as demais cidades do país.
Os resultados obtidos foram 300 trabalhadores alfabetizados em 45 dias. Diante disso, o método foi aplicado em todo o território com o aval e o incentivo do Governo Federal, e em virtude disso, realizado vários cursos de formação de coordenadores, com um plano de ação que previa a instalação de 20 000 círculos de cultura, com o objetivo de tirar da escuridão do analfabetismo àqueles que até então não sabiam ler nem escrever.
No entanto, um fato notório impediu a propagação de tais ideias. Em década de 60 foram descobertas nas gráficas as cartilhas que serviram de suporte para a aplicação do método. E sob o título de Viver é Lutar, instalou-se a “voz da razão”, que tudo pode, tudo manda, e todos são forçados a obedecer: a ditadura. Entendido como um ideal comunista, o sonho de jovens que pensavam em mudar os rumos da educação e erradicar o analfabetismo, levando às pessoas a prática da humanidade, desmorona. Cala-se a voz da população e a propagação do método, caracterizado de ‘perigosamente subversivo’, foi amordaçada e mandada para o exterior, num exílio que durou 16 anos.
Após o exílio de Paulo Freire no Chile, e com o reconhecimento de que o país se destacava no combate ao analfabetismo graças a um brasileiro exilado, Paulo vai para os Estados Unidos, temendo ser descoberto e ter novamente a sua voz calada pelas forças das cartilhas. De lá ele ganha o mundo engajado em campanhas de libertação em favor dos que não sabiam ler nem escrever, deixando, por onde passou marcas de sua coragem de educador, e seu método, tão rejeitado em seu país de origem, é reconhecido e estudado em todo o mundo. Somente em 1980, Freire volta ao Brasil e recomeça sua luta em defesa da erradicação dos adultos analfabetos.
“O ABC DO MÉTODO” se caracterizava em um fazer construído coletivamente, ou seja, o educador precisava arquitetar o ensino junto aos alfabetizandos, com materiais que fossem do conhecimento deles, próximo de suas realidades. Pois Paulo não acreditava em um saber pronto e acabado, mas sim, em um saber construído “onde há sempre partes de cada um no outro, não poderia começar com o educador trazendo pronto, do seu mundo, do seu saber, o seu método e o material da fala dele” o que referendava sua famosa tese de que “ninguém educa ninguém e ninguém se educa sozinho” (BRANDÃO, 2008), na visão de Freire, a educação é uma troca de experiência, saberes e valores e, por isso, não deve ser isolada, e sim, partir da coletividade.
Outro ponto importante que precisa ser repensado é o valor do livro, para Freire as cartilhas tinham um saber limitado que levava o educando a desenvolver tal pensamento, ou seja, era um saber condicionante, que geria a mentalidade das pessoas a determinado aforismo. Uma das razões para a construção do método era exatamente alfabetizar as pessoas com elementos de seu cotidiano, que fossem próximos da realidade deles, pois de nada adiantava ler “Paulo viu a uva”, se o alfabetizando não conhecia a fruta uva. Seria mais fácil então trabalhar, por exemplo, com os nomes dos materiais que eles conheciam com tijolo, pedra, ou elementos da roça: melancia, feijão, milho, entre outros, ou ainda os seus próprios nomes.
O método de alfabetização visava um levantamento linguístico, se assim podemos dizer. Era preciso ir ao lugar, conhecer a realidade, ver como as pessoas se comunicavam, suas linguagens orais, para, a partir disso, formular suas atividades de ensino. E desse levantamento deveria surgir às palavras geradoras, ou seja, aquelas que pertenciam ao contexto do aluno, e por isso, conhecida deles, que Brandão caracteriza como “A DIMENSÃO MAIS AMPLA: O TEMA GERADOR”.
“O CÍRCULO DE CULTURA” desenvolvia um trabalho com a oralidade, em que uma turma de alunos se juntava aos alfabetizados para debaterem sobre determinados assuntos do interesse da coletividade. O fomento na participação do diálogo, o saber fazer coletivo, a construção de suas próprias formas de pensamento, eram a peça chave para que os grupos construíssem suas próprias aprendizagens, seus saberes individuais e coletivos.
No método de alfabetização as “FICHAS DE LEITURA” compreendiam o aporte para a leitura do mundo. Por elas os alfabetizandos entendiam que precisavam pensar e que esse pensar competia para a aprendizagem a partir de suas próprias leituras. Em situações que geriam debates e críticas os grupos de educandos entendiam o processo da alfabetização como sendo uma prática tanto coletiva quanto individual, em que dependia de cada um o melhoramento de sua aprendizagem. “O trabalho com as fichas de cultura introduzia questões, inaugurava conceitos e convidava a idéias de um pensar que é, na verdade, o do próprio fundamento do método: de sua filosofia e de sua pedagogia” (BRANDÃO, 2008).
De acordo com o autor, as fichas de leitura e as palavras geradoras davam fundamentação para que os alunos aprendessem a formar novas palavras e a partir delas, frases e textos, tudo, é claro, de acordo com o universo de conhecimento dos alfabetizandos. Todas as palavras, frases e texto remetiam à labuta, ao cotidiano vivido pelos trabalhadores, eram palavras com significados concretos.
“AJUSTAR, INOVAR, CRIAR” era o lema do método de Paulo Freire. No entanto, nem tudo foi fácil, mas sim, construído coletivamente e a cada dia renovado, remodelado, por isso tinha muito mais chances de dar certo do que algo que já vem pronto e acabado, afinal, se nós não somos assim, muito menos os métodos. No processo de desenvolvimento e aplicação dos trabalhos, havia muita flexibilidade, pois o que realmente importava é que o método servisse para alfabetizar enquanto formasse cidadãos críticos e reflexivos, capazes de melhorar a sociedade.
Falar primeiramente de questões existenciais, de problemas em comum, de vivências, tornava o método eficaz no que chamamos de realidade do aluno, de trabalhar os elementos que fazem parte de seus cotidianos. É o que Brandão relata sobre “AS EXPERIÊNCIAS PIONEIRAS DO NORDESTE E DO RIO DE JANEIRO”, em que de acordo com cada realidade as palavras geradoras e as fichas de leitura eram adaptadas, dando subsídios para que o grupo trabalhasse somente com aquilo que estivesse ao seu alcance, ou no seu entendimento. As palavras geradoras mudam de região para região, visto que se adaptam a realidades distintas e nelas faz a diferença.
Entendemos que nesse ponto encontra-se a diferença entre a criação do método e a forma de se alfabetizar nos dias atuais. Vimos, sob o relato de Brandão que o processo inicial do método, levava os alfabetizadores a pesquisar, a ir buscar no meio, as dificuldades dos alunos, o que eles sabiam e poderiam aprender, sendo que para isso, precisavam conhecer a fundo o universo do grupo que seria alfabetizado.
O planejamento, a pesquisa, o conhecimento das inúmeras realidades, o pensar coletivamente numa solução para determinado problema faz muita diferença no processo de alfabetizar. Percebemos que hoje, é preciso reinventar o método, adaptá-lo de modo a atender a nova demanda social e as mudanças ocorridas ao longo dos tempos. É preciso também perceber as intenções que estão implícitas no processo educacional atentando para as palavras do próprio Freire, “na verdade, não há educação e por isso alfabetização de adultos neutra. Toda educação tem, em si, uma intenção política...”, ou seja, não adianta tentar desvincular o ato educacional da política, pois ambos são indissociáveis.
Todavia, podemos pensar que de fato a educação de jovens e adultos precisa assumir seu papel na sociedade: educar para os direitos humanos e para a cidadania. Proporcionar aos cidadãos não só a oportunidade de aprender a ler e a escrever, mas, a condição de sujeitos pensantes, capazes de contribuírem positivamente para o engrandecimento das causas sociais e decididos a lutarem por seus direitos.
Cabe, no entanto, aos educadores assumirem sua profissão frente ao processo de ensino e aprendizagem e não se conformar com a desmotivação e a falta de compromisso daqueles que pensam a educação de jovens e adultos como um passatempo ou uma forma de permanecer nos seus empregos sem assumir devidamente seu papel de professor. A educação é coisa séria e, para tanto, precisa ser repensada, as práticas do método de Paulo Freire, segundo os relatos de Brandão, deram certo e tiraram da escuridão do analfabetismo centenas de trabalhadores que almejavam um futuro melhor por meio da educação.
Muitos foram os fatores que contribuíram para o sucesso do método, e se analisarmos: a vontade de aprender a ler; a necessidade de se comunicar de forma mais abrangente; o interesse daqueles jovens pela descoberta do processo do ensino e aprendizagem para adultos; a planejamento das ações; a pesquisa; o conhecimento do campo de trabalho; a interação entre alfabetizadores e alfabetizandos; os círculos de cultura que incentivava os cidadãos a se reconhecerem sujeitos capazes de mudar sua própria história; enfim, todos esses motivos foram fundamentais para que Paulo Freire e seus companheiros tivessem êxito na aplicação de seu método. O calabouço do exílio só veio a contribuir para a expansão de suas ideias e para o reconhecimento do seu trabalho frente à educação de jovens e adultos em todo o mundo.