Fundou o PSDB e aceitaria razões do PT

E de repente, um Artur da Távola. O que é o Artur da Távola? Essa pergunta só não ocorre a mais gente porque, imagino, nem todos ouviram falar em Artur da Távola. Eu mesmo, só vim a conhecê-lo graças a minha ansiedade em descobrir novos cronistas – essa ansiedade já me gerou o Nelson Rodrigues. Mas para aqueles que nunca ouviram falar em Artur da Távola, vai aí um dado biográfico a seu respeito: foi um dos fundadores do PSDB. E, além de senador, chegou a ser inclusive o presidente do partido.

Imagino que, neste momento, a ala esquerda dos meus leitores tenha debandado. O Brasil é um país em que tudo já foi pensado, cabendo às pessoas apenas escolherem uma das posições já existentes. Se um elemento da posição contrária for reconhecido, não é preciso conversa alguma, pois já sabemos tudo o que ele pensa e como age. Ao classificar Artur da Távola como tucano, eu estou praticamente dispensado de acrescentar qualquer outra coisa, já que todos os juízos sobre a sua pessoa já foram imediatamente formados.

Ainda sim, eu continuo. Essa continuação é inevitável, na verdade. Porque não pude deixar de reparar, enquanto lia as suas crônicas, que há um certo abismo entre ele e o PSDB – diria mais, entre ele e o PT. Ou seja, entre ele e o modelo atual de fazer política. Artur tinha uma compreensão tão grande da inutilidade dos debates firmados em simples opiniões ("uma instância superficial") que certamente ficaria constrangido diante do julgamento que cada partido faz do seu adversário - raramente indo além de reações imediatas. É mais fácil ter opinião do que ter dúvida, diz ele.

Atualmente, nem PSDB e nem PT possuem dúvida alguma. Por ser assim, é impossível que o membro de um desses partidos abra algum tipo de concessão à visão do seu adversário - seria uma fraqueza imperdoável, provavelmente utilizada logo em seguida como arma política ("até os nossos opositores reconhecem"). E Artur não é o tipo de pessoa que acredita em apenas uma coisa (PSDB e PT acreditam).

Ao contrário, Artur da Távola era dos que acreditam em todas as coisas - um relativista, talvez. Há algumas crônicas, falei mal dos relativistas. Se alguém quisesse me rebater, bastaria citar algum trecho de Artur da Távola, e eu me veria em sérios apuros para conseguir sustentar a minha visão. O relativista - Artur reconhece - é uma pessoa incapaz de reformar o jardim, porque acreditará na razão das lesmas, das vespas, dos matinhos e das ervas não estéticas. É de se imaginar, portanto, que um dos próprios fundadores e presidentes do PSDB pudesse muito bem acreditar na razão do PT.

Não sei se Artur da Távola vivia o que escrevia. Suas crônicas possuem um ambiente de serenidade tão grande, e uma análise tão apurada do comportamento humano, que é de se perguntar o que é que ele foi fazer na política. Eu andava precisando ler coisas assim - reflexivas, bonitas e positivas. E acho realmente uma perda muito grande que Artur da Távola não seja citado nas redes sociais com a mesma frequência de uma Clarice ou um Caio Fernando Abreu.

milkau
Enviado por milkau em 01/10/2011
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