Esclarecendo o Jornalismo Popular
AMARAL, M. F. Jornalismo Popular São Paulo: Contexto, 2006, p.141
O livro da Dra. Márcia Franz Amaral é um guia muito útil para aqueles que desejam entender e esmiuçar o olhar potencial da comunicação nos periódicos populares.
O sensacionalismo da mídia impressa foi abordado com rigor e competência de uma pesquisa comparativa profissional. No texto as referências da autora são intuitivas para jornalistas, professores e estudantes de comunicação, entretanto, passam desapercebidas pela grande massa de leitores da classe C, somando-se a outros repórteres e profissionais da imprensa que foram observados a partir das intervenções e desdobramentos dos objetos estudados. A citação posterior exemplifica o desejo e objetivos primordiais da autora:
“A imprensa popular ligada a grandes empresas de comunicação existe pela necessidade de ampliar o mercado de consumidores de jornais para um público que vive numa situação social, cultural e econômica diferente da do público das classes A e B. Os jornais assumem formas específicas porque o que move essa imprensa é, antes de qualquer coisa, a sedução do público e não a credibilidade ou o prestígio”. Pág. 58
Para ter conhecimento mínimo dessa afirmação foi necessário acompanhar o processo semiótico e lingüístico das fórmulas usuais na imprensa popular. Com especial atenção aos veículos das regiões sul e sudeste, seu foco atingiu os jornais cariocas - O Dia e Extra, os paulistas - Diário de São Paulo e Agora. E com mais detalhes, estatísticas e informações comparativas o Diário Gaúcho do Rio Grande do Sul.
É interessante observar a preocupação com o modo pelo qual se faz Jornalismo hoje em depreciação ao período romântico do exercício da nossa profissão. Após os anos 80 a imprensa de modo geral sucumbiu as necessidades econômicas do Capitalismo para vender jornais as camadas populares sem pensar muito nas conseqüências do que fazer e de como se fazer jornalismo popular com qualidade, observando as necessidades mais abrangentes e o papel social da profissão de jornalista.
Para cativar ou como prefere a autora “seduzir” o leitor e conquistar um “consumidor” vale tudo. Os jornais cada vez mais transformam-se em mercadorias em todos lugares, segmentos e especificidades.
Inicialmente quem consultar o livro poderá pensar ler um alerta sobre como está sendo a transição do momento atual no qual se executam inúmeros objetivos pessoais de donos de Jornal, mais tarde descobrimos que é uma afirmação muito bem estruturada e apoiada com base em suas amostras e pesquisas qualitativas.
A partir da metade de sua obra até o final estão lincados conceitos práticos e trilhando o caminho dos estudos de caso do Diário Gaúcho. Márcia Franz deixa claro que as estratégias de marketing tomaram o lugar do compromisso público com as classes sociais menos favorecidas. Uma habitual relação demagógica e populista dos jornais, levanta a dúbia hipótese que esses leitores não se interessam por noticias políticas e econômicas.
Existem exeções. Porém em reduzido número quando observada a realidade das grandes metrópoles em outros estados como: A Tribuna do Paraná (PR), Jornal da tarde (SP), Diário do Litoral (SC), Super Notícia (MG) entre outros voltados ao “consumidor e leitor” com menos poder aquisitivo e instrução escolar e analítica.
Além disso o livro não possui uma ordem estabelecida para ser lido, os capítulos foram pensados para qualquer pessoa interessada no assunto o que motiva a leitura por qualquer profissional de qualquer área. Traz e levanta informações com tabelas comparativas, o que torna a consulta mais agradável.
E resgata algumas chamadas de capa que lidas hoje provavelmente despertaria a curiosidade pelo inusitado e curioso título ou em outros casos afastaria muitos dos interessados em notícias mais sérias e que possam passar como verídicas e úteis:
“Papais-Noéis que se chamam Dalva, Irena, Nara...” / “Juliana Paes ‘engordei horrores’” (Diário Gaúcho / RS) – “Pai quer a morte do filho com doença incurável. A mãe espera milagre” (O Dia / RJ) / “ A maior indenização trabalhista do País R$ 57 mi é resultado de uma briga de bacanas [...] / Presa por roubar manteiga terá ajuda da OAB (Jornal da Tarde / SP) / Tráfico do Dona Marta determina quem trabalha em obras públicas – (EXTRA / RJ).
O estilo “espreme que sai sangue” de publicar notícias ainda vende bem e de modo perverso atrai anúncios e publicidade (que mantêm e possivelmente ainda vão manter alguns desses jornais ativos), isso gera muitas vezes a necessidade de se criar excessos que fogem da realidade e conseguimos verificar essa observação com clareza após o estudo do capítulo intitulado:
“Um caso – O penny press gaúcho”. Nele é desenhado o cenário que trata das características, perfil do leitor, diferenças com o concorrente Zero Hora, principalmente no que tange as editorias e colunas que possuem nomeações bastante sugestivas: “Casos do outro mundo”, “Presságios do professor Nathanael”, “Falando de sexo”, “Opinião do povo”, “Meu jornal” e por ai segue-se num projeto editorial focado a dar voz aos seus leitores, uma extensão do quintal e do apartamento dessas pessoas.
O trato humano aproxima facilmente os leitores do conteúdo e exige-se um perfil diferenciado para ser considerado um jornalista popular. Ele será visto, indicado, lembrado e facilmente conhecido na região que atua. Nas filas de bancos, entradas de cinemas e restaurantes e por ser incomum quando comparado ao padrão da grande imprensa pode ser excluído do convívio social ou ser discriminado pelos colegas dos grandes veículos. Mas seu referencial e objetivos são outros e possivelmente já é um bom recomeço quando esse profissional assume a sua postura ideológica e defende os interesses do seu público.