Resenha : A Revolução dos Bichos- George Orwell
ORWELL, George, A Revolução dos Bichos. Editora Companhia das Letras.
Eric Arthur Blair, que possui como pseudônimo George Orwell nasceu em Bengala, na Índia, em 1903. Como fiel defensor do socialismo, narra sua participação na Guerra Civil Espanhola em 1938. Durante a Segunda Guerra Mundial (1945), escreve uma de suas obras de maior destaque literário, A Revolução dos Bichos. Morreu em 1950, devido ao fato de ser portador de tuberculose.
A Segunda Grande Guerra foi um triste acontecimento que deixou profundas marcas na história da humanidade, isso se comprova pelas diversas consequências sociais, econômicas, políticas e morais que esse período deflagrou em todo o mundo. Por ter sido escrita durante esse acontecimento, a obra A Revolução dos Bichos adquiriu muitas dessas características presentes na Segunda Guerra. Dentre as principais, pode-se destacar uma crítica ao totalitarismo, efetuada pelo autor da obra através da narrativa em fábula e uso frequente de metáforas.
No capítulo inicial da obra, os animais que trabalhavam incessantemente na Granja do Solar dão-se conta do quão miserável eram suas respectivas vidas, já que todo o esforço por eles efetuado cotidianamente não era recompensado em uma alimentação suficiente e descanso digno. Assim, o velho porco Major, que seria um dos animais mais respeitável e sábio de toda a granja, explana a situação real a qual todos ali permaneciam sem protestar. Com sua grande sabedoria, Major realiza uma reunião com todos os animais e acusa o homem de ser o maior culpado por sua situação de miséria e tirania. O homem em questão seria o dono da Granja, o Sr. Jones, que se aproveita do trabalho dos animais para prosperar economicamente, sem lhes oferecer qualquer benefício.
No seguinte capítulo, apesar da morte do Major, já havia sido plantado na alma de cada animal ali presente, o desejo de libertarem-se da escravidão e da tirania à qual estavam submetidos. O lema dessa futura revolução dos bichos seria o de que todos os bichos são iguais e de que nos homens não se deveria nunca confiar. Antes do esperado os animais já se encontravam a postos para lutar pela sua liberdade e a revolução fora deflagrada. Os homens que não previam de modo algum essa estranha manifestação foram pegos de surpresa, dando-se facilmente a vitória dos animais sobre os mesmos e a mudança do nome da granja para Granja dos Bichos.
Ao longo da obra, os porcos, que seriam os animais de notável destaque intelectual sobre os demais, assumem o comando da Granja dos Bichos. Tornam-se responsáveis pela elaboração dos Sete mandamentos (configuravam a ideologia do Animalismo) que deveriam reger o comportamento dos animais da granja, como forma de assegurar a garantia dos seus direitos e de modo simultâneo dos seus deveres, assim todos poderiam viver da maneira mais harmoniosa possível. Da mesma forma que existiam os mais sábios, existia também os animais mais ignorantes, dentre eles os cavalos, que apesar de não entenderem o processo da revolução estavam sempre dispostos a cooperar com o seu suporte físico e eram meros repetidores de pensamentos.
Como já foi dito, os porcos por serem os grandes detentores do conhecimento, eram responsáveis somente pela administração da granja, ausentando-se assim do trabalho manual e assumindo o posto de líderes da revolução. O cavalo Sanção foi um animal que obteve grande destaque ao longo da obra, já que a todo o momento defendia a revolução com todas as suas forças, sempre disposto a trabalhar mais e mais, mesmo sem compreender formalmente do que a revolução tratava.
É claro também que, nem todos os animais aderiram verdadeiramente à revolução devido a sua postura de acomodação diante da tirania. Como exemplo tem-se o gato, que sempre desaparecia nas horas do trabalho, mas possuía um eloquente discurso demagógico, no qual todos terminavam acreditando. Além dele, existia a égua Mimosa, que trocava facilmente a sua liberdade por um cubo de açúcar ou por fitas coloridas que tanto alimentavam o seu culto à aparência.
“Quatro pernas, bom. Duas pernas, ruim”. Esse seria o principal princípio do Animalismo. Mesmo os animais que não eram muito capazes de raciocinar por si mesmos, o decoravam e o colocavam em prática sempre. Os animais, ao contrário do que seu antigo dono pensava, estavam se organizando muito bem, aumentando o faturamento da granja em grandes proporções e viviam mais felizes, descansando e desfrutando do que produziam. Não sabendo disso, os homens tentaram retomar o poder da granja determinado dia, mas os animais estavam se preparando para isso desde o início, de modo que obtiveram novamente a vitória sobre os humanos.
O cenário de paz que configurava a Granja dos Bichos fora rapidamente alterado quando o porco responsável pelo comando fora substituído por outro. Enquanto um deles dominava a arte de discursar, o outro preferia obter suas conquistas através da violência. Desde o início ambos já brigavam pelo poder, entretanto tudo se dava se forma pacífica, somente passado algum tempo um dos porcos expulsou o outro violentamente e inicia-se o horror na granja. Os antigos princípios foram esquecidos e alterados sem que os demais animais soubessem. O fator de suas curtas memórias claramente facilitou esse novo cenário que se formava. Os animais já não eram iguais, os porcos eram considerados superiores, as reuniões que constantemente aconteciam para discutirem sobre os problemas da granja foram praticamente abolidas, a morte de animais permitida e o pior de tudo, os porcos começaram a adquirir hábitos humanos.
Apesar da curta memória dos bichos, havia outro fator que condicionava a presente tirania que fora instaurada. O porco líder possuía um assistente que era responsável por repassar as informações aos demais, sendo tarefa do mesmo lembrar frequentemente aos animais que o seu líder não fazia nada por ele mesmo, mas tudo era efetivado tendo-se em vista o bem comum da Granja dos Bichos. O discurso demagógico do assistente acalmava os nervos de todos os animais, que terminavam por acreditar na bondade de seu líder. Além do assistente também havia os cachorros responsáveis pela segurança do porco chefe, os seus rosnados assustadores eram capazes de calar qualquer voz que exigisse explicações.
Agora os animais já haviam se tornado novamente escravos, trabalhavam sem descanso durante todos os dias da semana. Os antigos benefícios foram apagados de suas memórias como se nunca houvessem existido e os porcos cada vez mais impunham a sua tirania. A única coisa que ainda seria capaz de confortar os animais seria o fato de que produziam apenas para eles próprios, não tendo que sustentar nenhuma família de homens.
O desfecho do livro A Revolução dos Bichos de certo modo assemelhasse ao seu início. Isso pode ser comprovado ao levar-se em consideração que se no início os animais estavam submetidos a todos os caprichos do Sr. Jones, trabalhando incessantemente e aceitando tudo que lhes era posto e no final, sob o comando dos porcos, sua condição permanece a mesma. Os porcos que no início se igualavam aos demais bichos e possuíam repúdio aos homens, terminam por consagrar uma aliança de compromisso entre ambas as espécies, porcos e animais. Todos os antigos vícios dos homens, como por exemplo, o álcool é adquirido pelos porcos.
É de notável percepção as semelhanças do livro com a época a qual foi escrito. No clima da Segunda Guerra Mundial, a espécie humana via-se dominada pelo discurso demagógico, que prometia melhoras de grande abrangência social, política, econômica, e pela força bruta, que era o grande potencial de guerra que muitos países envolvidos possuíam. A crítica feita pelo autor é justamente no que tange a dominação do homem pelo discurso bondoso e bem elaborado, capaz de confundir os que não forem capazes de perceber seu tom de persuasão. Efetuado através de metáforas entre porcos e homens, são demonstrados que de certo modo a conquista do poder torna-se uma arma quando os demais valores de igualdade são gradualmente esquecidos e o egoísmo e a tirania são os grandes norteadores da conduta humana.