“O Narrador” de Walter Benjamim
Walter Benjamim em seu texto “O Narrador” baseia-se na obra do escritor russo Nikolai Leskov para fazer um reflexão acerca do desaparecimento do narrador: “São cada vez mais raras as pessoas que sabem narrar devidamente” (p. 197), assim, defende a tese de que a arte de narrar histórias está em extinção.
Benjamin afirma que as melhores narrativas escritas são “as que menos se distinguem das histórias orais contadas pelos inúmeros narradores anônimos” (p. 198). Ele divide esses narradores em dois grupos representados pelo camponês sedentário (narradores que sempre viveram em sue país) e pelo marinheiro comerciante (narrador que vem de longe). O sistema corporativo medieval contribuiu especialmente para essa interpenetração. O sistema corporativo assossiava-se o saber das terras distantes, trazidos para casa pelos migrantes, com o saber do passado, recolhido pelo trabalhador sedentário.
Ao dissertar sobre o oficio do narrador e da sua ligação com o trabalho manual., o autor nos remete a importância da sabedoria e reafirma o quanto esse conceito está desaparecendo “a arte de narrar esrá definhando porque a sabedoria [...] está em extinção” (p.201).
Benjamin afirma que o primeiro indício da evolução que iria culminar na morte da narrativa é o surgimento do romance na era moderna. Segundo ele, o romance está ligado ao livro, ele não remete à oralidade. Outro indício da evolução para o autor é a informação, pois ela é mais ameaçadora e provoca uma crise no próprio romance. Na narrativa o saber deveria vir de longe, diferentemente da informação que pode ser imediata:. “Ela não se entrega. Ela conserva suas forças e depois de muito tempo ainda é capaz de se desenvolver.”(p.204).
No decorrer de sua obra, o autor nos chama à atenção para o estreito e ingênuo laço que existe na relação entre o narrador e o ouvinte. Essa relação é dominada pelo interesse em conservar o que foi narrado. Nesse ponto, entra a faculdade da memória, considerada por ele a mais épica das faculdades. O mais importante para um ouvinte totalmente imparcial, é assegurar a possibilidade de reprodução do que lhe foi narrado.
Para Benjamin, um narrador de qualidade tem sempre suas raízes no povo, principalmente nas camadas artesanais. Ele identifica claramente essa característica em Leskov, que, enquanto agente russo de uma firma inglesa, pode viajar por toda a Rússia. Essas viagens lhe foram de grande valia mais tardiamente em sua vida literária, pois, durante elas, enriqueceu-se tanto em experiência quanto em conhecimento. Ocasiões em que conheceu o funcionamento de seitas rurais deixaram claros traços, posteriormente, em suas narrativas. A exaltação mística era alheia a Leskov. Seu ideal era o homem que aceitava o mundo sem prender-se demasiadamente a ele.
Walter Benjamin identifica, também, outra característica marcante em Nikolai Leskov, que se tratava da profunda afinidade com o espírito dos contos de fada. Segundo ele, esse espírito habitou dentro daqueles que foram os primeiros e verdadeiros narradores de nossa civilização. De acordo com ele “ esse conto sabia dar um bom conselho, quando ele era difícil de obter, e oferecer ajuda, em caso de emergência”. (p. 215)
O texto de Benjamin defende com coerência e clareza a essa tese que vem, mesmo que em um processo lento, adquirindo nuances de um fato, de que o narrador, e consequentemente sua obra, estão em processo de supressão. O mundo cada vez mais instantâneo e imediatista em que vivemos, não tem deixado espaço para este personagem que, nas palavras do autor “figura entre os mestres e os sábios”(p.221). Estes tem como dom poderem contar suas vidas e acham sua dignidade em conta-las inteiras.