DONA FLOR E SEUS DOIS MARIDOS

Caro amigo Jorge Amado, o bolo de puba que eu faço não tem receita, a bem dizer. Tomei explicação com dona Alda, mulher de seu Renato do museu, e aprendi fazendo, quebrando a cabeça até encontrar o ponto. (Não foi amando que aprendi a amar, não foi vivendo que aprendi a viver?)

Vinte bolinhos de massa puba ou mais, conforme o tamanho que se quiser. Aconselho dona Zélia a fazer grande de uma vez, pois de bolo de puba todos gostam e pedem mais. Até eles dois, tão diferentes, só nisso combinando: doidos por bolo de puba ou carimã. Por outra coisa também? Me deixe em paz, seu Jorge, não me arrelie nem fale nisso. Açúcar, sal, queijo ralado, manteiga, leite de côco, o fino e o grosso, dos dois se necessita. (Me diga o senhor, que escreve nas gazetas; por que se há de precisar sempre de dois amores, por que um só não basta ao coração da gente? As quantidades, ao gosto da pessoa, cada um tem seu paladar, prefere mais doce ou mais salgado, não é mesmo? A mistura bem ralinha. Forno quente.

Esperando ter lhe atendido, seu Jorge, aqui está a receita que nem receita é, apenas um recado. Prove o bolo que vai junto, se gostar mande dizer. Como vão todos os seus? Aqui em casa, todos bem. Compramos mais uma quota da farmácia, tomamos casa para o veraneio em Itaparica, é muito chique. O mais, que o senho sabe, naquilo mesmo, não tem conserto quem é torto. Minhas madrugadas, nem lhe conto, seria falta de respeito. Mas de fato e lei quem acende a barra do dia por cima do mar é esta sua servidora, Florípedes Paiva Madureira dona Flor ddo Guimarães.

(Bilhete recente de dona Flor ao romancista)

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Dona Flor e seus dois maridos (Jorge Amado) Jorge Amado é o autor preferido por nove entre dez leitores brasileiros. O que se deve

ao fato de o simpático escritor baiano reunir, em suas dezenas de romances, uma poderosa capacidade de contar histórias a um estilo veemente e apaixonado, temperando tudo com humor vivaz e picardia erótica bem ao gosto nacional. D.Flor e seus dois maridos (1967) permanece um romance atual e lido com prazer, pois reúne

dois dos temas caros ao leitor: a boa mesa e a boa cama. Florípedes, a D. Flor do título, professora de culinária da escola Sabor & Arte (que se transforma malandramente no trocadilho saborear-te) perde seu marido Vadinho, malandro incorrigível, em pleno domingo de carnaval. De luto fechado, chorosa, recorda os altos e baixos desse relacionamento - que o leitor vai conhecendo em feedback. Mas, como

ainda é jovem e bonita, desperta a atenção do corretíssimo farmacêutico Teodoro, com quem se casa. As diferenças entre os maridos são gritantes: se com Vadinho tudo era "louca vadiação", com Teodoro o sexo é regular e bem comportado; se com Vadinho o

que sentia era emoção e insegurança, com Teodoro a solidez traz uma ponta melancólica de tédio. Até que o fantasma de Vadinho se intromete na cama de D.Flor e de Teodoro. Fantasia? Saudade? O romance não parece procurar respostas excludentes. Ao contrário, D. Flor é um livro que resolve, ou dissolve, o impasse do triângulo amoroso na possibilidade ambígua e inclusiva de dois amores para a

desmedida do desejo humano. Numa leitura mais sociológica, a história de D.Flor aponta para o caráter complexo e contraditório da cultura nacional. Assim surge das páginas de Jorge Amado um Brasil rico em aspectos divergentes: país da abundância (as receitas baianas são um atrativo à parte) e da falta (a população pobre das ruas da

Bahia), do erotismo desataviado, mas também do preconceito e da hipocrisia, país da cordialidade e da crueldade, da ordem e da desordem. AMADO, Jorge. Dona Flor e seus dois maridos. Rio de Janeiro : Record, 1987.

http://www.brasileiro.ru/e-Books/Jorge%20Amado/Dona%20flor%20e%20seus%20dois%20maridos/Dona%20Flor%20e%20Seus%20Dois%20Maridos.pdf

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O PRIMEIRO TEXTO LÁ EM CIMA, retirei da introdução do livro. E esse texto é uma prévia do que vem por ai. Dona Flor teve um marido malandro, mulherengo, viciado no jogo, que lhe batia, lhe roubava os trocados, namorava as suas alunas na escola de quitutes, mas que era o amado. Com ele a vida era insegura. Enfim o gatuno morreu num domingo de carnaval, vestido de baiana. Flor casou de novo, dessa vez com um marido certinho e até monótono. Com saudades das noites quentes de amor, com Vadinho, o fantasma começa a visitá-la e as madrugadas eram de pura “vadiagem”, como dizia Vadinho.

O livro bate de dez a zero no filme, que é um sucesso absoluto também. Só que no livro temos situações que não cabem no filme, devido a exigüidade do mesmo. O filme de Bruno Barreto, de 1976 tinha Sonia Braga no papel de Flor. Ela referencia muito bem como eram as mulheres da época. Vadinho (José Wilker), confessa, em certa hora que tem outras, mas a Flor sempre será a principal, diz ele. No papel de uma mulher que ama, apesar de tudo, recatada, aceitando as bebedeiras e orgias (morreu com 31 anos, no carnaval), gostei imensamente da cena em que ele vindo de manha, já sol, com um sobretudo emprestado, pois perdera a roupa no jogo, ela o abraça e o escolta até em casa.

Notamos o primor do texto de Jorge Amado, nas camadas de assunto que essa pequena amostra já nos traz. Para escrever bem, creio que devemos voltar aos mestres e aprender com eles.

pslarios
Enviado por pslarios em 06/03/2012
Reeditado em 06/03/2012
Código do texto: T3538616