“ Vendo, pois, Deus que a terra estava toda corrompida (...) disse a Noé: O fim de toda carne chegou diante de mim; a humanidade, por suas obras está cheia de iniqüidades e eu as exterminarei com a terra.”Gênesis, 6:12.
Assim disse o Senhor: “ – Estou arrependido;
Pois estes seres que deveriam ser tão perfeitos
Se encontram tão cheios de malícia e defeitos
Que já não passa de um rebanho corrompido.”
Arrependido estava, porém inda esperançoso,
O Senhor foi capaz de mostrar sua clemência.
Pois que deu cento e vinte anos de penitência
Para o homem se tornar novamente virtuoso.
Porém a corrupção naquela gente era tão forte,
Que não podia mais ser curada só com perdão,
Pois o salário do pecado se paga com a morte.
E quarenta dias de chuva forte e intermitente,
Afogou de vez aquela antiga e má civilização.
Mas Noé e filhos Deus guardou para semente.
Comentário:
Segundo a bíblia, antes de Deus mandar o dilúvio, havia sobre a terra uma raça de gigantes, descendentes do conúbio entre os anjos caídos e as filhas dos homens, que eram muito formosas. Essa civilização, segundo os cronistas bíblicos, era muito perversa e tinha “os seus pensamentos todos voltados para o mal”. (Gênesis 6:5).
Em estudos anteriores já nos referimos ás teses do escritor e historiador Zecharias Sitchin, o qual, estudando a literatura suméria encontrada nas ruínas de Babilônia e Ur, a antiga cidade do patriarca Abraão, afirma que a tal civilização de gigantes a que se refere a Bíblia era a civilização dos anunnakis, povo extra terrestre que teria aportado na terra por ocasião da aproximação do planeta chamado Nibiru, planeta esse que teria sido detectado pelas sondas da NASA e rotulado com o nome de planeta X. Esse planeta, que faz uma órbita em volta do sol no prazo de 3600 anos, se aproxima da terra a cada um desses períodos, e quando isso acontece várias mutações ocorrem na terra. A ultima dessas aproximações teria ocasionado o dilúvio.
Já dissemos acreditar que as crônicas bíblicas a respeito das oritgens da humanidade foram todas inspiradas na literatura dos povos mesopotâmicos, onde o próprio povo de Israel teve origem.
Abraão, por suposto um mago, ou sacerdote caldeu, com certeza conhecia todas essas lendas e as legou aos seus descendentes, que as adotaram como sendo suas próprias lendas de origem.
Abstraindo o fato de os tais anunnakis, que aparecem na literatura suméria como sendo os ancestrais dos homem serem, efetivamente, seres extraterrestres que aportaram na terra em face desse acontecimento cósmico, não se pode negar que o dilúvio relatado na Bíblia efetivamente ocorreu, pois esse acontecimento é referido em quase todas as tradições antigas, sendo pois, um arquétipo de compartilhamento coletivo em todas as civilizações que emergiram da pré-história.
Não parece restar dúvidas também que os cronistas bíblicos tenham se inspirado na literatura suméria para criar o seu relato a respeito desse acontecimento, que se não eliminou toda a vida na terra, como diz a Biblia, pelo menos foi responsável por uma grande modificação, não só ambiental no geografia terrestre, mas também social, política e talvez biológica.
É evidente que os cronistas israelenses se apossaram desses antigos relatos da mitologia suméria para justificar suas próprias teses a respeito da origem do povo de Israel e sua pretensão á qualidade de “povo escolhido” por Deus. Assim Noé, o patriarca que Deus teria escolhido para dar continuidade á raça humana, é um ancestral do povo de Israel, pois seria de um dos seus filhos, Sem, o pai das tribos semitas, que sairia, tempos depois, a tribo de Israel.
O relato bíblico sobre a Arca de Noé e como seus três filhos deram origem á raça humana depois do dilúvio é por demais conhecida e não vamos nos deter nos detalhes que a Bíblia registra. Queremos nos referir aqui ás mais variadas interpretações que lhe são dadas.
Evidentemente, nem nas próprias interpretações dos sábios rabinos judeus que fazem a exegese da Bíblia é aceita a idéia de que Noé teria posto em sua arca a totalidade das espécies de animais existentes sobre a terra, representados por um casal de cada. Uma arca que pudesse conter tantos animais assim seria extraordinariamente grande( não somente trezentos côvados por cinqüenta, ou seja cerca de 198x 33 metros, igual a um espaço de 6.534 m2, mais ou menos do tamanho de um campo de futebol, como diz a Bíblia). Um barco assim levaria muitos anos para construir, exigindo para isso uma mão de obra colossal.
Mesmo para os mais fundamentalistas a história da Arca de Noé tornou-se um constrangimento difícil de evitar. Como explicar uma história tão incrível, ainda que Deus fosse o fautor dessas ações? Dessa forma, vários intérpretes elaboraram curiosas teses para explicar essa história, algumas delas mais bizarras ainda que o próprio relato bíblico.
Na tradição cristã, por exemplo, a Arca de Noé se tornou uma alegoria na qual os sobreviventes do dilúvio eram os “salvos” pelo batismo da água, praticado por João Batista e adotado pelos seguidores de Jesus. A Arca era a Igreja, “ a nave da salvação”, aquela que levava os convertidos para a “montanha da salvação”, e dali para uma nova terra e uma nova raça. Santo Agostinho, na sua obra clássica “A Cidade de Deus”, chega mesmo a dizer que as dimensões da Arca correspondiam ás dimensões do corpo de Cristo, ou seja, a própria Igreja. Santo Hipólito, bispo de Roma (235- 312?), tentou demonstrar que "a arca era um símbolo de Cristo, o qual já era esperado desde aqueles tempos. Com isso declarou que a Arca tinha sua porta aberta na parte oriental, e que os ossos de Adão (sic) foram levados a bordo juntamente com ouro, mirra e resina, e que a arca foi lançada ao vaivém nas quatro direções sobre as águas, fazendo o sinal da cruz, antes de eventualmente parar no Monte Kardu, "a leste, na terra dos filhos de Raban, e os orientais chamaram-na de Monte Godash e os árabes e os persas chamaram-na de Ararat".
Essas são algumas das explicações que foram sacadas dos bestuntos dos doutrinadores para explicar o inexplicável. Mas as mais bizarras são aquelas levantadas por doutrinadores islamicos.
Abd Allah ibn Abbasplo, que viveu no tempo de Maomé, escreveu que a arca tinha forma de barriga de ave e foi feita com a madeira de uma única árvore.Já o persa Abu Ja'far Muhammad ibn Jarir al-Tabari, que escreveu uma História dos Profetas e Reis informou que que a primeira criatura a subir a bordo foi a formiga e a última foi o burro, e que por meio desse animal Satanás também subiu a bordo e acabou sendo salvo. Masudi (956? ) outro comentador árabe, disse que no seu tempo o local onde a Arca parou poderia ser visto e ela ainda estavá lá. E que ela passou por Meca antes de dirigir-se ao monte Ararat, onde finalmente ancorou.
E por vaí, mostrando o extraordinário surto de imaginação que esse assunto tem provocado ao longo dos séculos.
Em outras tradições há igualmente muitas informações bizarras sobre esse tema.
Os mandenos, tribo que habita o sul do Iraque, que se dizem discípulos de João Batista, ao qual reverenciam como o verdadeiro Messias, sustentam que a Arca de Noé parou no Egito e não na Armênia, como diz a Bíblia.
Na mitologia dos irlandeses, um filho de Noé, chamado Bith, que não foi autorizado a entrar na arca, subiu a bordo de outro navio e aportou na Irlanda, junto com um grupo de pessoas. Ali ele começou um processo de colonização na ilha, que malogrou.
Na época do Renascimento, o tema da Arca de Noé passou a ser rediscutido em novas bases, com os comentadores tentando arrumar explicações mais lógicas para os fatos. Assim é que Alfonso Tostada, filósofo, Johannes Buteo, geometra, e outros estudiosos elaboraram curiosas explicações para mostrar como Noé conseguira conciliar a presença de tantos animais de instintos diversos juntos, e como conseguiam conviver num ambiente tão complicado como aquele que deveria existir na arca.
A par das explicacações puramente imaginativas, como as acima mencionadas, surguiram teses como as de Thomas Browne(1646) Lipsius (1547-1606) e Atanásio Kircher (1601-80), que tentaram harmonizar a crônica biblica com o conhecimento histórico e natural da época. As hipóteses propostas por esses estudiosos foram de bastante utilidade nos estudos posteriores da flora e da fauna do planeta..
Hoje a maior parte dos historiadores concorda que a história do dilúvio, bem como as referências anteriores sobre as civilizações que precederam esse fato, bem como muitas outras citações posteriores que a Bíblia faz, como a Torre de Babel, Sodoma e Gomorra, e outras passagens cujas provas arqueológicas ainda não puderam ser levantadas, são reminiscências dos mitos e memórias que os povos mesopotâmeos registraram em sua literatura cuneiforme. Especialmente os sumérios, que possuiam uma rica literatura a esse respeito, devem ter sido os principais inspiradores dos cronistas bíblicos. Os judeus deram á essas histórias um caráter francamente teológico, para fins de provar a origem sagrada do povo de Israel e justificar a sua pretensão de domínio sobre as terras palestinas.
De fato, toda a narrativa bíblica do episódio do dilúvio e a arca de Noé, com todos seus detalhes e nuances, bem como a reconstituição da raça humana através de seus filhos, Sem, Cam e Jafet, são encontrados na literatura suméria, que segundo os historiadores, é anterior á Bíblia em pelo menos um milênio. Essa história é um dos temas principais tratados no famoso poema épico do herói Gilgamesh, na qual um rei-sacerdote de nome Utnapishtim, protegido pela Deusa Ea, foi o único sobrevivente da grande inundação que cobriu todas as terras do mundo. Ali se encontra inclusive a passagem segundo a qual esse personagem, para sondar se as águas já haviam baixado, soltou primeiro um corvo, que não regressou, e depois uma pomba, que ao voltar com um ramo verde no bico, deu a ele a certeza de que as águas haviam baixado.
É importante dizer que escavações arqueológicas no sítio de Ur, que a Bíblia sita como sendo a cidade de origem de Abrão, encontraram provas de que ali, realmente, aconteceu uma grande inundação há cerca de 4000 mil anos atrás. Essa inundação pode ter se originado tanto de um descongelamento das calotas polares quanto como resultado de uma tsunami provocada por um abalo sísmico no fundo do mar, como aquele que destruiu a ilha de Santorini cerca de 2500 anos atrás. [1] Nesse sentido, algumas escavações feitas nesses sítios mostram que, nessa época considerada, as águas do Golfo Pérsico cobriam toda aquela região onde se situam as ruínas de Ur e a moderna cidade de Bagdá.
Na epopéia de Gilgamesh são listadas várias dinastias de reis que supostamente podem ter inspirado os cronistas bíblicos na sua articulação da história dos seus patriarcas. Uma longa saga de lutas e composições dinásticas é relatada para mostrar como a civilização se implantou e se desenvolveu no vale do Tigre e do Eufrates.
Como se pode perceber, Gilgamesh é um arquétipo existente em muitas tradições antigas, da mesma forma que Utnapishtim, o Noé sumério. Na literatura grega, é potente Hércules que faz o papel de Gilgamesh, o qual, tal como o herói sumeriano, também realiza suas façanhas com o objetivo de tornar-se um deus, ganhando a imortalidade.
Assim, parece não haver dúvidas que a narrativa bíblica do dilúvio, e as inspirações para os personagens de Noé e sua família tenham saído da Epopéia de Gilgamesh, clássico da literatura suméria, Não entra aqui em discussão se tais personagens existiram ou não, e se os fatos se passaram de acordo com o que prescrevem essas antigas tradições. O dilúvio é um fato que parece não suscitar contestações. O que se criou em torno dessa história pode ser visto como artigo de fé ou tema de especulações. No fim, o que fica é sempre aquele pressuposto que se coloca quando se trata de discutir assuntos sobre os quais não se tem evidências comprováveis. Esse pressuposto diz: para quem acredita nessas coisas, nenhuma prova é necessária; para quem não acredita, nenhuma prova será suficiente. É crer ou não crer.
ARCA DE NOÉ- MITO OU REALIDADE? DO LIVRO " TESOURO DOS SÁBIOS"- NO PRELO