FERAS DE LUGAR NENHUM - UZODINMA IWEALA

“Tudo isso me faz ficar com vontade de pegar o fogo lá de fora e engolir o fogo para me queimar por dentro e me deixar como uma concha vazia.”

Feras de lugar nenhum, romance do jovem escritor Uzodinma Iweala, aprisiona o leitor num território minado por realidades escondidas. A narrativa do protagonista Agu nos aproxima da vida do menino que, de repente, perdeu a família e todas as referências e só lhe restou o engajamento numa guerra que ele não compreende para continuar sobrevivendo.

Não há como ficar imune à violência que grassa na obra literária como um retrato fiel das sangrentas guerras civis nos países do território africano, inclusive na Nigéria, durante as últimas décadas. A narrativa amadurece com o olhar do menino que não consegue se libertar dos ensinamentos inaugurais, sobretudo os religiosos, mas sente ressecarem os valores no íntimo quando seu corpo se torna apenas uma muleta para a arma.

Agu se transforma em um soldado que tem medo de morrer, mas há muito perdeu o significado da vida. Os pensamentos conflitantes do menino que aprendeu a ler com a Bíblia e desejava ser médico ou engenheiro e do soldado violentado e violento, refém das circunstâncias impostas as quais não consegue compreender, oferecem ao leitor um perfil acabado dos inúmeros seres que são privados da individualidade e só continuam a existir entorpecidos em bandos desprovidos de humanidade, mobilizados por interesses obscuros.

O final emociona. O sentimento transcrito é uma perspectiva tardia. Os sobreviventes de guerras serão sempre refugiados dos sonhos que um dia projetaram: “Sou todas essas coisas. Sou todas essas coisas, mas uma vez já tive uma mãe, e ela me amava.”

Uzodinma Iweala, filho de pais nigerianos, formado na universidade de Harvard, EUA, abalou o mundo literário com o seu premiado romance de estréia Feras de lugar nenhum (2006), publicado no Brasil pela Editora Nova Fronteira.

Helena Sut
Enviado por Helena Sut em 15/01/2007
Código do texto: T347886