Uma vida inventada – Maitê Proença
Vamos inventando nossas vidas a cada instante; os que possuem inteligência constroem uma vida mais interessante.
Se contarmos nossa vida, no entanto, suspeito que poucos de nós conseguirão preencher mais que uma ou duas páginas antes de cair em um lastimável desenrolar de pieguices aborrecidas, perfazendo tediosíssima história. Mesmo assim, alguns ousam contar sua própria vida.
"Uma vida inventada" é a autobiografia de Maitê, que começa com um fato trágico que fatalmente baliza toda a sua vida: o assassinato de sua mãe, cometido por seu pai, quando a menina, Maitê, tinha apenas doze anos.
O fato é trágico e contundente; impossível continuar a vida sem que as marcas, as cicatrizes de tamanha tragédia, se imponham constantemente, perdendo a relevância apenas lentamente.
O texto de Maitê, como certamente sua própria vida, tem ritmo acelerado; a autora é parcimoniosa com a pontuação, deixando os dedos correrem soltos pelo teclado, compondo uma história intensa, cheia. Fatos interessantes se sucedem prendendo a atenção do leitor. Maitê parece não ter vivido por viver, nem se acomodado à vidinha banal que quase sempre nos arrasta, ou nos agarra em uma atmosfera de mesmice pastosa.
É provável que tal fenômeno seja um subproduto da inteligência, característica bastante incomum. Raras pessoas são inteligentes, raríssimas mulheres entre elas. Surpreendentemente, além de linda, Maitê é inteligentíssima. Aliás, enquanto lemos a história, quase nos esquecemos do quanto ela é linda, atentando para a ação, para a menina largada no mundo, mas se virando admiravelmente.
O livro é ótimo, poucas vidas foram contadas de forma tão interessante. Os tolos serão tentados a acreditar que os fatos marcantes no início de sua vida a empurraram a construir uma vida tão admirável; tragédias tendem a nos empurrar para buracos sem fim, a menina teve que escapar de um desses. Uma boa autobiografia é fruto das percepções daquele que a conta, razão pela qual a inteligência de quem conta a história é mais importante que a própria história. A vida de Maitê é movimentada e interessantíssima, mas sua história é enfatizada por sua narrativa fluente.
Não sei como esse livro tem sido recebido, suspeito que as mulheres só se permitirão apreciá-lo quando a autora tiver perdido sua beleza. Maitê sobreviverá a seus contemporâneos, não pela glória como atriz; será eternizada como grande escritora.
Pode parecer inacreditável, mas Maitê é ainda mais inteligente que bela, e seu livro é ótimo!