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De  Margaux Fragoso, 1979
Editora Rocco, 2011
350 páginas
 
Este é um livro difícil. Tanto de se ler quanto de se entender as razões de quem o escreveu. Principalmente, porque trata-se de uma obra autobiográfica. Mesmo assim, o leitor não conseguirá deixá-lo, e se for necessário interromper a leitura, ansiará por retomá-la o mais breve possível.
Em que ponto alguém se perde tanto de si mesmo, que passa a incorporar uma outra pessoa, um personagem, a fim de suportar a própria vida? Onde começa o certo, e em que momento as coisas terminam erradas? O que é o amor, e de que formas ele pode se apresentar a nós, sem que nos mate o espírito?
Margaux Fragoso conheceu Peter Curran em uma piscina pública, quando ela tinha apenas sete anos de idade, e ele, cinqüenta e um. Desde aquele dia, sua vida jamais seria a mesma, pois eles passaram a manter um relacionamento que durou quinze anos, até o suicídio de Peter.
Peter Curran era um pedófilo.
Em casa, a menina Margaux tentava existir em um lar que se esfarelava, um casamento sem amor entre sua mãe esquizofrênica, que vivia entrando e saindo de hospitais psiquiátricos, e o pai antiquado, severo e até mesmo, cruel. Ela não sabia o que era ser amada. Sentia-se insegura. Natural que encontrasse em Peter Curran uma espécie de porto seguro, pois ele era a única pessoa que brincava com ela, dava-lhe atenção e dizia que a amava. Mas em troca, ele fazia com que ela jogasse com ele um jogo muito sórdido, no qual ela jamais poderia sair ganhando. Pouco a pouco, a menina Margaux dá à luz a Nina, uma mulher sensual obcecada por sexo. Tudo para suportar as investidas de Peter e mantê-lo satisfeito, pois ela não suportaria viver sem ele.
Uma relação de amor e ressentimento, onde mútuas agressões físicas e cenas descritas sem o menor pudor, enchem os olhos do leitor de indignação, tristeza,  ódio, perplexidade e, finalmente, comiseração.
Peter Curran era um pedófilo. Mas visto através dos olhos da menina que ele amou loucamente e de quem abusou durante anos, a mesma menina cuja infância ele, ao mesmo tempo, roubou e salvou, alguma coisa é remexida no meio das certezas que temos a respeito dos conceitos que adotamos. E mesmo que, após a leitura, nossos sentimentos voltem a assentar-se da mesma forma como sempre foram – o que veio a acontecer comigo – é incontestável que a figura de Peter Curran assuma, durante a leitura, diferentes faces e contextos.
Afinal, o que é um pedófilo? Será ele apenas uma pessoa obcecada por sexo com crianças? Existirá, além desta descrição, alguma coisa de humano? Terá ele sentimentos, pudores, medos e reações como as das demais pessoas?
“Tigre, Tigre” é um livro difícil de engolir. Que não o leia quem for fraco.

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Após ler o livro, fiquei pensando no quanto a vida de Margaux poderia ter sido diferente, se ela tivesse recebido, na infância, o amor, suporte e carinho necessários para que crescesse como uma criança confiante e saudável. Acho que este livro deveria ser lido por todos os pais.

Trecho selecionado:

Foi assim que Nina apareceu: de ver mulheres como Jessenita, Linda, Amber e Vanessa - o tempo todo lembrando do que Peter gostava e do que não gostava. Fiz um composto destas mulheres, junto com outras que eu vira papai paquerar em bares com o passar dos anos, sempre que minha mãe adoecia e íamos à cidade. Fiz de Nina tudo o que minha mãe não era. Recatada, durona e agradável com os homens, não 'má', mas 'perversa', não 'fria', mas 'difícil.' Ela era um carvão quente; era manteiga. Uma verdadeira deusa do sexo. Nina era uma puta. Se não fosse puta, Peter podia se sentir mal com algumas coisas que ele fazia. Podia se sentir culpado. Assim, no verão em que eu tinha 13 anos, montei Nina - minha obra prima de feminilidade.
Ana Bailune
Enviado por Ana Bailune em 26/06/2012
Código do texto: T3746008
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