Doce Primavera

Rio,21/03/12


A religiosidade estava ligada a cidade pacata de Primavera como o centro de tudo. A prefeitura dependia dos donativos dos fiéis para arregaçar as mangas e concertar o que estava previsto, por conta das enchentes que vitimava á cidade. E garantia por a+b que não havia recursos que o Governo pudesse enviar. Assim, as escolas sofriam por falta de merenda escolar e a evasão de alunos era muito grande.
A única fábrica de materiais de limpeza despejava o lixo nas águas do rio o que afetava deveras o meio ambiente. Exceto pela fazenda Rio da Prata. Esta crescia graças ao sistema de perfuração no solo abrindo um poço de água potável no período da seca. O gado servia como fonte de vida rentável em todos os aspectos. Não só da carne bovina, como o couro que servia para diversos fins.
O Sr. Pereira Bastos era um homem rude e honesto do tipo caipira de marrédeci. Religioso, nunca faltava uma missa dominical na Catedral de São José padroeiro de Primavera. Dona januária lidava com os bordados que tirava das ovelhas suas lãs. A negra Damiana fazia compota de doces do que era colhido no pomar e na horta.
No entanto, lhe faltava um filho. Pensava dona Januária. Um filho que corresse aquele pasto inteiro e comandasse o gado, montasse a cavalo enfim, tocasse adiante o que eles começaram. Foi assim que adentrando o cemitério que ficava nos fundos da capela; que ouviu o barulho do tambor. O barulho que vinha de pequena casinha branca de telha de amianto. Haviam pessoas na varanda a espera da consulta. Esperando, ficou sabendo que as mulheres paridas se encontravam ali, a espera de Mãe Isaura para benzê-las, e dar-lhes proteção na hora do parto. Havia homens em buscas de orações para aliviar feridas nas pernas, dores de estômagos e encha-quecas.
Os filhos de santo vestidos de branco se reuniam em rodas e cantavam enquanto a mãe de santo os benzia no defumador. Minutos depois, enquanto tocava o tambor prosseguia a cantoria e logo sem seguida começava a incorporação. Dona januária se sentiu á vontade e entrou no terreiro sentando na arquibancada. Foi nesse instante que o espírito mandou chamá-la;
Impressionada, se aproximou e o espírito lhe disse:
_ Um filho. _ Pausa e profundo silêncio: _ Isso é tudo o que a senhora deseja.
_ Sim é verdade. _ Admitiu meio confusa.
_ Mas, cuidado com as ofertas milagrosas. Seu perna de calça é um homem muito correto e a mentira tem perna curta.
_ Eu quero um filho. E estou disposta a pagar o preço que for. _ Disse ela no calor da hora e do momento:
_ Cuidado quando fizer esse tipo de oferecimento. Os espíritos malignos têm ouvidos e podem dizer amém.
Dona januária colocou no cesto de vime uma nota considerável. E quando saia do terreiro, caminhava pelo cemitério pensativa nas palavras do espírito incorporado naquela mulher. Olhava para as covas e catacumbas. De onde estava ouvia as gargalhadas do que seriam os Exu:
_ Januária!
Ouviu uma voz chamando-a. Apavorada apressou o passo e correu ganhando em seguida o pátio da igreja. O padre Matos era um homem esguio e meio calvo. Olhos miúdos, nariz cumprido e grossas sobrancelhas. Tinha o dom de perceber ao longe o que acontecia. Vendo o quanto ela se curvava diante da imagem de São José se aproximou:
_ O que a aflige Dona januária?
_ A vontade de ter um filho padre. Sou constantemente, cobrada.
_ Sebastião tem esse direito. É seu esposo. E no entanto, há de ressaltar que deve levá-la a um médico para que avalie suas condições. E se mesmo assim, nada acontece filha, é porque foi da vontade de deus que o curso do rio seguisse assim.
_ Não posso padre. Preciso de um filho como as rochas precisam da montanha que as cercam. Até cheguei as últimas consequências. _ Outra pausa exibindo a troca de olhar: _E pedi auxílio a mãe Isaura.
_ Como pode fazer uma coisa dessas?
_ Sei que o senhor é contra. Acontece que muitas mulheres estavam lá para serem benzidas. Quem sabe ela me ajuda a ter um filho.
Suspendeu-a carinhosamente de onde estava agachada:
_ Filha, estas coisas não fazem bem a ninguém. Você verá que o tempo irá dizer que o que estou falando é a mais pura verdade. Muitas moças procuram esse terreiro em busca de fazerem pactos com os espíritos e no final de contas, percebem que o amor é um acontecimento simples e não algo forçado. Mãe Isaura vem as missas dominicais e até contribui ajudando as crianças do orfanato. Mas, quando está incorporada desconhece o que os médiuns afiliados ao seu terreiro fazem a suas costa. Em especial o seu esposo que vive cobrando e deixando passar na frente da fila aqueles que podem pagar mais.
Lembrou então que foi assim que foi recebida notando certos olhares de reprovação contra ela. Mesmo escutando o padre, estava decidida. O seu filho haveria de chegar. E não importava como.
Chegando em casa no fim da tarde. o jantar era servido ás seis. O Sr. Sebastião descansou o talher no rebordo do prato e disse:
_ Faltava agora o nosso filho. Há anos estamos tentando e nada desse guri vir. o que está acontecendo com você Januária?
_ Me preocupei demais com a aparência. _ Sorriu meio sem graça:
_ E por conta disso mulher nosso sonho de ter um filho foi ficando para trás.
_ Queria acompanhá-lo no crescimento dessas terras e...
_ Pois trate de se virar nisso agora mesmo. Daqui para frente, vamos fazer de tudo para que isso aconteça. Todos os dias e todas as noites. mas o meu filho virá neste mundo. nem que seja apenas um.
E não é que a cobrança excessiva fizera-a congelar nas horas matrimoniais. Sr Sebastião acordava nervoso e xingando deus e o mundo, socando o vento e soltando fogo pelo nariz.



Dyanne
Enviado por Dyanne em 21/03/2012
Reeditado em 28/03/2012
Código do texto: T3567074